Uma das primeiras medidas tomadas pelos novos governantes depois do 25 de Abril de 1974 foi a criação do salário mínimo nacional. Medida justa e de inegável alcance social que foi bem acolhida pelos portugueses, pois a remuneração de quem trabalha deve ser fixada "tendo em conta as funções e a produtividade de cada um, bem como a situação da empresa e o bem comum" e "o trabalho deve ser remunerado, de maneira a dar ao homem a possibilidade de cultivar dignamente a própria vida material, social, cultural e espiritual e a dos seus", ensina o II Concílio do Vaticano no nº 67 da Constituição Pastoral Gaudium et Spes. Para este objectivo social, pode sem dúvida, digo agora eu, contribuir de forma determinante a institucionalização de um salário mínimo nacional, mas pode também ser importante, para reduzir os desequilíbrios sociais e redistribuir os lucros, com justiça e equidade sociais, o estabelecimento de um salário máximo nacional. Digo mesmo mais, um governo socialista que se preze, nem deveria ter dúvidas ou receios em tomar uma tal medida. Sempre entendi e respeitei os meus amigos socialistas como pessoas muito preocupadas e particularmente empenhadas com a resolução de questões sociais, pessoas tão acentuadamente preocupadas com a economia social e com a própria justiça social, que fazem dessa causa a razão primeira da sua intervenção cívica, a sua bandeira, o seu ideal, a sua ideologia, tão vincadamente social, que até se afirma socialista.
É assim paradoxal que o salário mínimo nacional seja de quatrocentos e setenta e cinco euros, e que o governo socialista diga que não pode pagar mais e que até já fez um grande esforço no aumento daquele valor e à primeira vista, tal afirmação até parece verdadeira, quando esse mesmo governo socialista permite que haja em Portugal pessoas que aufiram o salário anual de um, dois ou até mais, milhões de euros. Isto torna-se até chocante, quando algumas dessas pessoas, ocupam esses cargos que dão tão desavergonhados vencimentos, através de nomeações políticas, feitas exactamente por um governo que se fez eleger em nome de um ideal socialista.
Façamos contas: para alguém poder recolher um salário anual de um milhão de euros, terá que auferir um vencimento mensal de cerca de setenta e um mil quatrocentos e vinte e oito euros, ou seja, ganhará mais de cento e cinquenta salários mínimos nacionais e quem ganhar anualmente dois milhões de euros de salário, ganhará mais de trezentos salários mínimos nacionais! Nem vale a pena dar exemplos superiores a estes, que parece até que existem, pois estes já são suficientes para ficarmos indignados com tão gritante desproporção, que é uma verdadeira vergonha quando protagonizada por pessoas que se servem de doutrinas sociais e até de ideologias socialistas, ideologias que tem subjacente ideais de igualdade, fraternidade e justiça social, para obterem rendimentos tão elevados.
Assim como há um salário mínimo nacional, deverá haver também um salário máximo nacional, pois se há uma base mínima na repartição dos rendimentos, deverá existir também um correspondente tecto máximo. Devem ser adoptados e legalmente consagrados, limites éticos, mínimos e máximos, à fixação das remunerações. Tenho para mim que ninguém deveria auferir mais de trinta salários mínimos nacionais. Esse seria o tecto máximo. Porquê trinta e não vinte ou cinquenta? Porque, e esse deverá ser a meu ver o limite ético, a ninguém deveria ser permitido auferir por cada dia de trabalho, mais do que aufere mensalmente um trabalhador que ganhe o salário mínimo nacional; pelo que a valores actuais, o salário máximo nacional mensal deveria ser de catorze mil duzentos e cinquenta euros, donde resultaria um salário anual de cento e noventa e nove mil e quinhentos euros.
Já sei que me vão dizer, que desse modo, muitos quadros técnicos fugiriam para o estrangeiro, pois não se contentariam com esse nível de rendimento e que tal fuga poderia por em causa a competitividade da economia, o desenvolvimento e o progresso. Admito que sim. Mas também digo, que alguém que não se contente com um rendimento anual de cerca de duzentos mil euros (quarenta mil contos em moeda antiga) é tão ambicioso e ganancioso que não faz falta nenhuma ao nosso convívio social. Faça favor de ir embora! Uma pessoa dessas, é tão egoísta que se torna dispensável. Aliás, com a actual política salarial, existem muitos jovens quadros técnicos, que se vêem forçados a irem trabalhar para o estrangeiro, não porque não se contentassem com o vencimento que poderiam auferir em Portugal, mas porque simplesmente não encontram trabalho.
Esta ideia de se criar um salário máximo, não é assim tão quixotesca, como alguém poderá pensar. Ela foi defendida pelo Senhor Vladimir Spidla, Comissário Europeu do Emprego e Assuntos Sociais, em entrevista ao Diário de Notícias, publicada em 15 de Fevereiro de 2009.
Para criar novos empregos para todos e se poder remunerar melhor a todos, não me repugna, antes pelo contrário, defendo, que se estabeleça um salário máximo nacional. Com o que se pouparia nos salários milionários de alguns seria possível criar uma sociedade melhor para todos.