(Cheio, como às vezes fica o coração…)

O momento era triste e tinha de o viver, descascando-a como a uma cebola, até que deixasse de fazer chorar. E percebeu-se que estava triste, pelas reações que teve, pelo choro que não prendeu, pela voz que embargou. Como vivem juntos, todos perceberam o momento negro por que passava. Não se adiantaram com comentários. Talvez haja alturas em que se perceba, pelo ar que entra nos poros, que há dores que têm de ser carpidas pelo próprio, ao seu ritmo, à sua maneira, com o nosso silêncio e olhar só a servir de embalo.

E então, apareceu, de um, um postal, com uma frase especial, a dar força e a levantar o ânimo e do outro, humor, que desconstruiu momentos e que fez rir, trazendo à tona aquele poder magnífico e libertador que só o sentido de humor tem e isso fez, naquele momento, toda a diferença. Mostraram-se presentes, com a subtileza do afeto, “calçaram os sapatos do outro”, experimentaram a dor chatinha que ali estava e que incomodava. E, a seus ritmos e a seus jeitos, foram bálsamo, unguento, colo. Rebentei de orgulho de mãe com a evidência, naquele episódio pequenino, da presença de cada um dos meus filhos na dor do outro irmão. O meu coração de mãe, inchou como um balão de feira. E pensei: Pronto! Têm o principal, têm-se uns aos outros, mesmo que gritem, se exasperem com as diferenças, se arreliem, se desgastem a contar à mãe e ao pai o que não se fez, não se arrumou, não se previu. Mesmo que tenham para todo o sempre identidades diferentes, uma genética tão diferente que lhes dita o físico, o pensar e o agir. Mesmo assim, sei que terão sempre o maior tesouro: uns e outros, na vida de cada um. Esta presença, este vínculo, este sentir cego de que alguém estará sempre por nós.

Escrevi muitas vezes sobre isto, este tesouro maravilhoso, que é a experiência de ter irmãos, esta experiência única de viver num palco diário de afetos, zangas, laços e oportunidades de crescimento e de perdão, com personagens ao vivo e a cores, a viver ao nosso lado.

Será sempre também, uma fonte inesgotável de assunto e de reflexão. Dou graças a Deus muitas vezes por ter podido ter três filhos e por lhes ter conseguido dar, a cada um, a maior herança: a de terem irmãos. E sei que esta fase da vida em que vivem sozinhos, sem os Pais, será mais um palco inesgotável de experiências únicas que os aproximarão ainda mais. E serão sempre, assim o espero, para cada um dos irmãos, um colo seguro e forte, daqueles inabaláveis e eternos.

Tão bom!

Aproveitando a quadra natalícia, estendo a todos os leitores do Folha do Domingo, votos de um Feliz e Santo Natal, gratos pela singeleza do presépio que, assim, simples, terno e sossegado, nos traz a profundidade da verdadeira mensagem de amor.