O presidente do Conselho Pontifício para a Promoção da Nova Evangelização (Santa Sé) lembrou ao clero do sul a importância do “mistério” quando se vivem “tempos da tecnocracia”.

“Na nossa pastoral, sobretudo quando falarmos de antropologia e criação, é bom que tenhamos diante de nós o mistério”, aconselhou o orador na atualização do clero das dioceses do Algarve, Beja, Évora e Setúbal que decorreu de 20 a 23 de janeiro em Albufeira com 116 participantes, entre bispos, padres e diáconos.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

Começando por sublinhar que “o homem é colocado no centro de toda a criação, mas de maneira livre”, D. Rino Fisichella constatou que hoje está “cada vez mais submetido ao predomínio da tecnologia”. “A máquina assume cada vez mais poder até ao ponto de estabelecer, até por via legislativa, quando é que se está em presença da vida e da morte, quando é que se pode extrair órgãos e quando é que se pode fecundar uma célula”, observou, acrescentando que “em todo este horizonte, o mistério da existência pessoal parece desfalecer diante do poder da técnica, a ponto tal que o entusiasmo pela beleza que provoca emoções parece faltar cada vez mais”.

O colaborador do papa Francisco lembrou haver “questões às quais a técnica e a ciência não pode responder”. “Precisamente diante dos dramas que a humanidade experimenta, diante do poder da criação, a técnica mostra a sua impotência, a sua debilidade e o seu próprio limite”, realçou, lembrando o caso de Francis Collins, antigo diretor do National Center for Human Genome Research, – “ateu de ferro, como gostava de se definir” –, “e que agora, depois de ter desempenhado esse papel de máximo prestígio para um investigador, depois de ter identificado os genes responsáveis por doenças como a fibrose quística e outras coisas, abre-se inevitavelmente à descoberta de Deus e do mistério”.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

O orador realçou, por isso, que “a fé não coloca o mistério no fim de um raciocínio que, quando não tem argumentos, conclui que nem tudo se pode compreender e, portanto, apela para o mistério”. “Se fosse assim cairíamos na armadilha do racionalismo que colocou tudo no primado da razão e quando não tem mais argumentos evoca de modo casual o destino ou o mistério. Não é essa a conceção cristã do mistério”, advertiu, considerando que o mistério deve ser colocado no início do argumentário.

Por outro lado, D. Rino Fisichella aludiu ainda à importância do repouso, evidenciando-o como “condição antropológica”. “Quanta pastoral seria eficaz se fossemos capazes de repousar”, considerou, explicando que “o repouso serve primeiro do que tudo para as relações interpessoais, para a contemplação da criação, para dar louvar a Deus” e para o encontro com a comunidade. “É fundamental o repouso na vida de um sacerdote. Cada vez somos menos, fazemos mais coisas, cansamo-nos”, constatou.

O presidente do Conselho Pontifício para a Promoção da Nova Evangelização criticou ainda “algumas paróquias em Itália” que fazem catequese, celebraram primeiras comunhões e crismas ao domingo “precisamente para envolver as famílias”. “Eu não estou muito de acordo com esta perspetiva porque significa apropriar-se da dimensão do repouso e usá-la instrumentalmente para uma exigência pastoral”, referiu.