Ainda hoje, há por aí muita gente que pensa e proclama que o cristianismo despersonaliza e debilita o homem.

Isto não passa de afirmação gratuita, muito embora os defensores desta tese se firmem em Freud quando, numa das suas obras afirmou, precisamente, o seguinte: «É necessário acabar com o mito que o homem é rei e centro da criação. Na realidade esse mito já se está a desmoronar devido à primeira machadada que lhe deu Copérnico quando provou que a terra não é o centro do universo; a terra não é mais do que uma parte insignificante de todo o mundo cósmico.

A segunda machadada foi vibrada por Darwin ao provar que o homem não é o rei dos seres que povoam a terra, não é mais do que um elo da cadeia da evolução universal a que todos os seres estão sujeitos.

A terceira martelada vibro-a eu, Segismund Freud, ao afirmar-vos que o homem nem sequer é rei de si mesmo; não é a vontade, como se pensava, quem manda no homem, é o inconsciente, os instintos, os complexos, a hereditariedade».

Aqui está, pois, formulada a concepção minimizadora do homem.

Hoje, porém, Freud e as suas teorias estão ultrapassadíssimos, como bem o prova o grande pensador e cientista Teilhard de Chardin. Para este, as afirmações de Freud provam exactamente o contrário: o homem não é rei da criação por estar separado dela, numa esfera à parte, mas é rei porque é o termo, o resumo, o resultado e concretização de tudo o melhor que tem a criação.

Esta tese é, sem dúvida, muito mais consentânea com a dignidade da pessoa humana e todos nós sentimos que, realmente, o homem é esse resumo sublime, essa obra prima que, concretizada no tempo exacto, e fazendo parte da espiral evolutiva, apareceu na terra segundo os desígnios de uma inteligência criadora.

E se compulsarmos as Escrituras e a História da Humanidade, verificaremos a evidente coincidência da visão bíblica com a visão histórica a respeito do homem.

Ele foi e é o senhor dos destinos próprios e da história.

Ao longo dos séculos, o homem libertou-se do «fatum», isto é, da fatalidade, dos poderes ocultos, dos mais espíritos, das bruxarias e foi dominando a natureza e de invenção em invenção foi aperfeiçoando a técnica chegando ao progresso que hoje desfruta.

E o cristianismo, na sua essência, visa o progresso integral do homem enquanto atende e considera o verdadeiro homem, como pressuposto indispensável da personalidade cristã. Aliás, é preciso não esquecer, igualmente, que o cristianismo foi e é de matriz humanista, defendeu e continua defendendo o homem como tal, a sua promoção, os seus valores…

Ora, uma vez que é sobre o homem autêntico que se constrói, digamos assim, o cristão perfeito, daí a consequente obrigação que o cristão tem de formar em si mesmo o homem mais perfeito que lhe seja possível, fazendo render todos os talentos, todas as qualidades e todos os valores, mesmo os de ordem social, os valores políticos e até os económicos. Quer isto simplesmente dizer que nada do que é humano pode deixar de interessar ao cristão.

Daí também a sua preocupação em procurar ser o primeiro na ciência, na investigação, na arte, na cultura e em todas as actividades que sirvam o progresso e o verdadeiro desenvolvimento do homem e por conseguinte da sociedade.

Em suma, quem, de facto, quiser ser cristão perfeito deve começar por ser homem autêntico, viril, no sentido etimológico do termo. Pois, só deste modo, a graça de Deus pode actuar e transformar cada homem num outro Cristo que é, por assim dizer, o vértice da pirâmide, na ordem da criação e por isso mesmo o único protótipo da personalidade do cristão.

Joaquim Mendes Marques

O autor deste artigo não o escreveu ao abrigo do novo Acordo Ortográfico