Não esqueçamos da relação muito particular do Cristianismo com o Orfismo, e este particularmente ligado ao culto a Diónisos, sobretudo através dos 2 templetes situados no norte de Portugal (e hoje também “desaparecidos”), de “Arnal” e “Martim Gil” em Leiria. Os seus mosaicos pavimentares, actuam em paralelismo iconográfico com o reino animal e o mundo vegetal, e específicos de 2 “Cristos-Orfeu” mas, especificamente quando comparado com o Dionisismo, em ligação icnológica funcional e, especialmente, pela acção ritual funerária, ou ainda que relacionada com outra função, herdada do paganismo ou do gentilismo. Estes 2 templetes seriam de planta centralizada e com “êxedra” à semelhança do Templo de Milreu. “Cristo-Apolo” (“Apolo Pastor”) também é outra imagem vulgar nesta fase protocristã, e igualmente plasmada em alguns frescos da arte catacumbária em Roma mas, também espalhadas pelo resto do Império. Os subterrâneos da actual Basílica de S. Pedro no Vaticano, detém o mais antigo “Cristo-Hélio” (séc.II-III) e, precisamente no centro do mausoléu dos “Julii”, mosaico de outro magnífico tecto e, com várias cores. Todo envolto por uma extensa videira báquica, nele se vislumbra outra cena com o episódio bíblico de “Jonas”, e alusivo à ressurreição de Cristo. Um “pescador” e ainda outro “pastor” (“Cristo-Apolo”) completam o seu quadro geral.

Muito depois, o hispânico Teodósio (379-85), por fim, irá estabelecer a religião cristã como religião oficial do império, banindo de vez, o paganismo. Este último imperador absolutista sediado no oriente, está intimamente associado ao mais paradigmático centro arqueológico e religioso paleocristão de Carranque (região de Toledo), com a sua “Domus-Ecclesiae” (1ª fase) “protocristã” e, por fim, a “Basilica” primitiva (2ª fase) paleocristã e, essencialmente “protobizantina”. Com duas formas arquitectónicas marcantes e, com implantações distintas mas paralelas entre si, correspondentes precisas de duas etapas construtivas bem distinguíveis (arquitectura protocristã e paleocristã). A primeira estrutura arquitectural, mais antiga, e de origem doméstica pagã (“Domus”), em Carranque, relativa a uma congregação eclesiástica nascente e, desde logo, agregada à bem delineada e originária “Ecclesia” e importante baptistério (também “gémeo” de Milreu), consumando a fase do cristianismo primitivo ou Protocristã: a “Domus-Ecclesiae”. Depois, é interpolada paralelamente e em local destacado, pela mais “recente” fase de implantação arquitectónica e do período Paleocristão: a original “Basilica”. A espiral do tempo e da “mesma” época, plasmada em duas fases edificantes e, arquitecturalmente, em dois espaços bem distinguíveis e, “paralelos” entre si em termos temporais. Estilisticamente destacados, são também patentes tipológicas e, sobretudo, com 2 marcantes “Protótipos” construtivos localizados especialmente na mais paradigmática estação arqueológica hispânica e mundial. Hoje, este Centro Religioso arqueológico, e exemplar basilar de 2 fundamentais “arquétipos” arquitectónicos do mundo católico, encontra-se devidamente musealizado, e acessível através de uma ponte suspensa que atravessa um dos afluentes ao rio “Tagus”, e na orbita da muito antiga sede cristã (“metropolita”) de “Toletum” (Toledo). (continua)

Vitor Cantinho
Arquitecto e ensaísta

O autor deste artigo não o escreveu ao abrigo do novo Acordo Ortográfico