“Hoje, um cristão a sério, de uma fé provada e de um amor verdadeiro, não pode pertencer a maiorias”, advertiu o sacerdote à FOLHA DO DOMINGO, no contexto do encontro de espiritualidade que orientou no último fim de semana, no Carmelo de Faro (Patacão).
O padre Agostinho Leal ressalva, no entanto, que “enquanto houver regimes democráticos e enquanto o homem tiver liberdade, a Igreja e o cristão têm o seu espaço”, embora admita haver “grandes resistências e perseguições de muita ordem”. “Não são perseguições como acontecem aos cristãos de Índia ou do Paquistão, mas há”, reconhece, acrescentando que, “se calhar, a perseguição maior é a indiferença”. “Hoje a questão religiosa – se calhar por conveniências de outras estratégias –, é uma questão silenciada. Se calhar também é por isso que, hoje, as pessoas estão mais tristes”, sustenta.
O sacerdote carmelita constata assim que as exigências de uma vida espiritual não estão ao alcance de todos. “Acontece, na vida espiritual, o que acontece um pouco nos restantes setores da vida. Nós, os portugueses, somos prontos a exigir mas quando chega a hora de fazer, retrocedemos um pouco. Queremos ter as coisas sem as cultivar”, critica, advertindo que “muita gente gostaria de ter paz, de ser livre interiormente, de não ser escrava de coisas e até de pessoas, mas isso tem um preço”. “A impressão que tenho é que há muita gente aflita porque quer ter as coisas mas depois não se disponibiliza para encontrar a direção para lá chegar”, lamentou.
O sacerdote lembra ainda que, “no mundo em que predomina o excesso de palavra, o silêncio também tem lugar” e sublinha que “é preciso escutar muito” num tempo em que “se presta pouca atenção à dimensão da oração que tem uma grande fonte no silêncio, no recolhimento e na não-palavra”. “Hoje há muitos grupos de oração baseados na palavra, em que as pessoas falam muito”, constata, contrapondo a “oração do Carmelo” que “procura descobrir a riqueza que está em pararmos e escutarmos para reorientar o caminho”. “É uma oração silenciosa, que nos leva a esvaziarmo-nos de nós para que Deus possa entrar”, explica.
O padre Agostinho Leal lembra, por isso, que “a oração é um caminho que tem várias fases”. “O recolhimento é uma fase marcada pela escuta, pela ação de entrarmos dentro de nós, de pararmos para nos conhecermos melhor, para escutar a voz de Deus, a voz de Cristo e para nos encontrarmos com Ele para fazermos com Ele o caminho”, explica, reconhecendo que esta “é uma necessidade de hoje”.
O sacerdote carmelita considera assim que importa parar para definir a direção e o caminho a tomar na vida através da “oração do silêncio, do recolhimento e da contemplação”. “A oração é sempre um lançamento e nunca um estancar. A oração envia-nos com uma direção e uma orientação que vem da escuta da palavra de Deus e do encontro com Cristo”, destaca.
Samuel Mendonça