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Foto © Samuel Mendonça

A Festa em honra de Nossa Senhora da Piedade, conhecida como “Mãe Soberana”, está, no presente momento, a merecer a atenção de uma equipa multidisciplinar, no sentido de poder vir a integrar o Inventário Nacional do Património Cultural.

A ideia não é recente, como explica o padre António de Freitas, pároco da paróquia de São Sebastião, de Loulé, dando conta de ter havido «há cerca de dois anos um primeiro contacto por parte da Direção Regional da Cultura do Algarve, que nos apresentou (à paróquia e ao município) esta possibilidade». Todavia, «esse primeiro encontro não veio a ter consequências algumas», acrescenta. O assunto só voltou a ser mencionado aquando da tomada de posse de Dália Paulo (anterior diretora regional de Cultura do Algarve) como chefe de Divisão de Cultura e Património da Câmara Municipal de Loulé (CML). «Clarificadas e esclarecidas várias lacunas que haviam ficado do encontro anterior, achou-se por bem avançar», refere o padre António de Freitas, salientando, ainda, que «quando já o processo estava em fase de reflexão entre a paróquia e o município, a atual diretora regional da Cultura, a dra. Alexandra Gonçalves, veio abordar-me acerca do mesmo assunto, pelo que lhe disse já estar a avançar».

O momento que dá início ao trabalho é, pois o da «consensualização entre os protagonistas da manifestação religiosa Mãe Soberana – paróquia de São Sebastião, Homens do Andor e a Câmara Municipal de Loulé, através do seu Museu Municipal – da importância de dar início ao processo de inventariação desta manifestação religiosa, assim como os termos em que a mesma seria realizada», explica Dália Paulo.

Depois deste passo inicial, identificaram-se algumas pessoas que deveriam integrar a equipa que trabalharia na preparação deste processo, equipa essa que integra o pároco da paróquia de São Sebastião, padre António de Freitas, Dália Paulo e Ana Rosa Domingos, do Município de Loulé e Horácio Ferreira, em representação dos Homens do Andor. A coordenação da equipa que realiza todo o trabalho de campo pertence a Vanessa Cantinho de Jesus, antropóloga, que conta com a colaboração do historiador João Romero Chagas Aleixo (que realizou uma tese de Mestrado na área disciplinar da História, sobre a Mãe Soberana) com a colaboração de Entre Imagem.

«O trabalho de campo», conta Dália Paulo, iniciou-se «no princípio do mês de março, para acompanhar os preparativos da realização da Mãe Soberana 2015», tendo decorrido simultaneamente o «trabalho de investigação bibliográfica, quer documental quer audiovisual». Ao mesmo tempo, o Museu Municipal de Loulé (que faz o acompanhamento técnico à equipa e disponibilizou documentação sobre o tema) preparou duas exposições, que se encontram patentes ao público: a exposição de Arte Contemporânea A Força do Andor, das cineastas Helena Inverno e Verónica Castro e a exposição Projeto Mãe Soberana, dos alunos do 3.º e 4.º ano da Escola EB 1 Mãe Soberana.

Também com o objetivo de recolher informação, a antropóloga Vanessa de Jesus «realizou uma atividade com o Kit de Recolha do Património Imaterial, da Direção Geral do Património Cultural, aos cursos de catequese da paróquia de São Sebastião», como relata Dália Paulo, que conclui que após a realização da Festa Grande, o trabalho de campo estará «praticamente, terminado», iniciando-se, nessa altura, o «preenchimento da Ficha do Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial, prevendo-se que este trabalho esteja concluído no final de julho de 2015».

A integração da Festa neste inventário é, como explica a chefe de Divisão de Cultura e Património da CML, «a única forma de proteção legal juridicamente válida a nível nacional», no que toca ao património imaterial, proteção essa, prevista na Lei 139/2009, de 15 de junho e a Portaria n.º 196/2010, de 9 de abril. Ela permitirá, segundo Dália Paulo, «dar resposta a uma necessidade de reunir a documentação e estudo da manifestação de forma a valorizar a transmissão do conhecimento, assim como de permitir o acesso à informação e divulgação públicas, de forma sistematizada, deste património cultural imaterial». Desse modo, garante-se, como afirma a dirigente da CML, que a legislação é cumprida no que concerne a «”garantir o seu conhecimento e valorização, bem como a sensibilização para a sua existência, através da sua adequada identificação, documentação, estudo e fruição” (alínea e), número 1, artigo 2.º da lei 139/2009, de 15 de junho)».

Para Dália Paulo, inscrever a festa em honra da Mãe Soberana no Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial é importante, «porque se trata de uma manifestação religiosa que reflete uma forte identidade louletana numa perspetiva histórica de longa duração e que, acima de tudo, tem uma forte componente de transmissão intergeracional». O padre António de Feitas corrobora estas afirmações, salientando a dimensão da festa como «a maior expressão popular de fé no sul de Portugal» e considerando que todo o processo permitirá que se «aprofunde o conhecimento desta festa e devoção», para além de garantir que «este culto mariano seja reconhecido como identitário, manifestando-se, assim, que a Fé continua a ser uma marca profunda na história, na vida, na unidade e na felicidade de um povo e de um país». E o sacerdote acrescenta mesmo: «Apesar de vivermos tempos de uma laicidade profunda, este processo vem dar mostra de que não se pode simplesmente apagar a Matriz Cristã da identidade e da História».

Por outro lado, a integração da festa em honra da Mãe Soberana neste Inventário poderá permitir, conforme afirma Dália Paulo, a realização de «uma candidatura à UNESCO, de acordo com as Listas instituídas pela Convenção de Salvaguarda do Património Cultural Imaterial, de 2003».

«A paróquia de São Sebastião de Loulé é a entidade que assume e preside a esta candidatura», explica o padre António de Freitas, «pois a Festa da Mãe Soberana é, antes de mais, uma festa religiosa, inserida na vida da paróquia de São Sebastião de Loulé», mas refere o papel do município e demais parceiros como «fundamental», classificando como «excelente» a cooperação existente e o acompanhamento do processo por parte da autarquia. «Este trabalho conjunto tem sido muito positivo e este processo tem avançado», destaca o sacerdote, «devido a este excelente entendimento e trabalho entre as duas entidades referidas».

Por seu turno, Dália Paulo também enfatiza a forma como decorre este trabalho de cooperação, referindo-se-lhe como «exemplar» e salientando que «cada parceiro disponibiliza e dá a este processo tudo aquilo que está ao seu alcance». No caso do município de Loulé, o apoio inclui «meios técnicos e financeiros».

O processo de preenchimento da ficha de inventário deverá estar concluído, como foi mencionado, em julho, altura em que será submetida, conforme indica Dália Paulo, «à Direção Geral de Património Cultural», aguardando-se, depois, a sua validação. E como afirma o padre António de Freitas, o desejo de todos é que o processo «siga o percurso normal, sem pressas para que se estude o mais que se possa e tudo seja devidamente aprofundado».