Esta realidade é testemunhada pela diretora da instituição que fala em problemas relacionados com consumos e com a sanidade mental. “São problemáticas já muito específicas que requerem outro tipo de acompanhamento por parte de técnicos especializados”, refere a irmã Leonor Caracóis.

Fundada em 1919 por um grupo de senhoras ligadas à Ordem Terceira Franciscana, a Casa de Santa Isabel nasceu no espaço anexo à igreja e ao Convento de São Francisco para auxiliar meninas órfãs ou abandonadas numa altura de grande carência social.

Atualmente, a instituição particular de solidariedade social de natureza associativa, acolhe crianças e jovens em risco do sexo feminino, dos três aos 18 anos, oriundas de famílias desestruturadas, dando “prioridade às fratrias” de forma a não separar irmãs.

“Confrontamo-nos com famílias com problemas muito sérios. São problemas bastante fortes”, testemunha a diretora, considerando ser “cada vez mais difícil conseguir contar com algum familiar – uma avó, uma tia ou um pai – que preste algum suporte e colabore com a instituição”. “São percursos de vida, a maioria deles, muito difíceis e isso reflete-se ao nível da saúde, da estrutura e das restantes dimensões da vida das meninas. Cada vez mais nos chegam casos de crianças e jovens com problemas graves de saúde, sobretudo a nível de debilidade mental e de psiquiatria”, sustenta, apontando os “constrangimentos” que dificultam o trabalho da instituição.

Em teoria, o Lar de Crianças e Jovens em risco acolhe utentes por um período superior a seis meses (que é o limite dos Centros de Acolhimento Temporário) e que, no máximo, se deve estender até ao atingir da maioridade com os 18 anos. No entanto, a diretora da instituição explica que a realidade é bem diferente. “É muito complicado as jovens conseguirem a sua autonomização aos 18 anos. Uma vez que a lei possibilita prolongar o acolhimento até aos 21 anos, procuramos, dos 18 aos 21 anos, que as jovens consigam algumas habilitações e dar passos concretos para se autonomizarem”, refere, explicando que “o espírito da lei atual é que o acolhimento seja o menor tempo possível e nunca excessivamente prolongado”. “Isso é na teoria. Na prática, o acolhimento pode chegar a ser bastante prolongado e temos meninas que estão bastantes anos na instituição”, testemunha.

Antes de 1999, o encaminhamento das crianças era feito diretamente pelas famílias que iam bater à porta da instituição para pedir ajuda. Hoje já não é assim e os casos de acolhimento chegam exclusivamente através das Comissões de Proteção de Menores ou dos tribunais. “No caso de a comissão ter um caso sinalizado e achar que o melhor para a criança é a institucionalização mas não chegar a acordo com a família, o caso passa para o Tribunal de Família e Menores”, explica a irmã Leonor Caracóis.

Procurando preparar para a autonomia, proporcionado um “projeto de vida”, a instituição católica tem como objetivo o desenvolvimento integral de cada utente, tendo em vista responder às suas “necessidades básicas” que não estão garantidas quando lá chegam.

Outro dos princípios da Casa de Santa Isabel, para além de “transmitir a fé cristã”, é o de “promover a integração social”. A irmã Leonor Caracóis explica por isso que, sempre que possível, as utentes frequentam atividades no exterior da instituição como catequese, aulas de música ou dança, entre outras, realizadas no quadro de parcerias com outras entidades e instituições. “Nem todas têm as mesmas atividades extraescolares, pois estas são escolhidas de acordo com as suas caraterísticas”, explica, acrescentando ser preciso “respeitar a individualidade”. “Não são todas iguais, não têm todas os mesmos gostos, nem têm de ser tratadas da mesma forma”, complementa.

Para além de garantir a segurança e a proteção, a instituição procura ainda assegurar a escolaridade educativa e o gosto pela cultura, o que por vezes se torna numa tarefa difícil. “É muito comum que a parte intelectual esteja comprometida, não porque sejam miúdas pouco inteligentes. A maioria são miúdas bastante inteligentes, mas existem outros problemas como dificuldades de concentração”, sustenta aquela responsável.

Para além do lar de crianças e jovens em risco, a instituição é atualmente constituída por mais duas valências – a creche e o pré-escolar – criadas em 1982 como forma de prover a sustentabilidade da instituição, mas também muito por via da emancipação da mulher que se iniciou naquela altura, como explica a irmã Leonor Caracóis. “A creche e o pré-escolar foram criados com o objetivo de apoiar, economicamente, o lar que é uma valência bastante dispendiosa e também porque, nos inícios dos anos 80, estava a surgir a necessidade de a mulher entrar no mercado de trabalho e se ver liberada de estar sempre em casa com os filhos”, refere aquela responsável, que acrescenta ainda a “preocupação social de integrar as crianças do lar na sociedade, relacionando-as com outras crianças das suas idades”.

Atualmente, a Casa de Santa Isabel acolhe 26 crianças e jovens na valência do lar, 42 crianças na creche e 86 no pré-escolar.

Samuel Mendonça