O presbítero, que veio para o Algarve em Março de 2009 para colaborar com a comunidade franciscana presente na diocese, está agora de saída para o Convento do Varatojo (Torres Vedras) por troca com o frei Santos Ferreira que virá para o Algarve no final do próximo mês de Agosto.

O frei José Maciel, de 73 anos, natural de Carvoeiro (Viana do Castelo) teve nove irmãos e, encorajado pela família – concretamente pelo exemplo de duas irmãs que também seguiram a vida religiosa consagrada, chegando a ser também missionárias em Cabo Verde, Angola e Brasil –, e por entusiasmo com um franciscano que trabalhava na sua terra natal, entrou para o Colégio das Missões Franciscanas, em Montariol (Braga), com apenas 10 anos.

Ali esteve durante vários anos, completando mais tarde um ano de noviciado, três de Filosofia e quatro de Teologia, tendo terminado em 1960, ano em que foi ordenado por Manuel dos Santos Rocha (arcebispo de Mitilene, auxiliar de Lisboa) na capela do Seminário da Luz (Lisboa).

Entre 1960 a 1963 frequentou o curso de Teologia Superior em Roma e posteriormente concluiu o doutoramento em Teologia Pastoral na Universidade Latranense daquela cidade italiana.

Em Outubro de 1965 foi para a missão em Moçambique onde esteve até 2008, antes de vir para o Algarve, tendo sido professor e director de uma escola do Magistério Primário, secretário-geral da Diocese de Maputo, reitor do Seminário da Diocese de Chimoio e pároco da catedral da Diocese da Beira. Para além destas trabalhou ainda nas dioceses de Inhambane e Lichinga. Por isso colaborou de perto com o falecido D. Ernesto Gonçalves Costa, Bispo do Algarve entre 1977 e 1988, que foi o seu primeiro bispo em Moçambique.

Sentiu na pele a força maléfica da guerra, sobretudo a civil que diz ter “alastrado e paralisado muito mais” do que a ofensiva contra os portugueses. Nesse contexto, assistiu à morte de um religioso que viajava no seu carro e que foi atingido pelo rebentamento de uma mina anti-pessoal que ainda o feriu também, assim como a uma religiosa que também vinha com eles. “Foi o acontecimento que me marcou mais”, afirma peremptório, complementando que chegou a sentir a sua segurança em risco porque, para além dos colegas mortos por minas ou em emboscadas, “a Renamo raptava pessoas que podiam dar nas vistas” e “raptou muitos missionários”.

Mas os tempos da mudança do regime também não foram fáceis. “Vivemos tempos difíceis quando mudámos do sistema capitalista para o socialista, inspirado por Marxismo-leninismo, com todas as nacionalizações associadas por meio das quais a Igreja ficou sem nada”, testemunha, lembrando que a missão da Igreja era composta também por escolas, hospitais, orfanatos, entre outras valências.

Nesta altura, muitos foram os seus colegas que desistiram de Moçambique para irem trabalhar noutros países. “Muitos de nós ficámos lá com a certeza de que as coisas iriam mudar e a Igreja acabou por liderar um processo de reconciliação e foi mediadora da paz entre Renamo e Frelimo. Valeu a pena suportarmos aquelas adversidades pois demos uma esperança ao povo que passou a olhar-nos com esse sentido de reconhecimento”, salienta, lamentando que exista agora um “capitalismo selvagem”.

Depois de 43 anos em África, o regresso à Europa não foi fácil. No entanto tornou-se, segundo o sacerdote, uma opção inevitável. “Vi que já não tinha forças e que podia ser facilmente substituído por elementos moçambicanos”, relata, garantindo que foi “o último missionário franciscano português” em Moçambique.

Veio para o Algarve onde só tinha estado de passagem e gostou de aqui ter estado, embora deixe claro que “o ambiente em Portugal é muito diferente do que vivemos em Moçambique”. “Moçambique é uma sociedade mais viva e mais jovem”, diz.

Dos 50 anos de ordenação faz um balanço “bom” e, sentindo-se “contente”, destaca que o seu sacerdócio foi “uma grande graça”. “Exerci-o com entusiasmo e ainda hoje estou entusiasmado. Ao olhar para trás vejo que atendi muita gente e, apesar das dificuldades, recordo com saudade esse tempo”, complementa.

Este ano foi homenageado primeiramente em Montariol, juntamente com outros colegas de curso, e depois também na Comunidade Franciscana de Faro.

O presente ano pastoral na Diocese do Algarve, para além do jubileu do frei José Maciel, é ainda marcado pela celebração de mais dois a que a FOLHA DO DOMINGO também se referirá brevemente: os 25 anos de ordenação sacerdotal dos cónegos Gilberto Soares Santos (29 de Junho) e José Rosa Simão (14 de Agosto).

Samuel Mendonça