A comunidade cabo-verdiana no Algarve assinalou 25 anos de comemoração do primeiro de maio, festejados sempre com um encontro de celebração da fé e da cultura, e que ontem contou até com a presença do presidente da República de Cabo Verde.
Jorge Carlos Fonseca, assim como o embaixador de Cabo Verde, Eurico Monteiro, estiveram presentes no 25º Encontro de Cabo-verdianos que teve lugar, uma vez mais, em Loulé.
O ponto alto foi a eucaristia presidida no Santuário de Nossa Senhora da Piedade, popularmente evocada como Mãe Soberana, pelo vigário geral da Diocese do Algarve, o cónego Carlos César Chantre, também ele cabo-verdiano.
No final da eucaristia, concelebrada pelos padres da Congregação do Espírito Santo (espiritanos), Nuno Rodrigues e Paulinus Anyabuoke, o chefe de Estado cabo-verdiano realçou que a comunidade daquele país “tem o condão de fazer «pontes»”. “É um dia de «pontes» num tempo em que há quem teime em construir muros”, acrescentou, destacando que os seus conterrâneos são “gente humilde, pobre, que consegue o milagre de construir uma pátria, uma terra respeitada, credível”, “gente honesta, trabalhadora e que se integra com facilidade em qualquer tipo de contexto”.
O presidente da República cabo-verdiana, que no final da eucaristia distribuiu beijos e abraços, tirou fotografias e até dançou com os conterrâneos, considerou as palavras do cónego César Chantre na celebração “uma espécie de homenagem à diáspora cabo-verdiana”. O vigário geral da diocese algarvia evocou a “aventura dos cabo-verdianos, principalmente na década de 1970 em Portugal” e a vicissitude por que passaram na década de 1950/60 nas roças de São Tomé e Príncipe.
“Como é possível ilhas tão pobres produzirem um povo tão alegre e tão amante da sabedoria?”, interrogou, considerando esta “o segredo” daquele “povo aparentemente pobre”. “Porque será que Cabo Verde é tão respeitado no meio africano? Porque será que Cabo Verde é tão respeitado no mundo? É por ser pobre? Não. É por ser humanamente rico”, acrescentou.
Na comemoração do quarto de século daqueles encontros, o sacerdote lembrou que tudo começou um ano antes quando passou pela festa de batismo de um conterrâneo seu. “Apareci na festa e deram-me um pastel que me queimou a língua. Pois, foi a partir daquele pastel que me queimou a língua que nos começámos a encontrar e aqui estamos”, recordou na eucaristia em que se cantou “Sodade”, a canção imortalizada por Cesária Évora. O cónego César Chantre considerou que a música exprime o “grito da dor de um povo que sofreu e que sofre, mas ao mesmo tempo uma alegria interior muito grande de um povo que tem muita fé”. “É a nossa beleza”, rematou.
Presente esteve também o cantor Dino D’Santiago, natural de Quarteira, mas com raízes cabo-verdianas, a quem o sacerdote convidou a cantar no fim da celebração. “És a expressão do nosso povo que canta”, disse-lhe.
O presidente da Câmara de Loulé manifestou a “alegria da comunidade louletana de ter o chefe de Estado de um país amigo” “para celebrar essa amizade que é não só uma amizade entre dois países”, mas “entre os povos do mundo”.
Vitor Aleixo convidou ainda os presentes para a inauguração da escultura da rotunda da Avenida Laginha Serafim, perto da escola secundária, da autoria do escultor Paulo Neves e intitulada “Ponto de Encontro” em homenagem aos “povos que se querem amigos e celebram o seu entendimento e humanismo”.
Já no local da inauguração, o autarca lembrou que a comunidade cabo-verdiana “já tem mais de meio século de presença” naquele concelho. “Os primeiros cabo-verdianos fixaram-se aqui aquando da construção da fábrica de cimento da Cimpor”, lembrou, acrescentando que “desde então esta comunidade não parou de aumentar, dando um contributo ativo para o desenvolvimento económico, social e cultural” daquela terra.
“Trabalhadores anónimos do setor da restauração, da hotelaria, da construção civil, grandes nomes da música e da cultura como Dino D’ Santiago ou Sara Tavares, ou mesmo figuras incontornáveis da comunidade católica – e não só do concelho, mas também de toda a região do Algarve como o senhor padre Carlos César Chantre – são exemplos da preciosa participação da comunidade cabo-verdiana na vida e funcionamento do concelho, da sua inserção e da sua cooperação para o reconhecimento nacional e internacional deste grande município de Portugal que é Loulé”, prosseguiu.
Em dia de festa de enaltecimento das comunidades migrantes residentes em Loulé, Vitor Aleixo explicou que a escultura de pedra integra elementos de aço lacado que “representam os povos dos vários continentes”, evocam “a diversidade de povos e culturas que o concelho de Loulé acolhe e que refletem uma sociedade humanista e integradora, marcada pelos valores da tolerância e do respeito pelo outro, independentemente da cultura, etnia, cor, credo ou religião”.
O presidente Jorge Carlos Fonseca considerou a escultura “carregada de simbolismo” relevante da “ideia da unidade na diferença” e da “sã convivência de diferentes mas iguais”. O chefe de Estado realçou que as comunidades cabo-verdianas “dão uma contribuição quase indizível” “para um país pequeno como Cabo Verde”. “Criam uma saborosa ilusão de que afinal somos grandes. São os cabo-verdianos da diáspora que nos tornam um país de corpo pequeno, mas de uma alma quase gigantesca”, sustentou.
Depois da inauguração seguiu-se o habitual almoço-convívio que teve lugar no salão de festas da Câmara Municipal.