A Igreja do Algarve recebeu ontem do Patriarcado de Lisboa uma relíquia de São Vicente, padroeiro comum às duas dioceses, cuja solenidade hoje celebram e que foi entregue pelo seu vigário geral ao bispo do Algarve na celebração de vésperas que teve lugar na Sé patriarcal.

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Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

Para além de D. Manuel Quintas, que presidiu à celebração, a mesma foi ainda concelebrada por três cónegos do Cabido da Sé de Faro — Carlos de Aquino (chantre), Manuel Rodrigues e Rui Barros Guerreiro — e contou também com os diáconos Albino Martins, Luís Galante e Vítor Sabino, para além de mais 52 leigos que se deslocaram a Lisboa em representação da diocese algarvia.

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Na celebração, o bispo do Algarve, destacando aquele “sinal e expressão de comunhão eclesial” entre as duas dioceses, considerou que a veneração da relíquia doada — um osso da mão — proporcionará um “impulso espiritual e missionário” às comunidades algarvias. “Espero e desejo que a presença desta relíquia na nossa diocese aumente ainda mais a nossa fé e, sobretudo, nos ajude a crescer em dinamismo missionário, em anúncio e testemunho do Evangelho nas terras algarvias”, afirmou D. Manuel Quintas no final da celebração.

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Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

Na homilia que proferiu durante a oração — participada por uma representação do Cabido da catedral lisboeta, encabeçada pelo seu deão e vigário geral daquela diocese, o cónego Francisco Tito — o bispo diocesano realçou a importância das relíquias dos santos martirizados. “O testemunho dos mártires, com o sacrifício da própria vida, continua a falar-nos hoje através das suas relíquias, atualizando em cada tempo e em cada comunidade cristã, o seu amor a Cristo e ao Evangelho”. As relíquias de São Vicente têm um alcance que ultrapassa a sua condição de ser parte, ainda que mínima, do seu corpo”, referiu.

D. Manuel Quintas, que agradeceu, na pessoa do deão, ao patriarca e a todo o cabido da Sé patriarcal, “a disponibilidade, expressa desde o primeiro o primeiro contato, em ceder esta relíquia à Diocese do Algarve”, na evocação dos 850 anos da chegada a Lisboa dos restos mortais do padroeiro comum que aquela diocese assinalou no último ano. “Com a partilha desta relíquia, agradeço igualmente a oferta do seu relicário, que nos permitirá o seu transporte seguro para o Algarve, bem como a sua exposição, desde já, à veneração, passando por diversas comunidades paroquiais, com realce para as próximas catequeses quaresmais que promoveremos na Catedral de Faro, sobre São Vicente”, acrescentou D. Manuel Quintas.

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Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

O bispo do Algarve realçou que “São Vicente continua, hoje, a ser testemunho e apelo a amar até ao fim, no seguimento de Cristo na sua doação plena ao Pai e a toda a humanidade”. “Se até agora, como dioceses, estávamos sob a invocação e proteção do mesmo patrono, agora com a partilha desta relíquia do nosso patrono, certamente que ganharemos mais força com a sua invocação e proteção para, à sua semelhança, também nós fazermos da nossa vida uma oblação agradável a Deus, dando a nossa vida à semelhança de Cristo, de São Vicente pela causa do reino, por seguir e servir Cristo e o Evangelho”, declarou, acrescentando: “Que a palma do martírio de São Vicente continue, pela sua intercessão, viçosa e verdejante no coração dos cristãos das nossas dioceses e seja sinal da vitalidade da fé que nos inspira e anima no testemunho de Cristo. Possa a invocação de São Vicente, nosso padroeiro comum, fazer de todos nós semente lançada à terra com a certeza de que é dando a vida, como o grão de trigo, que produziremos os frutos abundantes do Reino de Deus”.

Também o cónego Francisco Tito se referiu àquele gesto. “Estou certo que a presença da relíquia de São Vicente no Algarve contribuirá para o incremento da vida cristã”, afirmou, lembrando que as relíquias de São Vicente que, desde 1173 se guardam naquela catedral, “são um tesouro” para para os cristãos lisboetas. “Alegra-nos muito que outros mantenham o mesmo apreço e devoção pelo mártir de Valência [Espanha]”, acrescentou.

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Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

O deão do Cabido da Sé patriarcal de Lisboa referiu que “de São Vicente, diácono da Igreja de Saragoça [Espanha] e mártir em Valência, não se conservaram palavras”, mas “conservou-se o seu corpo martirizado com tal crueldade que até os corvos, mudando a sua inclinação natural, se convertem de predadores em protetores”. “Ao olhar para isto, lembramo-nos da carta aos hebreus referindo-se a Cristo: «Não quisestes sacrifícios nem oblações, mas deste-me um corpo» (10, 5). Um corpo para fazer a vontade de Deus. É este corpo, ou partes dele que conservamos e agora, com muita alegria, partilhamos!”, acrescentou.

O vigário geral do Patriarcado de Lisboa evidenciou que “seria fácil ao diácono Vicente escapar ao martírio”, bastando “dizer o que os poderosos queriam que dissesse”. “Bastava fazer os que os donos disto tudo queriam que fizesse: deitar umas pedrinhas de incenso nas brasas que ardiam diante do ídolo, ainda que o ídolo fosse o Imperador… Mas a Vicente, como bem sublinhou Santo Agostinho, não importa o sofrimento, a pena, importa, isso sim, a causa, importa o amor recebido e assim retribuído ao Senhor Jesus. Este seu corpo, este seu testemunho, nos nossos dias é capaz de pôr a correr sangue novo, vigoroso e revigorante, neste corpo enlanguescido, porventura já moribundo das nossas pessoas e estruturas diocesanas”, concluiu.

A peregrinação da Diocese do Algarve a Lisboa para receber a relíquia do padroeiro martirizado no longínquo ano 304 teve início logo pela manhã. 53 dos 58 peregrinos na capital partiram desde Loulé num autocarro cedido pela Câmara Municipal, sob a presidência de D. Manuel Quintas, rumo ao santuário do Cristo Rei, em Almada, onde foi celebrada a Eucaristia presidida pelo bispo do Algarve às 11h30. Os algarvios ainda tiveram possibilidade de visitar algumas das igrejas como a de Santo António de Lisboa.

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Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

Naquela celebração, o responsável católico lembrou ter sido o rei Afonso Henriques que há 850 anos mandou levar as relíquias do mártir do Cabo de São Vicente para as preservar porque o Algarve estava sob domínio muçulmano na altura “e também porque era um grande devoto” daquele santo. “Fez o voto de que se conseguisse conquistar Lisboa construiria um monumento a São Vicente de fora e queria também que os seus soldados ganhassem ânimo para continuar a conquista até ao sul”, lembrou D. Manuel Quintas, recordando ainda que “os cristãos de Valência, na invasão muçulmano do século VIII, foram fugindo, preservando e levando as relíquias até ao extremo mais ocidental, àquele que mais tarde seria o Cabo de São Vicente, nome dado pelos peregrinos que iam lá rezar e fortalecer-se na fé”.

De regresso ao Algarve já durante a noite, os peregrinos que voltaram de autocarro rezaram o terço durante a viagem e chegaram a Loulé às 22h10.

Diocese do Algarve peregrina a Lisboa para trazer parte das relíquias do padroeiro S. Vicente