
Juan Ambrósio afirmou no passado sábado que “a misericórdia é o desígnio primeiro de Deus”, de tal modo que a criação é o “primeiro gesto” da sua misericórdia.
Na Jornada Teológico-pastoral da Diocese do Algarve, que decorreu no Centro Pastoral e Social de Ferragudo sob o tema “A Misericórdia Divina, fonte de vida”, com a participação de cerca de 250 pessoas, o teólogo defendeu que, tal como a salvação, a misericórdia não é reação de Deus ao pecado do homem.
“Não é uma simples resposta ao pecado do ser humano, de tal maneira que a misericórdia estaria condicionada pelo pecado do ser humano. Pelo contrário, é aquilo que Deus é e, portanto, é a partir daquilo que Ele é que Ele vai reagir com tudo o que nós façamos”, afirmou na conferência (áudio disponível abaixo), sob o tema “Usar de misericórdia para com o teu irmão”, que apresentou para evidenciar a dimensão social da jornada.

O orador começou por destacar que Deus usa a sua misericórdia por “olhar a condição humana”. “Ele é misericordioso connosco porque conhece a condição humana, porque olha para a condição humana a partir daquilo que ela é. Nós, então, também devemos ousar olhar a misericórdia divina a partir daquilo que ela é”, sustentou.
Ambrósio advertiu que o presente Ano Santo não é para ser mais um acontecimento. “O papa quer que o jubileu marque um antes e um depois e que as coisas não continuem iguais depois de estarmos um ano celebrar a misericórdia de Deus. [O papa] está a dar o sinal de que, daqui para a frente, a marca tem de ser a misericórdia”, considerou.
Neste sentido, o conferencista referiu-se à intenção do papa ao convocar o presente Ano Santo, evidenciada na bula de proclamação que escreveu. “O papa Francisco está a dizer assim: «A todos quantos lerem esta carta saibam o que eu estou a pedir às comunidades cristãs, aos cristãos, à Igreja; o que é o meu desejo profundo que as comunidades cristãs, que os cristãos e que a Igreja, enquanto tal, façam»”, afirmou.
“A vida humana é uma experiência de acolhimento e reconhecimento, de amor e de cuidado, de dom e gratuidade, de perdão e reconciliação e tudo isto são notas características da misericórdia. Mas se a misericórdia divina é tudo isto, então ela tem de ter consequências para a vida do cristão, para a vida e para pastoral da Igreja, para o contributo dos cristãos na edificação da comunidade eclesial e para o contributo dos cristãos na edificação social e na construção da história”, prosseguiu, considerando que a misericórdia “tem a ver com o próprio modo de acreditar e implica a existência vicária dos cristãos”. “A maneira como testemunhamos e concretizamos a misericórdia de Deus é critério evidente que nos deveria ajudar a perceber como acreditamos em Deus; de que maneira o nosso acreditar em Deus é ou não algo que brota das nossas entranhas ou é só um discurso que dizemos a nível intelectual”, destacou.
Neste sentido, Ambrósio considerou que a misericórdia, ou seja, “o amor que brota das entranhas por todos os outros, tem de ser a marca d’água dos cristãos” porque é a marca d’água da misericórdia de Deus.

“«Há momentos em que somos chamados, de maneira ainda mais intensa, a fixar o olhar na misericórdia, para nos tornarmos nós mesmos sinal eficaz do agir do Pai»”, citou Ambrósio, considerando que o momento histórico atual é um desses momentos. “Estamos verdadeiramente num momento fulcral da história humana. E porque é da história humana, tem que ser também da história eclesial”, afirmou.
Lembrando que o papa escreve que «a credibilidade da Igreja passa pela estrada do amor misericordioso e compassivo», o conferencista defendeu que chegou o tempo de regressar ao essencial. “O que é o essencial? É a «montanha» de ternura. O essencial é tratarmos das fraquezas e das dificuldades dos nossos irmãos”, acrescentou, numa alusão à exortação apostólica ‘Evangelii gaudium’.
Sobre a relação entre a misericórdia e a justiça, o conferencista afirmou que “a misericórdia é o «clímax» da justiça de Deus”. “A misericórdia de Deus não deve ser refletida como um caso da justiça divina, mas, antes pelo contrário, é a justiça divina que deve ser entendida a partir da misericórdia divina”, advertiu, considerando que “a misericórdia é a justiça característica de Deus”.
O teólogo evidenciou ainda sobre o significado que o papa pretende que tenham as “Portas Santas”. “Ousemos a «Porta Santa» como a entrada para fazermos a nossa peregrinação, mas sobretudo, como porta de saída para levar a misericórdia de Deus ao mundo. E que o sinal da porta santa não seja só interpretado como a porta que eu franqueio para entrar, mas como a porta que a Igreja é convidada a franquear para sair com a misericórdia de Deus e a dar a uns e a outros”, sustentou, lembrando que Francisco deseja que “«a todos, crentes e afastados, possa chegar o bálsamo da misericórdia como sinal do Reino de Deus»”.
Conferência de Juan Ambrósio: