A Jornada de Pastoral Litúrgica, que ontem teve lugar no Centro Pastoral de Ferragudo com a participação de cerca de 260 pessoas de todo o Algarve, desafiou à “arte de bem celebrar”.

Aquela ação de formação, que contou a participação de muitos jovens, foi promovida pelo Departamento da Pastoral Litúrgica da Diocese do Algarve, sob o tema “A Liturgia, escola da Fé cristã”, para os agentes daquela área da pastoral da Igreja Católica: catequistas, leitores, ministros extraordinários da comunhão, acólitos e músicos.

Na iniciativa, o padre Carlos de Aquino, responsável por aquele organismo e um dos conferencistas do dia, aludiu à necessidade de se promover uma “arte de celebrar” que exija uma “celebração correta, realizada com esmero e com dignidade, para que seja autêntica na sua natureza e nas suas expressões externas”, lamentando que ainda aconteçam “muitos desvios da centralidade da liturgia”, “muita distorção, inteiras desfigurações (mesmo em nome da criatividade), muito desvirtuamento e deploráveis aberrações de ritos e de inteiras celebrações em nome da tal participação ativa”.

O sacerdote, que se referiu aos temas “A Celebração Cristã: Fundamentos e Desafios” e “A Liturgia, Escola da Fé Cristã”, considerou mesmo que a liturgia “empobreceu” porque a Igreja “deslocou o que é identitário” da celebração cristã. “Notamos com desagrado que, no afã por fazermos uma comunidade participar, nos deslocámos todos nós – bispos, padres e leigos – daquilo que é essencial do mistério da liturgia e da celebração cristã, que mais aparece como uma coisa que a gente faz do que como uma realidade que nos é dada e que manifesta a presença fecunda de Deus, em Cristo, no Espírito”, criticou, lamentando que as liturgias não sejam “festa”. “É necessário, sem fundamentalismos, esforçarmo-nos na busca de uma liturgia mais autêntica de celebrações cristãs que desvelem o rosto e a verdade da Igreja que é corpo e esposa do Senhor”, complementou.

Aquele responsável reprovou “liturgias muito pomposas, com muito incenso e muita criatividade”, mas “sem alma”. “As verdadeiras missas de corpo presente, onde a alma está ausente embora o coração ainda bata, são as missas de cada domingo e de cada dia da semana”, criticou, lamentando que a liturgia seja uma “coisa marginal” e não o “centro onde pulsa o ritmar da vida”. “Celebramos mal. Não nos encontramos com a paz, não formamos o coração. Porque esbanjamos a liturgia e não a vivemos com verdade, ela deixou de ser importante. É algo de secundário”, lastimou.

O conferencista lamentou que os católicos estejam “acomodados” e sejam “assistentes” e considerou ser preciso entender o que significa “participar plena, consciente e ativamente”. “Temos de dar sabor e conteúdo às nossas celebrações cristãs. A celebração deveria criar abertura, provocar proximidade, podendo levar mesmo à comunhão de ideais. Cada celebração cristã na terra deveria ser a antecipação daquilo que a gente há-de viver no céu”, sustentou, lembrando que “a primeira exigência para uma boa celebração é que seja oração”, ou seja, “diálogo com Deus, escuta e resposta”, uma ideia também destacada pelo outro conferencista do dia. O padre Flávio Martins evidenciou igualmente que as liturgias da Igreja deveriam levar toda a comunidade ao “encontro, meditação e resposta”.

O padre Carlos de Aquino advertiu ainda que “não há vida cristã sem a liturgia”, evidenciando que esta dimensão da vida da Igreja é tão importante quanto as restantes. “Temos que nos deixar de fundamentalismos. “Sem a liturgia e os sacramentos, a profissão de fé não seria eficaz porque faltaria a graça que sustenta o testemunho dos cristãos”, explicou, citando Bento XVI.

O sacerdote que exortou a valorizar os ritos e os símbolos, o que é “imutável” e o que pode ser “suscetível de mudança”, desafiou a “celebrar com criatividade”, evitando dois “exageros”: a “execução rígida e legalista dos rituais” e a “improvisação descabida”.

Já o padre Flávio Martins, que se referiu ao tema “A Palavra de Deus e a Fé”, considerou “prioridade” “dar espaço ao silêncio”. “Deus também fala no silêncio. Na liturgia há que existir e insistir no tempo de silêncio porque não somos consumidores dos mistérios da fé”, afirmou, criticando a “pastoral do consumo”.

A jornada terminou com encontros setoriais, sendo orientado pelo padre Vasco Figueirinha para os cantores e músicos, por Luís Santos para os ministros extraordinários da comunhão e acólitos e pelo padre Carlos de Aquino para os leitores e catequistas. O primeiro grupo analisou a instrução “Musicam Sacram, documento de 1967 sobre a música sacra na liturgia, e destacou alguns cânticos litúrgicos com base na Introdução Geral ao Missal Romano. O segundo grupo evidenciou a importância da palavra de Deus e avaliou o que deve ser liturgicamente valorizado nas festas da catequese. O terceiro grupo sublinhou a importância da dimensão eucarística e do sacerdócio naqueles ministérios e foi motivado para a formação.

Samuel Mendonça