Pediram-me para falar dela. Um apontamento, uma coisa simbólica. Fi-lo sem esforço. Tentei lembrar-me de alguma característica que a diferenciasse dos outros, daquela amálgama toda igual, da qual fazemos parte e na qual nos queremos, às vezes à força, enfiar, como se essa amálgama nos desse um tom pardo, de invisibilidade, que pode ser muito confortável.
Não precisei de me esforçar muito. Tem uma maneira de ser que enche tudo: é radiosa e genuína, alegre e extrovertida. Torna fácil, a aproximação. Depois, quando a euforia acaba e o seu trinado suaviza, consegue manter um certo brilho no olhar, como se o fundo da íris continuasse a dar-nos pontinhos de brilho. É uma miúda radiosa e feliz, diria eu. E sinto uma ternura boa quando penso que pude acompanhar parte do seu crescimento.
E à boleia dela, da qual é tão fácil falar e apontar coisas boas, penso nos outros e outras sobre quem parece que nada há de bom a apontar. Como se estivessem todos soterrados, ou quase, de aborrecimento, parvoíce e “tiros ao lado” com a nossa identificação. Aqueles e aquelas que por mais que façam, já não nos conseguem envolver, pois não nos vinculamos, não nos identificamos, com o que dizem. E depois vem uma sinapse cerebral, vestida de “grilo do Pinóquio”, que é o mesmo que dizer, vestida de consciência, que me diz que não. Terão sempre qualquer coisa de bom. Terão sempre qualquer coisa que pode desculpar a sua parvoíce. Terão sempre, nem que seja no mais íntimo de si, uma centelha de luz, de brilho, de sopro, que pode crescer e mostrá-los para fora, para os outros. Pensar assim acho que não me torna ingénua. Continua a manter-me impaciente para as suas parvoíces, continua a manter-me lúcida quanto àquilo com que me identifico ou não, mas se calhar torna-me mais otimista e penso que otimismo é sempre bom. Dá esperança…. mesmo com tiros ao lado.