Foi apresentado no passado sábado, 17 de dezembro, o caderno número 18 do Arquivo Municipal de Loulé, sobre as três visitações de D. Francisco Gomes de Avelar realizadas entre 1790 e 1816 à paróquia de São Clemente e à sua colegiada, documentos que constam nos registos dos livros de visitas referentes aos anos de 1791 a 1825.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

O estudo sobre as visitas é da autoria de João Sabóia e Luísa Martins e conta com prefácio do pároco de Loulé que apresentou a publicação. Na apresentação que teve lugar no espaço do próprio Arquivo Municipal, o cónego Carlos de Aquino destacou aquele trabalho, iniciado em 2009, como “um referencial de memória”. O sacerdote lembrou que o antigo bispo do Algarve pertenceu à Congregação dos Padres do Oratório (oratorianos) e “desde o início do seu magistério procurou viver atento não somente ao estado espiritual, mas também temporal de todo o território”.

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“O seu primeiro cuidado era a honra do Senhor, o seu serviço. Mas também o reparo material da sua casa, examinando tudo com prudência, lucidez e discernimento seja na apreciação dos bens das igrejas, das confrarias, das fábricas, seja no trato com o clero e na relação destes com o povo exigindo o exemplo e a dignidade que o ofício impunha, seja na administração dos Sacramentos, na manifestação da verdade assente numa caridade misericordiosa entrelaçando a justiça com a verdade do amor”, afirmou, referindo-se a “um pastor fazedor e promotor de cultura, inflamado no amor da virtude, homem de profunda oração e garante da unidade e da comunhão, um valente defensor da pátria na defesa da liberdade e da independência, grande e sublime mestre, um edificador visionário como os profetas”.

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O cónego Carlos de Aquino lembrou que D. Francisco Gomes de Avelar visitou a paróquia de São Clemente de Loulé de 13 de novembro de 1790 a 30 de janeiro de 1791, a 10 de agosto de 1794 e a 26 de julho de 1806. “É muito interessante notarmos a forma como exprime o seu coração de pai na fé anotada na saudação das pastorais emanadas”, destacou, sublinhando, entre outras, a “carta pastoral datada de 10 de janeiro de 1795 onde apresenta São Vicente, mártir, como padroeiro da diocese, propondo a celebração anual da festa que deve ser guardada como dia santo a 22 de janeiro”.

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“Revisitando a memória das suas visitas pastorais a Loulé e das suas cartas, percebemos melhor o ideal que galvanizou e unificou a sua vida, dando sentido a todo o seu serviço; a missão que exerceu com tanta e inexcedível competência, como forma de servir melhor e melhor exprimir a sua fidelidade ao Evangelho, promovendo um dinamismo transformador; o cultivo persistente de discernimento, de sabedoria, adquirido pela experiência da vida, por um tocar o humano e as suas feridas, pela obediência à Palavra, que assumiu como luz e força em toda a sua existência. Penso que tudo isto, pode e deve constituir para quem revisita, hoje, estes textos, um profundo e apelativo desafio em ordem a um futuro que desejamos fecundo e novo”, considerou.

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João Sabóia, antigo diretor do Arquivo Distrital de Faro, licenciado em história e especializado em ciências documentais, vertente arquivo, pela Universidade de Lisboa, acrescentou que “a visita era uma das ferramentas fundamentais que os bispos detinham para afirmar a sua jurisdição, fiscalizar e exercer o seu papel pastoral e corretivo sobre os fiéis e clero, que com o Concílio de Trento (1545-1563) se tornaria mais frequente, abrangente e mais efetiva”.

O coautor salientou que D. Francisco Gomes de Avelar “procura incentivar o ensino e a cultura”, dando como exemplo a abertura do Seminário diocesano em Faro em 1797, e lembrou que “o bispo do Algarve teve igualmente um papel importante como vice-presidente da Junta Provisional do Governo Supremo do Reino”. “Na realidade, ele é o verdadeiro governante do Algarve”, evidenciou, referindo que ao longo da visitação há “diversas referências não só às invasões francesas, como também em relação à chamada guerra das laranjas que vai opor Portugal à França”.

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Também coautora, Luísa Martins, considerou que aquele trabalho visa “ser um fundo que facilita a leitura, torna o trabalho mais célere e permite ao investigador desenvolver o seu trabalho, mas não só”. A investigadora do Centro Interdisciplinar de História, Culturas e Sociedades da Universidade de Évora realçou que aquele estudo também é útil aos párocos e aos restauradores.

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Luísa Martins lembrou que D. Francisco Gomes de Avelar “foi um homem do iluminismo, da ciência, da razão” e “um homem do espírito, também”. “Soube conciliar isso e preocupou-se com a sua diocese, com a qualidade de vida das pessoas, com o bem-estar. Ele vai ver as estradas, as pontes, preocupa-se com a qualidade dos figos que são vendidos, com os preços, com a higiene das populações e com a saúde, de tal modo que, sendo a diocese proprietária das termas de Monchique, vai fazer com que a partir dos bens da mitra os doentes mais pobres tenham oportunidade de se irem tratar aos banhos termais de Monchique”, acrescentou, considerando que “era uma pessoa que tinha uma visão para lá daquilo que era costume aqui na região”.