Desde o início da pandemia muito ouvimos falar sobre mudanças. Uma delas, que infelizmente se está a verificar verdadeira, é o aumento do número de pessoas que precisam de ajuda financeira. Tantos perderam empregos, gastaram as suas pequenas economias e não estavam preparados para viver longos meses de ausência de trabalho. Agora, recorrem a ajudas externas, como os Vicentinos ou a Caritas ou outras muitas instituições, para poderem garantir que há pão nas suas mesas e outras ajudas, para pagar despesas fundamentais como as rendas de casa, luz, água e gás.
A economia está, na verdade, como era expectável, a ressentir-se destes meses complicados, que não sabemos se vão prolongar-se muito ou pouco. Mas não é apenas a economia que dá sinais de ter sido tocada pelas consequências da Covid-19.
As pessoas, sobretudo, estão a revelar comportamentos diferentes. E essa era outra previsão que muito nos foi passada desde que começou esta nova fase das nossas vidas. Iriam experienciar-se mudanças de comportamento: íamos ficar melhores, porque esta grave dificuldade que atravessamos traria ao de cima aquilo que é bom no ser humano e iriamos ter uma sociedade mais justa e fraterna e onde todos olharíamos para os outros de forma mais solidária. Confesso que sempre tive dúvidas… E nem vou falar de políticos que erraticamente tomam decisões no mínimo discutíveis, não cuidando dos povos que os elegeram (vejam-se países como o Brasil ou os EUA). Mas olho para muito do que me chega através das redes sociais e de histórias passadas de boca em boca e vejo uma proliferação do esoterismo, das teorias do apocalipse, do surgimento de estranhos gurus que falam de coisas que parecem uma verdadeira salganhada de ideias formatadas para atrair os que sofrem e se querem agarrar a qualquer tábua de salvação que lhe seja atirada.
E regresso ao final de 2019, àquela altura do ano em que são convocados para os meios de comunicação os astrólogos, mestres de tarot e outras coisas. Todos predisseram que 2020 seria um ano maravilhoso, um ano de grandes sucessos e muita prosperidade… Afinal, como dizia a popular cantora Mónica Sintra, havia outra, outra história, não essa de sucessos e maravilhas que nos quiseram vender, porque ninguém, mesmo ninguém consegue adivinhar o futuro, essa construção em que entram tantas variáveis, que nem a melhor cabeça do planeta ou computador mais sofisticado poderão encontrar o resultado final, aquilo que realmente vai acontecer.
Todavia, são esses gurus estranhos, que nos propõem soluções “mágicas” e “infalíveis”, que, certamente adaptando-se às circunstâncias do mercado, voltam a ganhar espaço entre aqueles que precisam de conforto, de esperança, de solidariedade.
É aqui que entram os cristãos e os seus valores, nascidos da verdade, da vida e do caminho que é Jesus Cristo: não podemos ceder a estas teorias e fantasias, não nos podemos silenciar, nem afastarmo-nos de quem precisa! Nem podemos deixar de ocupar o nosso espaço no mundo comunicacional, dando mostra daquilo em que acreditamos – na justiça, no bem comum, na verdade –, testemunhando, como nos pede Cristo e o Papa Francisco. E menos ainda podemos ficar de braços cruzados, pois a nossa ação, o nosso exemplo – que também é testemunho! – poderão trazer luz ao mundo e esperança aos desalentados, àqueles a quem me referia no início deste texto e que agora sofrem as consequências económicas da doença que nos assola. Este é o tempo de amar o próximo e se não formos nós, os batizados filhos de Deus, a trabalhar para ir mudando o mundo, nós que temos a graça de conhecer o amor de Nosso Senhor, quem mais terá força e ânimo para trabalhar na tal mudança de comportamentos?…. E se não arregaçarmos as mangas, o mundo não ficará um lugar melhor. Pelo contrário. Porque estes tempos de crise exacerbam o egoísmo, o fechamento em nós mesmos, a capacidade de ignorar a humanidade do outro.
Esoterismos e fantasias, leva-as o vento, mas os valores cristãos são eternos e indestrutíveis, são como as fundações de uma casa construída sobre a rocha (Mateus 7.24-27), por um homem sábio, que escuta as palavras do Pai e não é insensato: pode cair a chuva, transbordarem os rios, soprarem os ventos, que aquela casa não cai.