As XX Jornadas de Ação Sociocaritativa da Diocese do Algarve realizadas hoje apelaram a que se passe “de uma espécie de assistencialismo, ao amor que dignifica, que constrói e reconstrói o coração e a vida”.
Naquela iniciativa que teve lugar no Centro Pastoral e Social de Ferragudo, sob o tema “A Sinodalidade como caminho de caridade”, e que reuniu 30 representantes de Cáritas Paroquiais, de Conferências da Sociedade de São Vicente de Paulo (vicentinos) e grupos sociocaritativos paroquiais, o orador clarificou que “a opção preferencial pelos pobres não é uma opção de benevolência ingénua”. O padre Pedro Manuel lembrou que, apesar de a Igreja reconhecer naquela preferência a “prorrogativa fundamental do serviço da caridade”, “o Papa especifica que esta não é uma preferência sociológica, mas um lugar teológico onde a salvação de Deus acontece”.

“Qualquer ação benévola não pode substituir esta caraterística essencial da Igreja que é não só parte do evangelho, mas parte deste processo eclesial que o Papa Francisco quer”, completou o sacerdote da Diocese do Algarve, falando da “opção preferencial pelo pobre no contexto de uma sinodalidade que se torna caridade e de uma caridade que é caminho também para a sinodalidade”. O conferencista destacou assim “a sinodalidade e a caridade, a caridade e a sinodalidade como porta que se abre a todos para o conhecimento de Jesus Cristo”.
“Podemos inundar as nossas ações sociocaritativas e de índole espiritual, e até numa perspetiva assistencialista, com imensas palavras, esquecendo que a palavra primeira é a da opção pelos pobres”, acautelou.
O sacerdote aproveitou então a atual crise de refugiados ucranianos para exemplificar com uma interpelação o que poderá significar essa opção preferencial pela dignificação daquele que sofre. “O que é que eu tenho de fazer para quando chegarem cá estes irmãos com a mesma dignidade do que eu que precisam de um coração, de um espaço, de uma casa, de um trabalho?”, questionou.
“Que grande oportunidade teremos agora neste momento da história, que não é melhor nem pior. Tem as doenças próprias da sociologia encarnada em cada época da história. É o nosso momento. Isto significa que precisamos de passar de uma conceção em que o estrangeiro, o simples, o pequeno é discriminado para uma compreensão de convivência social onde uma espécie de cidadania à luz do Cristianismo nos garante a todos uma plena inclusão e, sobretudo, um lugar onde todos, independentemente das suas diferenças, são capazes de ter um papel e, sobretudo, de transmitir a sua missão”, considerou.

O padre Pedro Manuel apelou a que se esbatam as diferenças entre evangelizadores e evangelizados. Estes últimos, disse, “são evangelizadores porque são membros do povo de Deus, têm muito a dar e a ensinar”. “Todos somos encorajados a considerar o encontro com os últimos, com os pobres, com aqueles que são destinatários do nosso amor, da nossa caridade como uma ocasião propícia para nos deixarmos também nós evangelizar por Cristo”, sustentou.
“O Papa pede-nos que os «pobrezinhos», que às vezes gostamos de ter na nossa «coleção», se sintam, à luz do evangelho, tão filhos de Deus como eu ou como vós, como aqueles que os apoiam”, afirmou, defendendo a necessidade de “novos caminhos”. “É preciso que neste caminho de evangelização e de apoio exterior aconteça, sobretudo e especialmente, o apoio interior que reconstrói a pessoa para além da fome que o seu estômago pode sentir”, salientou.
O sacerdote considerou que “o desafio fundamental que o processo sinodal representa para a vida da Igreja” é perceber “o que significa comunhão em termos de inclusão, destinada a todos os membros do povo de Deus, especialmente os pobres, sobre a autoridade do Espírito, de modo a que todos se sintam corresponsáveis na vida e na missão da Igreja”.
O orador defendeu que “a ecologia humana e a ecologia da terra são a verdadeira mudança que a Igreja precisa de colocar nas suas ações pastorais e nos seus programas, acompanhando a libertação daqueles que, a partir das armadilhas do mundo, se pode tornar também expressão de armadilha espiritual e pastoral para a própria Igreja”. “Pode acontecer que algumas das nossas programações pastorais nasçam no conforto de um sofá e que essas estratégias estejam apenas destinadas a olhar aos indicadores ou aos algoritmos ou até aos resultados estatísticos”, advertiu, apontando ao “modo de ser da Igreja”: “rezar para depois atuar”.
Por outro lado considerou que hoje, o tempo atual “não pode ser marcado pela falta de esperança”. “Sobretudo esta Igreja que está sempre em contexto de reforma deve ser vista, projetada e imaginada com a esperança própria que nasce do Cristianismo. Qual é a reforma que devemos fazer? É a que nasce da escuta do povo de Deus, da oração, da invocação o Espírito e daquela que nos coloca todos em perspetiva de escuta, caminho e serviço”, afirmou.
A terminar disse que a “conclusão do que é a sinodalidade como caminho de caridade” deverá ser a seguinte: “olhar para o destinatário do meu amor como caminho de conversão do meu próprio caminho e oportunidade para que também eu faça com ele, em Jesus, um verdadeiro caminho para chegar ao céu”.
“A finalidade desta época sinodal que a Igreja vive e, creio também, desta conferência que a Cáritas Diocesana do Algarve propôs é que, favorecido o processo de consulta, sejamos capazes de articular diferenças, aspetos, envolver pastores, fiéis, e, sobretudo, fazer caminhar, ainda que de forma diferente, todas as realidades locais que, de forma específica, fazem acontecer a Igreja”, observou.
O orador, que suscitou a reflexão dos presentes com interrogações sobre alguns tópicos relativos ao documento sinodal, disse ser preciso que em contexto sinodal, todos, “padres e leigos”, aprendam que “a estrutura circular da Igreja convida a um certo respeito por aquilo que a voz do Espírito Santo diz àqueles que não receberam o sacramento da Ordem”.
Lembrando que a Cáritas promove aquelas jornadas porque durante muito tempo o Departamento da Pastoral Sociocaritativa esteve entregue à sua coordenação, o padre Pedro Manuel disse ser “preocupante” aquele organismo “não ter, do ponto de vista da ação, como suas estas jornadas que são muito mais do que as jornadas da Cáritas”. “Devem ser as jornadas da caridade na nossa Igreja diocesana”, considerou.
O orador defendeu ainda para uma comunhão “mais efetiva” entre os diferentes agentes sóciocaritativos que estes se sentem à mesa, “nomeadamente a Cáritas, os Vicentinos e alguma expressão do que são os grupos sociocaritativos”. “O grande problema da sinodalidade não é fora da Igreja, é dentro dela”, alertou, apelando ainda a “uma estrutura de apoio às IPSS do ponto de vista social, jurídico e de acompanhamento psicológico”.
Nas jornadas estiveram representantes das Cáritas Paroquiais de Boliqueime, Cachopo, Lagoa, Loulé, São Brás de Alportel, dos grupos sociocaritativos das paróquias de São Luís, São Pedro e da Sé de Faro e da Conferência de Tavira de São Vicente de Paulo.