Entretanto e de modo inexplicável, nenhum depósito de ossadas humanas foi aí (Chauvet) encontrado. Só de maneira dispersa, através da reunião de inúmeros ossos e crânios de muitos animais, e já atrás apontados neste estudo. Não existiriam, talvez, intenções funerárias humanas, mas sim rituais “Sacrificiais” animalistas que se ligam, genuinamente, a intensões fúnebres. Uma espécie de “mesa” ou “altar” natural e com um impressionante crânio depositado no seu topo há 20.000 anos, e de um “Urso”, resta ainda “congelado” no tempo em Chauvet, e como prova inequívoca de ritos sacrificatórios gentios. Muitos outros crânios espalhados pelo chão das suas caves mas, sobretudo, o que está ainda enigmaticamente depositado na mesa sacrificial, são o paradigma dessa relação entre as centenas de imagens rupestres de veneração e os ritos sacrificiais mas, que são paralelamente fúnebres, na origem do “Paganismo”.

Conclusivamente, o “Naturalismo” é a primeira forma prática de Pintura parietal, o “Expressionismo” a estilização eleita, com base no “Desenho” e pela mais original representação artística “Animal” (“Zoomórfica”). Terão estas pinturas e de arte rupestre do sul de França (firmadas pela “assinatura” da própria mão e de um mestre “Adão” de “Chauvet”) mas, também muitas das esculturas, seguramente, mais de 30 milénios de existência. Muitas delas conservadas pela própria natureza e em ambiente propício, lacradas por sobrepostas cristalizações, e que as revestem de calcite tal como um cuidadoso “verniz” final. E estariam, através desse mesmo estilo expressionista, umbilicalmente ligadas artística e paralelamente aos vários continentes. Pelo menos na Europa mas, também espalhadas pela África e, na Ásia também, sendo que o 5º continente (Austrália) ainda aquele que detém, e ainda hoje, continuadores dessa Arte e do “Pontilhismo”, através da “pintura aborígene” e que se assemelha em muito (ver figuração pré-histórica de Chauvet, em cima).

As mais recentes imagens de pinturas murais da América neolítica também o indiciam. Neste contexto, nem o “Tempo” nem o “Espaço” geográfico são sinónimo de evolução, pelo menos na sua formação artística, e no sentidoque queiramos imprimir ao significado de progressão estilística. Talvez se possa falar em etapas de evolução espiritual, e do próprio “Homem”, e até acerca da sua religiosidade primitiva sobrevinda de um “Paganismo” primordial.

Assente na imagética animal, zoológica ou antropomorfista, transpondose muito depois para a “Idade” politeísta, e na relação gentílica futura com a noção de uma “Alma” monoteísta e, por fim, na descoberta de “Deus” criacionista, “Único”. Mas, essa lenta mudança teológica e antropológica seria consumada através da “Sua” natureza religiosa primitiva, de índole mágica, e por práticas rituais funéreas, primeiro zoomórficas e venatórias, sacrificiais também, acompanhadas pela do “Homem” espiritual numa sequente transmissão exemplar e de tradição artística. E tudo isso, testemunhado no espaço geográfico europeu mas, também plasticamente herdado e, espólio comprovável por todo o “Espaço” do resto mundo.

Os primeiros exemplos de Arte rupestre são, baseados no “Zoomorfismo”, Cinegéticos e venatórios mas, de ordem “Sacrificial” fúnebre. Só muito depois, numa nova etapa espiritual criativa, estas primitivas manifestações gentílicas, dariam início à religiosidade politeísta zoológica ou antropomórfica. A mais recente celebração pagã monoteísta e até à Era de Cristo, ritualizada através de actos sacrificiais ou em holocaustos, é ainda manifestado biblicamente através do Judaísmo. É assim importantíssima herança religiosa do “Antigo Testamento” e mais original, tem testemunho por meio de um culto idolátrico que se funde no gentilismo pagão muito mas, muito mais primitivo. A arte rupestre parietal também apresenta, e como já se referiu neste ensaio, alguns raros aspectos artísticos geométricos particulares, e de arte “Abstracta” especialmente. O “Sagrado Coração”, e imagem já publicada antes nesta rúbrica é impressionante. Mas que são também motivos simbólicos idolátricos, essencialmente ícones religiosos, através dos grafismos executados por palmas e dedos de pequenas mãos femininas, e que se aproximam em muito da actual arte aborígene australiana. O “Homem” de Chauvet, nesta fase particular muito mais ancestral, parece-nos já autónomo do reino animal, e é essência “Espiritual” mas, “Cósmica” também. Essa relação tem uma dimensão astral, traduz-se noutra forma especial de adoração e veneração: através das “constelações” e de muitas “estrelas” ou “flores” representadas pelas pinturas impressas nas paredes. (continua)

Vítor Cantinho
Arquitecto e Ensaísta

O autor deste artigo não o escreveu ao abrigo do novo Acordo Ortográfico