O padre António Martins defendeu hoje a necessidade de “caminhos consensuais” que promovam “pontes” entre posições polarizadas na Igreja e fora dela que ajudem a promover a esperança.
“Nós vivemos polarizados em tudo, na Igreja, na política, na economia, na cultura. Onde é que estão os valores consensuais do meio que fazem pontes? É por aí que se constrói a esperança no quotidiano, numa comunhão dialogada ou dialogável”, advertiu o sacerdote da Diocese do Algarve, capelão da capela do Rato, em Lisboa, e docente na Universidade Católica Portuguesa, na reflexão que apresentou em Faro ao clero algarvio no âmbito da celebração do Dia do Seminário de São José.

“Se não acreditarmos em projetos consensuais ou comungáveis e nos entrincheirarmos à esquerda ou à direita em monolitismos políticos e ideológicos é o próprio futuro do mundo e da convivência entre Estados que está em causa”, alertou durante a sua intervenção, que teve lugar no próprio Seminário da diocese algarvia, sobre o tema da esperança.
“A esperança não é tema fácil precisamente a começar pelo contexto histórico em que vivemos, tão problemático, incerto e obscuro, em que certos valores civilizacionais, democráticos, de diálogo, de direito internacional, do valor da vida, estão, para perplexidade de uns, escândalo de outros e regozijo de outros, completamente desmontados, alterados e virados do avesso”, considerou, explicando estar em causa o “futuro da Europa” e o “diálogo internacional entre os povos”.

O sacerdote acrescentou que “também a Igreja está num momento difícil”, referindo a “fragilidade do Papa, impasses internos, sinodalidade que avança ou não avança, reformas possíveis ou reformas adiadas”. “Que esperança é a nossa? Para onde caminha a esperança? Com que ilusões, com que resistências? Com que renovações? Com que reinveções? Que futuro queremos para a Igreja? Andamos tateando entre impasses, avanços, hesitações, medos. O futuro será, necessariamente, o da sinceridade católica de unidade na diferença”, considerou, lembrando que a identidade católica “é inclusiva” e encontra no Papa, seja ele qual for, “o elo e a expressão visível da unidade na diversidade”.

“Pergunto nos grupos de leigos, com quem partilho inquietações, onde é que está hoje a condição da Doutrina Social da Igreja, aquilo que fez a militância política de um punhado de católicos que asseguraram a transição para a democracia e ajudaram a construir o estado social que é o nosso e que assumiram publicamente o seu testemunho católico em diversidade de contextos políticos”, prosseguiu, considerando que ainda que o catolicismo, na questão da defesa da vida, não pode apenas limitar-se à problemática do aborto e esquecer as questões da imigração, da pena de morte ou da inclusão dos estrangeiros.
“E no rearmamento que está emergente na Europa, qual é a condição pacifista que o catolicismo pode introduzir como profetismo? É isto ingenuidade ou é profecia? Não sei. Tenho dúvidas, perplexidade, mas aqui estou”, disse ainda.