Falando hoje ao clero do sul do país sobre a “Pobreza, castidade e obediência na vida do pastor”, o padre Joaquim Teixeira disse que aqueles três conselhos evangélicos configuram o sacerdote com Cristo. 

Na atualização do clero das dioceses do Algarve, Beja, Évora e Setúbal que está a decorrer em Albufeira desde segunda-feira com a participação de 77 elementos entre bispos, padres, diáconos e alguns dos seminaristas em final de formação, aquele sacerdote da Ordem dos Carmelitas Descalços começou por lembrar que “esta proposta do Evangelho de pobreza, castidade e obediência é para todos”. “Para gerir bem o desejo do ter, do poder e do prazer, Jesus propõe com a sua pregação e com o seu estilo pessoal de vida a pobreza, castidade/celibato e a obediência”, afirmou.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo
Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

Na formação que hoje passou a contar com a participação do núncio apostólico (embaixador da Santa Sé) em Portugal, D. Ivo Scapolo, o sacerdote carmelita lembrou que a vivência das três dimensões dá à espiritualidade sacerdotal “uma identidade, uma configuração específica”. “Encantamo-nos com Jesus, pelo seu reino e pela sua Igreja e deixamos tudo para viver para esse tesouro e esse reino. Esta tem de ser a lógica da nossa vivência dos conselhos evangélicos”, considerou, acrescentando que ela não pode ser a “lógica negativa das renúncias”. 

Neste sentido, defendeu ser “preciso uma motivação espiritual, profundamente mística, para abraçar o estilo de vida de viver e amar que é o de Jesus”. “O mundo de hoje precisa dele”, considerou.

Referindo-se concretamente à dimensão da pobreza, disse ser um estilo de vida que se pode traduzir pela “simplicidade” e por “uma certa austeridade”. “Claramente que não estamos a falar em abraçar a miséria. O Diretório para o Ministério e a Vida dos Presbíteros fala em simplicidade de vida e disponibilidade para servir”, clarificou, lembrando que quanto mais o sacerdote se “configurar com Cristo, livre e desprendido de pessoas, lugares e bens, mais o poderá imitar”. 

Neste sentido, acrescentou que o sacerdote “tende a relacionar-se com todos sem excluir ninguém, principalmente os mais pobres. Este é um sinal de quem ama a pobreza. Quem vive este conselho vai descobrir a alegria da carga leve da confiança na providência. Vai comprometer, no seu exemplo e ação, com a eliminação real da pobreza e da miséria que atinge tantas famílias”, referiu, considerando que a sua aceitação ensina a “viver com dignidade, mas com o estritamente necessário”.   

“Quem ama este conselho evangélico aprende a ser generoso, a descobrir que a alegria está no dar, que é dando que se recebe, acredita que Deus providencia”, observou, considerando que “este estilo de vida simples, amando e gostando do essencial, tem de ser acompanhado com a pobreza institucional das estruturas diocesanas que farão uma gestão pobre e transparente, pondo sempre os mais pobres nas suas prioridades”.

Relativamente à castidade, explicou que “a forma casta de Jesus amar pode traduzir-se na generosidade nas coisas do amor”. “É este estilo de vida, de se relacionar, esta proximidade às pessoas, que queremos ousar imitar na nossa identidade presbiteral”, realçou, advertindo que “a castidade celibatária ou é entendida como um dom que vem agrafado ao sacramento da Ordem, ou é entendida como uma graça que se acolhe e exercita ao longo da vida, ou tornar-se-á um fardo muito pesado para carregar” que pode manifestar-se “em tristeza”, “em agressividade em palavras e atitudes” e “na ausência da alegria” como “marca da vida”.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

O padre Joaquim Teixeira disse que “o celibato e a castidade têm uma escola que tem de durar a vida toda”. “Significa que é um dom, mas é também uma tarefa. Por isso, amar castamente é objeto de uma aprendizagem”, considerou, explicando que “amar celibatariamente pressupõe entrar na escola da castidade, do celibato”. “Quem se distrair e não velar pela sua específica forma de amar — e a nossa é a celibatária —, rapidamente se vai enredar em compensações que começam sempre por ser subtis”, advertiu, explicando que poderão “conduzir a dependências, a vidas duplas, com um dispêndio de energia e com uma tristeza que começa a revelar-se no rosto que resulta da infidelidade ao Senhor e à sua Igreja”.

O sacerdote garantiu haver mesmo “sinais” de que se frequenta aquela “escola”. Colocar “Jesus no centro da vida”, um “leque de relações” e uma “constelação afetiva” marcada pela “transparência, liberdade, benevolência e beneficência”, “relações marcadas pela igualdade sem tendências a exclusivismos”, investir na “amizade e fraternidade sacerdotal”, um “sentimento de compaixão” e de “sentir com os outros” e a “paternidade espiritual” de “dar vida aos outros” e a “atenção aos sentimentos” foram alguns desses sinais que enumerou.

“Estarmos na escola do celibato é provocador, mas é preciso. É preciso dizer que há formas de viver a sexualidade e a afetividade de forma casta”, afirmou, considerando que a castidade e compromisso com o celibato, assim como os demais conselhos evangélicos, são “sinais contraculturais”.

O orador referiu que “um sacerdote casto irradia uma energia muito especial”. “Também tem o efeito de gerar esperança para recentrar o amor na vida de cada pessoa e de cada vocação”, acrescentou.

“Com a obediência aprendemos a escutar, sair de nós próprios, a viver em relação com outros”, referiu em relação à terceira dimensão, lembrando que aquele “pilar nuclear da identidade presbiteral” “tem a ver com a escuta da vontade de Deus”. “Com o voto de obediência favorecemos a vida da Igreja. Sem obediência, a Igreja desmorona-se”, alertou, acrescentando que “a obediência tem como objetivo construir comunhão”. “Não há vida em Igreja sem exercício desta virtude da obediência. Ela traduz-se em escuta e atitude humilde de nos pormos juntos — Papa, bispos, religiosos, consagrados, leigos — à procura da vontade de Deus para lhe entregarmos a nossa. Também esta obediência se exerce na relação com os irmãos no sacerdócio, com os consagrados e com os leigos”, prosseguiu.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

A terminar, apontou como frutos da vivência daquele conselho evangélico a vivência da “humildade cristã”, a busca de Deus “irmanados” com outros “irmãos que também o buscam”, a “oração diante da palavra rezada e partilhada com os irmãos” e a opção pela vida em comunidade. 

O sacerdote advertiu que os três conselhos evangélicos na vida do pastor “articulam-se entre si e não podem ser vividos separadamente”. “Se uma destas áreas está frágil, rapidamente contaminará as outras”, alertou, lembrando que “a vida evangélica tem um alto preço” e que “só um amor grande pode justificar e ajudar a viver esta dimensão da renúncia”. Por isso, exortou à “oração”, “acompanhamento espiritual”, “leitura espiritual”, “apreço pela Eucaristia diária” e “confissão frequente”. “Os conselhos evangélicos só são difíceis se vividos na mediocridade”, preveniu.