
O investigador Nuno Loureiro considera que a desertificação no interior leste algarvio é um problema estrutural e difícil de inverter, defendendo que replicar os modelos de desenvolvimento do litoral no interior é um erro.
“Trata-se de um cenário que é estrutural, de limitação dos recursos naturais e da capacidade de ocupação do território”, refere Nuno Loureiro, apontando a escassez de água como o elemento chave no processo de desertificação, que torna as condições do Sotavento (leste) algarvio mais severas do que as do Barlavento (oeste), onde há mais precipitação.
O professor da Universidade do Algarve defende que a região tem que ter dois modelos de desenvolvimento distintos e considera que estar “a puxar para o interior o modelo de desenvolvimento do litoral é uma perda de tempo” sendo “um erro replicar para o interior os modelos que funcionam no litoral”.
Nuno Loureiro é um dos especialistas que fez uma intervenção numa mesa redonda sobre a desertificação no Algarve Interior, uma iniciativa organizada no passado sábado pela Comissão Regional do Algarve de Combate à Desertificação, em articulação com a Associação Cultural Bons Ofícios, que decorreu no Centro de Educação Ambiental de Marim, em Olhão.
Segundo aquele investigador, as alterações climáticas – que se têm traduzido no aumento da temperatura e da concentração das precipitações -, assim como as características geológicas e dos solos, são condições naturais que “não vão mudar” e, se mudarem, será para que o sotavento algarvio se torne ainda mais inóspito.
De acordo com Nuno Loureiro, apesar de se ter agravado nas últimas décadas, o problema da desertificação no interior algarvio “não é nada de novo” e os registos históricos demonstram que a zona do Sotavento “sempre foi um território com dificuldade” para oferecer condições que permitissem a permanência das populações.
“Aquele território nunca foi apto para ter uma população significativa, permanente e com uma certa dinâmica demográfica e socioeconómica”, refere, sublinhando que as “forças para repelir” a população são tão grandes que se torna “muito difícil contrariá-las”, sendo possível, apenas, tentar atenuá-las.
Como tal, defende, “há que criar um modelo de desenvolvimento de futuro para o interior que tenha em conta as suas limitações naturais, climáticas e geológicas” e que até poderia ser implementado no Algarve como projeto-piloto, para que pudesse depois ser extrapolado para outras zonas do país.
Por outro lado, sublinha, “é indispensável que haja modelos na gestão dos recursos hídricos”, sobretudo nas zonas interiores, porque “existe um desfasamento entre a perceção da escassez de água no território e haver água nas torneiras”.
Mas, alerta, “não existem soluções fáceis”, e a implementação de medidas é complexa e demorada, sendo necessário que haja um compromisso político a 20 ou 25 anos para permitir que os modelos de desenvolvimento se consolidem.
Além do debate sobre o tema, foi inaugurada a exposição “Viagem Interior”, de Telma Veríssimo e lançado um livro, com o mesmo título, daquela fotógrafa, na sede do Departamento da Conservação da Natureza e Florestas do Algarve.