A multinacional, pertencente ao grupo alemão Eismann, começou a operar em Portugal em 1998, dedicando-se à venda porta a porta de cerca de 80 produtos congelados, entre carne, peixe, refeições prontas, pão, legumes e gelados.

Com uma frota de mais de 180 carrinhas frigorificas amarelas, imagem de marca da empresa aliada a uma buzina característica, a Family Frost tinha uma equipa de 270 profissionais espalhados pelo país.

Com salários em atraso há quatro meses, uma das vendedoras da empresa no Algarve disse que a informação sobre o processo é “muito escassa” e que a situação é “obscura”, já que descobriu o que se estava a passar por si própria. Lúcia Monteiro, que trabalhou como vendedora durante um ano e meio, suspendeu o seu contrato de trabalho por falta de pagamento, à semelhança de outros colegas, depois de perceber que a empresa tinha pedido insolvência.

O pedido foi entregue no início de março no Tribunal do Comércio de Lisboa, mas a informação só chegou aos funcionários do polo do Algarve através de um anúncio dirigido aos empregados, colocado no centro de distribuição. No documento lê-se que a empresa “continua a operar” e que o procedimento foi “necessário para a apresentação de um plano de recuperação”, sendo que todas as pessoas envolvidas seriam afetadas “sem exceções”.

Contudo, Lúcia desconfia que o pedido de insolvência tenha a ver com problemas internos e não com a falta de clientes, porque a empresa “faturava muito”, havendo dias em que chegava a fazer sozinha cerca de mil euros.

A empresa empregava diretamente no Algarve cerca de 30 pessoas, distribuídas pelos centros de Faro e Silves. Nesta região, a falta das carrinhas amarelas deixou muitos idosos dependentes dos filhos que vão aos supermercados, acabando também com um momento de convívio em muitas povoações rurais.

"Muitas vezes, o único momento de convívio semanal que tinham era quando eu chegava, era um momento de animação e de conversa que não tinham o resto da semana", disse a ex-vendedora Lúcia Monteiro de 49 anos.

Lúcia fazia cinco rotas semanais pela serra e barrocal do Algarve, num total aproximado de 500 quilómetros, mas confessa que este foi o trabalho que lhe deu "mais gozo na vida", apesar da sua dureza, e assegura ter saudades das tarefas que se viu obrigada a deixar há um mês, quando a empresa pediu a insolvência. "Tenho pena pelas amizades que fui construindo, mas também pelo muito que aprendi com aquelas pessoas e pelo outro Algarve que fui descobrindo ao longo destes meses", explicita.

Lúcia fazia as rotas de Quarteira/Vilamoura, Fuzeta, Manta Rota/Altura e Conceição de Faro, mas era a dura rota de Vaqueiros, que a obrigava a fazer 300 quilómetros num dia, que lhe dava mais prazer, porque foi aí, entre as populações serranas do Nordeste da região, que conheceu "o Algarve mais profundo", como diz.

"Dava-me gosto também saber que estava a levar a uma população mais distante um tipo de produtos com uma qualidade que muitas vezes não era atingida nos supermercados da cidade, embora fosse ligeiramente mais caro", afirma, ainda recordada da alegria que lhe mostravam muitos idosos que não tinham fácil acesso ao peixe.

Para desfazer dúvidas, realça que entre os seus cerca de 500 clientes não havia só idosos: "Havia por exemplo imensos professores e casais jovens que queriam ter refeições prontas sempre à mão".

Celestina Gago, 69 anos, com a mãe doente em casa e sem muitas oportunidades de se deslocar, classifica como "péssimo" o fim das sortidas da "Family Frost", o que a obriga agora a novas rotinas.

Residente no lugar de Besouro, próximo de Conceição de Faro, Maria José, 77 anos, tem saudades dos rissóis, "que eram muito melhores que os do supermercado", que agora a filha lhe traz da cidade, mas também gaba os gelados.

"Em média talvez gastasse 50 euros por semana, mas não tinha uma quantia fixa, dependia muito", afirma a reformada, que se recorda com alguma mágoa o dia em que "avisaram que iam deixar de vir e depois não vieram mais".

Liliana Lourencinho com Lusa