“Eu é que sei!”

Nós portugueses, de uma forma geral, somos invejosos com o sucesso dos nossos vizinhos. Não sei se outros povos também o são! Mas o “portuga” genuíno, é capaz de elogiar mais depressa um estrangeiro que tenha sucesso em Portugal, do que o um português que tenha sucesso no nosso pais. Um português para ver reconhecido o seu valor, tem que se esforçar mais em Portugal, para além de ter que mostrar também o seu valor fora de Portugal. Só quando nos outros países nos dizem que algum português tem valor naquilo que faz, é que nós, cá na “província”, ainda que esforçadamente e desconfiadamente, lhe reconhecemos algum valor. Sem no entanto deixar de chamar a atenção para a “imensidão” de defeitos que essa pessoa possa ter.

Um exemplo perfeito dessa realidade passa-se no futebol, mais concretamente com José Mourinho. Português genuíno, nascido em Setúbal, mas com fortes raízes no nosso Algarve (nomeadamente em Ferragudo, terra natal do seu pai). José Mourinho foi o último treinador português a ganhar troféus internacionais por uma equipa portuguesa. Aliás, José Mourinho foi um dos poucos treinadores de todo o mundo a ganhar, em dois anos consecutivos, a então Taça UEFA e a Liga dos Campeões. E conseguiu esses feitos com uma equipa portuguesa, em que a grande maioria dos jogadores eram portugueses. E o que se dizia dele nessa altura!? Que era uma arrogante, vaidoso, soberbo, etc., etc. Que só tinha conseguido todos os seus êxitos com atitudes menos próprias e honestas e que quando fosse trabalhar para o estrangeiro iria certamente falhar! Atitude típica do “portuga” provinciano! Preocupa-se mais com o insucesso do seu vizinho, do que em aprender com estes bons exemplos! Agora, e depois de ser treinador e de estar a treinar outras grandes equipas europeias, já lhe é reconhecido um grande valor. No entanto, convém recordar que o clube onde ele conseguiu mais troféus e os mais importantes foi o F. C. Porto, ou seja, onde na época jogavam maioritariamente jogadores portugueses.

Para além deste aspecto, gostaria de abordar um outro lado da pessoa de José Mourinho. Quando alguém tem sucesso na vida pensamos, quase sempre e em primeiro lugar, que é fruto do acaso. Em segundo lugar, que tem de haver superstições ou “forças exteriores” que o ajudem nesse sucesso. Tem que haver sempre algo “sobrenatural” para esse sucesso. Na generalidade, só em último lugar colocamos o estudo, o trabalho e o profissionalismo da pessoa. Esta semana ficámos a saber, através de uma reportagem televisiva, que José Mourinho antes dos jogos simplesmente lê a Bíblia. Já não é a primeira atitude cristã deste senhor. Actualmente também oferece a sua imagem à campanha dos “10 milhões de estrelas”, uma iniciativa da Caritas nacional. E ainda recentemente, quando o tentaram colar a superstições e “bruxedos” aquando da sua ida para o Real Madrid, ele afirmou que essas notícias eram completamente falsas e que punham em causa a sua «dignidade profissional e a sua fé católica». Não sei qual é a frequência de José Mourinho às Eucaristias Dominicais, nem procurarei saber. Mas por esta sucessão de tomada de atitudes cristãs, que apesar de virem a público foram realizadas da forma mais discreta possível, penso que se pode perceber que a leitura da Sagrada Escritura, por parte de José Mourinho, não só não é acto de superstição, como é algo bastante cristão. Antes de executar o seu trabalho, qualquer cristão deve procurar força e discernimento numa leitura orante da Sagrada Escritura.

Convivi e continuo a conviver com imensas pessoas que se assumem cristãs, mas que são muitíssimo supersticiosas. Pessoas que têm medo de se sentar à mesa quando estão 13 convivas (aliás, vão ao pormenor de colocarem isso como algo essencial, prejudicando algumas vezes o convívio com outros por causa do número de elementos), que têm medo de talheres cruzados na mesa, ou de um guarda-chuva aberto em casa. Enfim, regem a sua vida por uma imensa panóplia de atitudes e acontecimentos que podem causar “azar” ou “sorte”. No entanto, apesar de se assumirem cristãs, pouco se preocupam em ler a Sagrada Escritura antes de executarem o seu trabalho. Em muitos casos são as mesmas pessoas que têm inveja do sucesso dos outros, como falei anteriormente. Aliás, o actual momento de crise económica em que vivemos, foi, e é, potenciado por atitudes que não valorizam a competência e o estudo, mas que se fiam no “chico-espertismo” que muitos de nós pensam possuir, pensando que conseguem ter mais sucesso do que a vizinhança, com muito menos trabalho, estudo e competência.

Pergunto: Um cristão deve reger a sua vida pela liberdade da Palavra de Deus, tentando buscar aí a força para executar o seu trabalho com estudo e competência, ou deve preocupar-se com superstições que, além de nos aprisionarem na estupidez, não nos conduzem ao amor e coerência de vida que emana duma leitura orante da Palavra de Deus?