José Maria Raposo, do Movimento dos Focolares, veio explicitar as razões do aparecimento da economia de comunhão, incrementada no Brasil em 1991 pela fundadora (Chiara Lubich) daquele grupo da Igreja, que defendeu significar um “salto de qualidade” em relação ao apoio aos mais necessitados.

O empresário considerou que o “grande desafio para a EC” é a “coerência entre pensamento e comportamento” e que consiste no “princípio da gratuidade nas relações comerciais e a lógica do dom como expressão de fraternidade”. A “EC pretende transformar culturalmente o mercado”, testemunhou.

“A EC tem a ver com a cultura do dar”, explicou, considerando que “o capital tem estado na origem da crise”. Neste sentido, defendeu que “os mercados estão desregulados porque não há ninguém que os controle”. “Há uma lógica da maximização dos lucros e o sistema foi feito para que os gestores sejam remunerados pelos resultados que têm”, acrescentou, defendendo que “a competição dos países leva à desregulação do mercado de trabalho”. “Não se criam condições para a estabilidade e constituição de família”, lamentou também.

Maria Raposo explicou ainda que a EC preconiza, para além da partilha de bens, a partilha de “competências e saberes” e disse que “as empresas são um dos pilares da EC”. “Procuram ter a pessoa no centro. As pessoas são para o trabalho e não o contrário. Mais importante do que o trabalho é a relação que conseguimos estabelecer entre nós”, concretizou, garantindo no entanto que estas empresas “existem para criar postos de trabalho e tirar da miséria as pessoas”. “Procura passar cultura do ter para a cultura do dar”, complementou.

Eugénio da Fonseca, presidente da Cáritas Portuguesa, demonstrou a ação sócio-caritativa da Igreja na resposta à crise.

Referindo-se à assistência dos mais necessitados, disse que tem sido muito valorizada a ajuda alimentar. “Tivemos de reforçar essa ajuda na distribuição e na criação de refeitórios”, assegurou, reportando-se também ao aumento dos “encargos com a habitação”, dos “cuidados de saúde” e do “pagamento das despesas da educação”, denunciando que “há alunos que têm as suas notas congeladas porque não podem pagar a propina” e estão a “abandonar o ensino universitário”. Relativamente ao “pagamento de dívidas” lamentou que o Estado tenha deixado “as instituições de crédito andarem em roda-viva”. “Há pessoas que estão num labirinto sem saída”, lamentou.

O presidente da Caritas, que deu informação dos montantes angariados nas diversas campanhas e projetos e dos valores aplicados nas ajudas, adiantou ainda que, no âmbito da promoção, “tem havido preocupação na criação de emprego” e “ajudas de microcrédito na partilha dos fundos de solidariedade das dioceses” e no quadro da intervenção social destacou o pronunciamento do episcopado português, as propostas de reflexão do Conselho Nacional de Justiça e Paz na criação de alternativas para o modelo económico e as propostas da Caritas ao Governo.

Relativamente aos recursos, enumerou o programa “País Solidário”, com apoio da Gulbenkian, destinado a famílias atingidas pela crise que não beneficiassem de qualquer sistema específico de ajuda, o projeto “Igreja Solidária” do Patriarcado de Lisboa, os Fundos Diocesanos e o Fundo Social Solidário da Conferência Episcopal Portuguesa, as coletas (como o Ticket Restaurante, vales sociais).

A terminar, apontou desafios como as necessidades de “repensar a organização da Pastoral Social”, “apoiar organização e funcionamento de grupos paroquiais”. Neste contexto, destacou a criação do Núcleo de Observação Social, criado em 2010, a funcionar já em 13 dioceses e defendeu a mediação junto das instituições particulares e outras entidades, a formação dos cristãos para o conhecimento da Doutrina Social da Igreja, o reforço da partilha cristã de bens e deixou claro que “toda a ajuda aos necessitados é da sociedade civil”.

O padre Lino Maia, presidente da CNIS – Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, criticou as exigências que os acordos de cooperação com a Segurança Social impõem às IPSS da Igreja e defendeu a necessidade de uma maior autonomia e por menor estatização, lamentando que haja uma “vontade de estatizar tudo”.
O sacerdote considerou que “a excessiva dependência rouba a autonomia necessária a instituições e à Igreja”. “Face a novas situações desta crise parece que a Igreja pode ser impedida de exercer a caridade. Em alguns meios, a vontade é mesmo essa porque há algum ciúme da atividade da Igreja. Há interesses por aí que querem afastar a Igreja da prática da caridade e ação social”, denunciou, considerando que no país “a única realidade que está a funcionar bem é a Igreja”. Neste sentido enumerou que das 4.949 IPSS em Portugal, da Igreja são 1.174 centros sociais, 233 outras instituições e 353 organizações das Misericórdias e adiantou que as IPSS da Igreja, com personalidade jurídica, são 41% em Portugal (com ereção canónica), embora existam muitas outras sem ereção canónica e de inspiração católica. “Em cada quatro paróquias há um centro social paroquial”, informou.

O orador defendeu ainda que “há Centros Sociais Paroquiais a mais”, que “nem sempre houve motivações suficientes para a criação” para a criação dos mesmos e alertou para o “cuidado com o excesso de coordenação”.

Exortou ainda à ocupação dos desempregados na “promoção do autoemprego ” e à “economia de proximidade” em que as instituições da Igreja podem ser propícias e lembrou que as ações predominantes nas IPSS da Igreja realizam-se no apoio a crianças e jovens, no apoio à família, na proteção dos cidadãos na velhice e invalidez e na educação e formação profissional dos cidadãos. “Não ficaria mal que a Igreja desse mais conhecimento do que faz”, propôs, lembrando que “há uma opção preferencial pelos mais carenciados, embora não exclusivamente para eles”.

A terminar propôs ainda a instituição do “ministério da diaconia da caridade”. “Os padres estão muito metidos nestas IPSS e este é muito o espaço dos nossos leigos”, defendeu, lembrando que “nem qualquer trabalhador deve ter espaço” nestas IPSS.

Samuel Mendonça

Este texto foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico