O mês de fevereiro é anualmente sinónimo de voluntariado universitário missionário por todo o país. Na região algarvia, 36 estudantes maioritariamente da Universidade do Algarve (UAlg), e ainda de outras faculdades de Portugal, também voltaram a ousar trocar a semana de descanso na interrupção letiva entre semestres para abraçar a ‘Missão País’ que os levou de novo ao concelho de Alcoutim, de 4 a 12 deste mês.

A experiência – onde o serviço aos outros, ao bem comum e à comunidade se mistura com o aprofundamento da fé, tornando-se oportunidade de partilha e de encontro – marcou não só a população, mas os próprios voluntários que a levaram a cabo desde 2020.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo
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“Levamos desta experiência ensinamentos para a vida”, garantiu ao Folha do Domingo Tiago Bernardo, um dos chefes gerais da edição deste ano. “Sentimos todos que transformou a população que cá vive e também nos transformou a nós durante estes três anos em que cá estivemos”, completou Carolina Germano, a outra chefe geral.

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Aqueles responsáveis realçam a realidade que encontraram com “uma população muito idosa, muito envelhecida não só nas casas, mas em toda a estrutura social”. “Sente-se muito a necessidade de as pessoas estarem com estes jovens”, acrescenta Tiago Bernardo, constatando que a comunidade foi diminuindo ao longo dos últimos anos. “Uns faleceram e outros foram para o lar”, lamenta, confirmando as caraterísticas daquele que é um dos concelhos mais envelhecidos do país.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo
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“Infelizmente foi o último ano, mas partimos com a certeza de que transformámos muitas vidas e que, principalmente os miúdos, vão ter uma visão diferente do que é a universidade”, refere, não descartando a possibilidade de uma próxima missão da UAlg fora do Algarve. “Há essa possibilidade, contudo a nossa região e a nossa diocese têm também muita necessidade”, adverte.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo
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Madalena Barreto, 18 anos, estudante de Ciências Farmacêuticas na UAlg oriunda de Cascais e estreante na ‘Missão País’, considera que “o foco principal nas missões é fazer voluntariado”. “Mas a melhor maneira de o fazermos é com Deus, portanto isto é o melhor dos dois mundos”, acrescenta aquela jovem católica da paróquia de Carcavelos, garantindo que mesmo que o projeto não fosse católico participaria na mesma. Aquela universitária diz que o mesmo “superou” as suas expetativas “em termos de oração e mesmo de voluntariado”. “Senti que isto foi o início de uma etapa da minha vida porque agora quero chegar a Lisboa e ir fazer voluntariado todas as semanas para um centro de dia ou para um lar”, afirma a voluntária que considera participar em futuras edições.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo
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Quem já não é estreante é Ana Paula Silva, 22 anos. A estudante de Farmácia na UAlg e oriunda de Évora Monte, concelho de Estremoz, participou em todas as edições realizadas em Alcoutim. “Tem sido uma experiência muito fantástica porque nota-se a evolução nas pessoas, na recetividade com os missionários e a própria adesão do Conselho às nossas atividades enche-nos o coração”, testemunha.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo
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Sobre a importância pessoal da iniciativa, diz ter ajudado a fortalecer a sua relação com a paróquia. “Tem sido uma caminhada de fé com alguns percalços porque a adolescência faz-nos, por vezes, duvidar, mas tem sido uma caminhada desde pequena. Depois, com a entrada na universidade, houve algumas paragens também devido aos estudos, mas agora com a ‘Missão País’ sinto que houve uma reintegração e tenho voltado à minha paróquia, o que me deixa muito feliz”, conta, reconhecendo que o projeto tem ajudado a reforçar a caminhada cristã. “A missão, para quem sente que perdeu alguma fé, é ótima para reacender essa chama em Cristo”, remata.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo
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Mas a ‘Missão País’ não se faz só de voluntários crentes. O projeto é ainda construído e reconhecido por outros jovens como uma oportunidade de crescimento pessoal interior. “Eu não acredito em Deus como a maioria dos meus colegas, mas para mim faz-me todo o sentido esta missão porque todas as pessoas que participam nesta missão saem daqui mudadas”, conta Sofia Gambôa, 19 anos, estudante de fisioterapia da UAlg.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo
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Aquela missionária, oriunda de Loulé, que participou pela segunda vez na missão em Alcoutim, diz sentir-se bem mesmo nos momentos de oração. “Apesar de a maioria das pessoas estarem aqui e rezarem a Deus, quando o fazem estão a pedir o bem das outras pessoas. Eu não o faço para Deus porque não acredito – acredito numa outra força maior que não sei bem o que é que é –, mas saio daqui uma pessoa realizada e super feliz porque ajudei os outros. Se podemos ajudar os outros acho que faz sentido e adoro a ‘Missão País’ por isso”, declara, acrescentando que o voluntariado “é a principal razão” pela qual participa na atividade.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo
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O sacerdote da Diocese do Algarve que acompanhou o projeto nos últimos dois anos confirma a transformação que tem acontecido nalguns dos participantes e que em determinados casos significou a aproximação à fé ou o seu revigoramento. O padre António de Freitas refere, nomeadamente, o caso de um elemento que decidiu iniciar o catecumenado que o leve a receber os sacramentos da iniciação cristã: batismo, primeira comunhão e crisma.

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Aquele responsável diz que o acompanhamento de pessoas em condições tão diferentes em relação à fé não é difícil, mas “exigente”. “Vai havendo esta riqueza de partilha da fé de vidas completamente distintas, se calhar até com objetivos distintos na vinda para a ‘Missão País’, mas que depois, sobretudo pelo ambiente de oração e de celebração que vamos vivendo, acaba por atraí-los para o aprofundamento da relação com Cristo”, conta, explicando que “alguns pedem para se confessar, outros para falarem”.

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Mas o sacerdote destaca também a importância do projeto para a Igreja. “Eles podem ser membros ativos da Igreja no próprio testemunho que dão na universidade. Poderem partilhar a fé nesse contexto pode ser, se calhar, o melhor serviço que prestam não só à Igreja, mas ao anúncio do Evangelho”, refere, considerando que a participação de estudantes que não são batizados e de “muitos que não estão habitualmente nas comunidades” comprova isso mesmo.

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No dia em que esteve em Alcoutim, o bispo do Algarve disse-lhes que a sua experiência enriquece toda a diocese. “Sabermos na diocese que estais a fazer esta experiência a partir da nossa Universidade do Algarve é motivo de alegria, de regozijo e também de enriquecimento. E ao mesmo tempo de interpelação, de apelo a outros jovens”, afirmou D. Manuel Quintas, desejando que a experiência “continue nos próximos anos a partir da Universidade do Algarve”.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo
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Ao Folha do Domingo, o bispo diocesano considerou que a “riqueza” daquela experiência está em passar-se “em ambiente universitário e não em ambiente próprio das comunidades paroquiais”. “Atinge destinatários que de outra maneira não teriam oportunidade de fazer uma experiência como esta”, explicou, sublinhando que a mesma ocorre “num momento muito importante para os jovens” em que estes estão a formar os seus valores.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo
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A ‘Missão País’ é uma iniciativa universitária que começou com estudantes ligados ao Movimento Apostólico de Schoenstatt, com 20 jovens, em 2003, e que se organiza e desenvolve a partir de várias faculdades de Portugal. Nela participam jovens de todos os credos e também quem não professa nenhuma religião. São semanas de apostolado e de ação social que decorrem durante três anos consecutivos no período de interrupção de aulas entre o primeiro e o segundo semestres, divididas em três dimensões complementares – externa, interna e pessoal – em que o primeiro ano consiste no “acolhimento”, o segundo na “transformação e o terceiro no “envio”.

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