As criações musicais do monsenhor cónego José Pedro Martins, falecido hoje aos 82 anos, fazem parte da história da música sacra em Portugal no período pós-conciliar.

O património legado pelo falecido sacerdote, que é dos nomes maiores da música litúrgica nacional, é comporto por mais de 1500 composições.

Outro dos vultos da música litúrgica nacional, que foi colega do monsenhor José Pedro Martins no Seminário dos Olivais, explica que a obra musical do sacerdote agora falecido surgiu na fase de aplicação da reforma litúrgica do Concílio Vaticano II para preencher um “vazio que era enorme”.

“Tivemos de começar a musicar em português. Não havia nada. Havia alguns cânticos tradicionais que ainda hoje se cantam, mais devocionais a Nossa Senhora, aos Santos e à Eucaristia, mas para o ordinário da Missa precisávamos criar músicas que não havia”, contextualizou o monsenhor António Cartageno, referindo-se ao início de uma “parceria” que se estendeu por 1969 e 1970.

O monsenhor António Cartageno falava na apresentação do livro “Meu canto é para Ti”, realizada dia 14 de junho deste ano no Seminário de São José, em Faro, que reúne um terço dos cânticos do monsenhor José Pedro Martins.

“Há muito cânticos que ele compôs, outros que eu compus e outros que compusemos os dois”, completou, referindo-se à “aventura” de ambos de contribuição para a música sacra em Portugal, concretamente com a edição dos cadernos que tiveram como título “O Povo de Deus reunido”.

“Boa parte dos cânticos que figuravam nessas publicações serviram bastante bem a liturgia nessa época, primeiro nas comunidades ribatejanas para onde foram criadas e, mais tarde, para todo o país, pois os modestos caderninhos tiveram um êxito assinalável com alguns cânticos que, tendo resistido à erosão do tempo, ainda hoje servem e figuram em coletâneas oficiais”, desenvolveu, enumerando todas as publicações do Secretariado Nacional de Liturgia que incluem músicas do monsenhor José Pedro.

O monsenhor António Cartageno descreveu o colega como “um homem culto e multifacetado”. “A música é uma das importantes facetas da sua rica personalidade e da sua vida de padre. Ele tem intuições musicais muito interessantes, próximas do sentir do povo, e as suas melodias revelam um espírito de grande musicalidade”, acrescentou, considerando que ao longo da sua vida o sacerdote falecido soube “pôr ao serviço da Igreja e da comunidade humana” o “maravilhoso dom” que tinha.

O monsenhor António Cartageno lembrou ainda o “quanto a cidade de Faro lhe deve nas iniciativas, por exemplo, de arranque do Coro do Conservatório [Regional do Algarve] que ele próprio dirigiu”.

O interesse pela música na vida do monsenhor cónego José Pedro Martins aconteceu ainda em Lagos, a sua terra natal, onde chegou a pertencer a um coral da Juventude Operária Católica (JOC), e prosseguiu nos Seminários com o ensino musical.

O monsenhor cónego José Pedro Martins fundou em 1973 o coro do conservatório que dirigiu até 1979, onde também lecionou a disciplina de História da Música. Depois de 40 anos de paragem, aqueles músicos voltaram a juntar-se, sob a designação de Grupo Coral Segundo Capítulo, para dar continuidade àquele primeiro capítulo da música nas suas vidas.

O sacerdote tem vários álbuns editados e o seu nome consta mesmo da Enciclopédia da Música em Portugal no Século XX, do Círculo de Leitores e alguns dos seus cânticos foram traduzidos e inseridos em coletâneas oficiosas, como o Cantoral Liturgico Nacional de Espanha. É autor de um grande espólio de música litúrgica com algumas publicações e gravações editadas em Portugal, Espanha, Brasil e Itália. Mas grande parte das suas composições estão divulgadas em folhas avulsas.

Em 1980 foi jurado do Festival RTP da Canção, em representação do Algarve.

Em 1999, um CD intitulado “Os melhores coros da Região – Algarve”, inseriu algumas composições suas e, em 2000 um outro CD com interpretações do Grupo Coral de Lagos, intitulado “Terra Morena”, abre, precisamente, com esta composição de sua autoria. Mais recentemente também o músico Rão Kyao elaborou trabalhos discográficos em que incluiu temas da sua autoria.

Em 2017 foi também o responsável pela criação da Escola de Órgão da Catedral de Faro.
Tem muitas publicações dispersas em jornais e revistas sobre variadíssimos assuntos, mormente de temática histórica, musical, litúrgica, pastoral e vocacional e colaborou ainda no I volume da coletânea “Algarve – Tradições musicais”, iniciada em 1995.