Considerando que “um dos problemas de Portugal é o do crescimento económico”, o presidente do Conselho Económico e Social (CES) alerta que se a economia portuguesa “não crescer a um ritmo mais elevado” o país não conseguirá resolver os “problemas estruturais” com que está confrontado.

“Sem crescimento económico não conseguiremos assegurar a manutenção do Estado social que temos, o Estado de providência, que é essencial para corrigir injustiças sociais e colmatar situações de pobreza gravíssimas que de outro modo se manteriam. O Estado social só pode sustentar-se, por um lado, se tivermos uma economia que o financie e, por outro lado, se ele próprio fizer as reformas necessárias para se tornar mais funcional”, advertiu Francisco Assis, convidado pela paróquia de Monte Gordo para refletir sobre o “lugar da Igreja face aos desafios socioeconómicos hodiernos”, aludindo a alterações em áreas como a saúde, a educação, a segurança social ou a cultura.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

Na conferência, que teve lugar na passada quarta-feira no salão paroquial com a participação de cerca de 40 pessoas, Assis afirmou que “Portugal nos últimos 20 anos praticamente estagnou, contrariamente ao esperável e disse que não há “razão visível” para explicar essa estagnação. “Desde 2014 – excetuando o período da pandemia – Portugal começou a recuperar e a crescer acima da média europeia. Mas não temos de ficar muito satisfeitos porque estamos a crescer acima da média europeia num momento em que a média europeia está relativamente fragilizada pelo facto de as principais economias europeias estarem a atravessar um período da crise”, constatou, acrescentando que “as grandes economias europeias, a começar pela alemã, estão com problemas ultrapassáveis, mas sérios”.

“Dizermos que crescemos 1% e que já estamos a crescer mais do que o resto dos europeus que estão a crescer 0,2%, não tem sentido. Para eles não é grave que estejam a crescer só 0,2%, mas para nós é dramático só estarmos a crescer 1% porque a diferença é a de chegarmos até ao nível deles”, prosseguiu, lamentando que o país tenha uma “produtividade média baixa” em relação aos restantes países da Europa.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

Francisco Assis considerou que para o “problema de falta de produtividade” concorre a “desorganização” e o facto de Portugal ter a “população menos qualificada da Europa”, apesar de abaixo dos 36 anos a média de licenciados estar “muito acima da maior parte dos países europeus”. A juntar a esta realidade somou a de “rendimentos médios e medianos muito baixos”, pese embora o “crescimento muito significativo do salário mínimo” nos últimos anos. “Ainda é baixo, mas apesar de tudo subiu bastante. O salário mínimo pode-se subir por decreto, mas o salário médio e mediano não se pode subir por decreto porque é aquilo que uma economia é capaz de promover. E a nossa economia continua a produzir salários medianos bastante baixos”, lamentou, defendendo que “a política de justiça social não se faz só depois através da intervenção corretora do Estado”. “Também se faz a montante, por uma distribuição mais justa dos próprios rendimentos”, sustentou.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

O presidente do CES defendeu a criação de “mecanismos” para que as empresas se robusteçam. “Temos de canalizar grande parte dos nossos recursos públicos para facilitar o acesso do nosso mundo empresarial às novas tecnologias, sob pena dessas empresas desaparecerem”, concretizou, garantindo que “os outros países estão a fazer isso” e que em Portugal as empresas têm uma dimensão diferente da do resto da Europa. “As pequenas empresas são mais pequenas, as médias são mais pequenas do que as médias e as grandes, que para nós são gigantescas, são médias nos países europeus”, disse, lamentando ainda que o “lento” sistema de justiça português seja “gerador de desinvestimento” e que comete “demasiados erros para que possa haver confiança”. “Antes de responsabilizar a estrutura judicial há que responsabilizar os políticos porque fomos nós quem elaborou esta legislação toda e nem sempre tivemos o discernimento necessário para perceber que havia alguns riscos”, afirmou, sublinhando a necessidade da “reforma da justiça”.

Francisco Assis passou ainda em revista alguns dos principais problemas de país ao nível da saúde, demografia, habitação e violência doméstica sobre os quais o CES tem elaborado diversos estudos.

Francisco Assis destacou em Monte Gordo o contributo da Igreja na construção dos Estados providência e da civilização europeia