“Mesmo numa situação de morte, a vida pode fazer sentido. Tal como sou protagonista dos outros momentos do meu viver, tenho de ser protagonista do momento da vida que é a morte. Tenho de procurar o sentido do viver mesmo no morrer”, considerou o conferencista que apresentou a sua reflexão, intitulada “Saúde e Doença – Uma aproximação a partir da dimensão simbólica do ser humano”, na capela daquela unidade hospitalar perante uma numerosa assistência de médicos e outros profissionais da saúde e muitas outras pessoas que o quiseram ouvir.

Neste sentido, Ambrosio explicou nesta iniciativa sugerida pelo coordenador do Serviço de Assistência Espiritual e Religiosa do Hospital de Faro e promovida pelo Núcleo do Algarve da Associação dos Médicos Católicos Portugueses que “Jesus Cristo não optou pela morte” mas “optou sempre pelo sentido da vida, mesmo no morrer”. O orador defendeu ser necessário “ajudar as pessoas a ser protagonistas do sofrimento e da morte”. “Quando a morte e o sofrimento não podem ser evitáveis temos de ajudar as pessoas a serem protagonistas desse momento da sua existência. Isso torna-se uma situação absolutamente necessária para dignificar a vida humana naquele momento”, sustentou.

Ambrosio rejeitou, no entanto, perentoriamente o sofrimento. “O sofrimento que pode ser evitado deve ser evitado. Não temos que optar pelo sofrimento. Temos é que optar pelo sentido da vida numa situação de sofrimento e à luz desse sentido integrar o sofrimento. E esse é o exercício da fé”, observou, lembrando que “Jesus faz uma opção de viver todo o espectro da sua vida com sentido”. “Ele vive o momento da morte à luz de como viveu toda a sua vida”, concretizou.

O conferencista rejeitou ainda a ideia simplista de que o sofrimento ajuda ao amadurecimento. “Amadureço quando assumo certo tipo de atitudes face a esse sofrimento. Todos conhecemos casos de sofrimento em que a pessoa não amadurece, mas antes se destrói e fica completamente esmagada por aquela situação”, contrapôs, acrescentando que “não é o sofrimento que faz este processo mas a maneira como lidamos com ele”.

No entanto, Ambrosio criticou a tendência atual de afastamento do sofrimento e da morte “como se elas não fizessem parte inerente da vida”, advertiu que “a doença e o sofrimento correm o risco de ser tecnificados e medicalizados” e explicou que “a doença e o sofrimento levam-nos a consciencializar de que a nossa realidade é finita”. “Como nos julgamos os únicos donos da vida, de repente caímos na conta que não o somos. É aqui que podem surgir as dificuldades mesmo na experiência da relação com Deus. Todos conhecemos casos de pessoas que perguntam: porquê eu, meu Deus? Não sou capaz de entender nem um Deus que manda, nem que permite”, referiu, aludindo que “estas situações são um profundo desafio à liberdade humana”.

Exortando à necessidade de “vencer a rutura , a própria finitude e a morte”, apontou o “papel primordial da fé”. “À luz da fé, o ser humano é convidado a percorrer o caminho da reunificação e perceber que, apesar de ser frágil, o sentido da vida está para além do biológico”, evidenciou, acrescentando que “estar de saúde é ser salvo e isto implica com muito mais do que o biológico”.

O orador evidenciou então que “a cura, se vier, pode adquirir contornos de ressurreição”. “Se não for possível a cura, a pessoa pode aprender a viver a experiência da morte como uma experiência de vida limitada, finita e mortal, mas que não acaba ali, nem daquela maneira”, disse, exortando a que se continue a “propor a salvação mesmo no meio da dor e da morte”.

Ambrosio, que defendeu a “qualidade humana” em detrimento da técnica, disse ainda que “ao depender dos outros, o ser humano pode fazer a redescoberta da intersubjetividade como dimensão constitutiva do seu ser”. “Aquilo que verdadeiramente eu sou é esta relação com os outros”, justificou, recordando que “o doente pode acolher até o que não está doente”.

Samuel Mendonça

Ouça a conferência:

"Saúde e Doença – Uma aproximação a partir da dimensão simbólica do ser humano"