Os dois últimos linces a chegarem ao centro de Silves chamam-se Éon e Calabacin e tinham chegada prevista ao seu novo habitat para as 16:30, mas as carrinhas que os transportaram a partir de um dos centros homólogos de Espanha só entraram nas instalações quase uma hora depois.

A última transferência de animais contou com a presença do secretário de Estado do Ambiente, Humberto Rosa. Os responsáveis pelo processo encaminharam-se depois para um dos 16 cercados preparados para acolher os animais e libertaram os dois linces, já com a noite instalada e sem muita luz que permitisse acompanhar a operação à distância, indicada pelos técnicos como a melhor forma para não provocar distúrbios nos animais.

"O processo de transferência correu todo bem. Não tivemos problemas com nenhum bicho, os únicos problemas foram alguns que não entraram na jaula quando nós queríamos, mas isso faz parte da natureza selvagem deles. E vamos ter na data que tínhamos planeado os 16 animais no centro. O transporte correu bastante bem", garantiu Rodrigo Serra, director do centro e um dos dois veterinários que integram a equipa de nove pessoas que trata dos linces.

Serra assegurou ainda que a adaptação dos 14 animais que já se encontravam no centro e que começaram a chegar em Outubro "parece que também está a correr bem", uma vez que "todos fazem o que os técnicos e tratadores precisam que eles façam, que é comer e ter comportamentos que são naturais desta espécie".

"Eles não só se adaptaram à dieta que lhes damos e aos tratadores que temos, como interagem uns com os outros e até já chamam pelos tratadores. Temos uma paleta de comportamentos bastante boa já", sublinhou Rodrigo Serra.

O director do centro explicou depois como se vai processar a fase seguinte da conservação em cativeiro deste felino, uma das espécies mais ameaçadas de extinção no mundo.

O projecto, que agora completa a sua primeira fase, visa a futura reintrodução dos animais na natureza.

"Vamos prepará-los para a época de reprodução propriamente dita e vamos emparelhar os animais. Vamos fazer com que os quatro casais que temos programados se aproximem cada vez mais, partilhem espaços, possam trocar cheiros e toques, até termos ideia de que as interacções são de tal forma positivas que há poucos riscos em juntá-los sem que se engalfinhem", explicou o director, frisando que o objectivo "é gerir todo o processo de cópulas e reprodução sem que haja baixas por lutas ou pelo que quer que seja".

O responsável adiantou que está em causa "cerca de um mês", porque "a partir do início de Janeiro espera-se que algumas fêmeas possam entrar no cio" e as "cópulas são todas em meados de Janeiro e princípios de Fevereiro".

Serra explicou ainda que a monitorização dos animais dentro do centro é feita através de câmaras, 24 horas por dia, mas acrescentou que "o contributo dos tratadores, que são quem lhes dá comida todos os dias, quem limpa as instalações, quem interage directamente com cada lince, também acaba por ser muito importante".

A comida também é preparada de forma a tentar simular a alimentação que os linces teriam em habitat natural, onde grande parte das suas presas são coelhos, mas também animais mortos e aves.

Portugal terá habitat para libertar animais dentro de três anos

O secretário de Estado do Ambiente disse estar convicto de que Portugal terá um habitat natural preparado para receber linces ibéricos no espaço de três anos e conseguirá chegar a acordo com os proprietários de terrenos agrícolas, florestais e de caça.

"Temos o compromisso com Espanha de termos, num calendário a três anos, pelo menos um local na natureza pronto para o efeito e, ao mesmo tempo, termos as condições de presa para devolvê-los à natureza", afirmou Humberto Rosa.

Humberto Rosa sabe que, para se atingir essa meta, "nada pode ser feito sem a vontade dos proprietários rurais e dos produtores agrícolas florestais, dos caçadores, dos municípios e das organizações não-governamentais de ambiente".

"Diria que há um pré-requisito para a libertação, que é haver uma concertação social com essas partes para o efeito. Tenho a convicção que essa concertação social não é só alcançável como está facilitada, porque há hoje, por exemplo, gestores de caça que, além da sua actividade cinegética, gostariam de poder garantir que o lince, no futuro, é um sinal de qualidade dos seus terrenos", acrescentou.

O governante disse ainda estar convencido de que em Portugal acontecerá "tal como em Espanha, onde 150 proprietários se puseram de acordo, contratualizando a disponibilização dos seus terrenos para o efeito".

"Encontrámos uma quantidade de parcerias" para proteger o felino mais ameaçado do mundo, realçou, acrescentando que "este é o programa de conservação da natureza mais ibérico", frisou Humberto Rosa.

"Estou convencido de que hoje há uma percepção social do significado da biodiversidade que faz com que cada vez mais portugueses encarem com valor o que se está a fazer", sublinhou.

O secretário de Estado do Ambiente acrescentou, no entanto, que "a tarefa mais complicada é a que se segue": garantir que na natureza haverá habitats com condições para os linces viverem em liberdade.

Lusa