A Igreja marcou sempre uma influência no seio da sociedade. A questão das relações entre Igreja e Estado, na época contemporânea, deu origem a controvérsias ideológicas e a conflitos institucionais.

A passagem do Antigo Regime para a era das Revoluções fez surgir um modelo que irá ter o seu epílogo com a implantação da República: a subordinação da Igreja ao Estado. A gestação foi lenta mas determinada.

Os sintomas já vinham do século anterior. D. Francisco Gomes de Avelar não era bispo da corte, mas teve alguns dissabores por causa do novo Seminário que mandou abrir em Faro (1797). O anticlericalismo tinha chegado ao Algarve por intermédio de alguns jornais de Lisboa e do Reino e da propaganda de alguns políticos que abasteciam com "novidades" a clientela avulsa das ilhas anticlericais, maçónicas, socialistas e republicanas, em Lagos, Lagoa, Silves, Portimão, Faro, Loulé, São Brás de Alportel, Tavira e Vila Real de Santo António. As calúnias sobre o Seminário, principalmente as de "mau trato", "rigor exagerado" e "fome" sucederam-se e causaram até um motim. (O Seminário só fechou, por prudência, em 1808, com o levantamento popular contra os franceses). D. Avelar teve alguns arrelias por causa de algumas igrejas assaltadas, de distúrbios em procissões e do próprio Seminário várias vezes apedrejado. No meio do burburinho anticlerical, D. Avelar conseguiu que 25 seminaristas não fossem incorporados no exército.

A experiência vintista, com o bornal do iluminismo-liberalismo e da revolução, causou uma tensão. Deus, a religião e a Igreja são questionados. O processo é suave e segue a técnica do "atira a pedra e foge", para depois enveredar pela frontalidade. A Igreja é considerada como um impedimento para a modernização da sociedade. Perante a Razão, guia único do interior do homem, e o bem-estar aqui e agora, o primado da Igreja passa para segundo plano. Mas a Igreja tinha ainda muito peso no mundo da cultura e da assistência. Era o braço direito do Estado para o cumprimento de muitas leis fora dos meios urbanos.

Inicialmente, o anticlericalismo liberal (político, social cultural e religioso) tem uma visão secularizada do mundo. É preciso colocar a Religião no domínio privado porque há excessiva interferência da Igreja. A aceleração da secularização da sociedade encontra o impedimento do cristianismo. O anticlericalismo desta época é mais uma expressão crítica e reformista em relação à vivência religiosa do que uma atitude anti-religiosa ou anticatólica. É posta em causa a instituição clerical. O Estado-Nação não aceita a ingerência da Igreja no ensino e na assistência. E não respeita a liberdade de consciência e a liberdade religiosa. O anticlericalismo difunde-se pelas classes liberais e entre os jornalistas por intermédio da imprensa e dos livros (romance e teatro). Eram os interlocutores privilegiados e mais abertos às novas ideias. Para chegar ao povo, utilizaram-se os tópicos do celibato do padre, do mau comportamento moral, a exploração e o padre professor, por intermédio de aforismos e da literatura (de cordel).

Em 30 de Outubro de 1820, o Bispo do Algarve e o Cabido foram obrigados a fazer o juramento de obediência e sujeição ao Governo estabelecido. Nos dias seguintes, foi a vez da Colegiada de São Pedro, Seminário, seminaristas, clero da cidade e termo.

Com a revolução de 1820-1823, pode-se dizer que se gerou a viragem para o século XIX, uma cópia mitigada, à portuguesa, da Revolução Francesa e a Igreja começa a distinguir o estado laico e religioso. Aparece na praça pública um novo homem. O homem liberal, liberto do fanatismo religioso e arauto das Luzes, da Razão e do Progresso. Mas, quer à direita, quer à esquerda, houve sempre pactos entre a inovação e o antigo. A resistência e a oposição impediram a concretização de muitas reformas.