
O padre António de Freitas alerta que a “subversiva” ideologia do género pretende “aniquilar, anular, desestruturar e desconstruir o que Deus, pela natureza, inscreve em cada ser humano”.
O sacerdote algarvio diz ser “urgente” que a Igreja em Portugal aborde este tema por se tratar de “uma verdadeira revolução antropológica que a todos afetará e que poderá determinar mesmo uma enorme mudança civilizacional”. “Em países da América do Sul e da América Central, como o Peru isto, já é tratado há 20 anos pelas Conferências Episcopais e pelas dioceses”, alertou no colóquio promovido pelo núcleo do Algarve da Associação de Médicos Católicos Portugueses que decorreu na última segunda-feira no auditório do Hospital de Faro.
Citando o Papa Bento XVI, o orador explicou que, segundo esta “nova filosofia da sexualidade”, “o sexo já não é um dado originário da natureza que o homem deve aceitar e preencher pessoalmente de significado, mas uma função social que cada qual decide autonomamente”. Neste sentido, alertou que, segundo aquela ideologia, uma criança nasce “sem sexo definido” e que, por isso, “não deve ser considerada do sexo masculino ou feminino” porque “depois ela fará esta escolha”, de acordo com a “construção social”.
Neste sentido, o conferencista advertiu que “já existem escolas na Suécia e na Holanda onde não se pode chamar o aluno de menino ou menina”. “Chama-se apenas de criança porque ele deve decidir, quando crescer, se será homem ou mulher”, lamentou, advertindo para o perigo da indiferença ou do pretenso respeito pela esfera individual de cada pessoa. “O pior que nos pode acontecer é que estas coisas sejam, por um lado, relegadas apenas ao foro individual de cada um, ou por outro lado, como tem acontecido em Portugal com outras matérias fraturantes, que seja decidido por apenas 230 pessoas sem que os restantes 10 milhões possam pensar, sejam chamados a opinar e tenham direito a decidir”, alertou.

Citando um médico chileno especialista em bioética, o padre António de Freitas sustentou tratar-se de “uma tentativa de afirmar que não existe uma identidade biológica em relação à sexualidade”, frisando aquilo que é “sonhado e pretendido” pela ideologia: “seremos o que quisermos, independentemente da natureza, dos nossos traços físicos ou anatómicos, da nossa psicologia ou génio. Seremos o que quisermos, construindo-nos ou desconstruindo-nos sempre que o nosso desejo e a nossa vontade o entenderem”, acrescentou, aludindo ao que defende aquela corrente.
Lembrando as afirmações de Friedrich Nietzsche de que “Deus está morto” e de Markus Gabriel de que “o mundo não existe”, o sacerdote salientou o que levou à origem da ideologia. “Deus morreu, logo eu sou o meu deus. O mundo não existe, eu posso construi-lo ou fazer a sua desconstrução porque eu sou deus. Negar a existência de Deus, como causa originante de tudo o que somos, e negar a existência do mundo com desígnios determinados por Deus e pela própria natureza foram apenas dois passos decisivos para que os defensores da ideologia do género pudessem agora dar o passo da negação de que a humanidade se complementa na existência de homens e mulheres, do sexo masculino e feminino”, afirmou, lamentando que seja “neste estado de sítio que vão crescendo as novas gerações e que se vão moldando as novas mentalidades”.
O conferencista alertou que “o conceito de género tem vindo a ser sugerido em muitos lugares como verdade científica, escondendo uma teoria político-social cujas raízes estão na filosofia marxista da luta de classes”. “É dentro deste campo filosófico e axiológico que foi semeada e desenvolvida a ideologia do género, baseada no famoso aforismo de Simone de Beauvoir: «não se nasce mulher, fazem-na mulher». Encontramos diante de uma realidade, sobretudo, defendida por grupos filosóficos, ideológicos e partidários que têm como base o marxismo, pois neste é defendida a igualdade como via mestra da felicidade, implicando a desconstrução de todas as diferenças, mesmo que estas sejam matrizes identitárias do ser humano como é o caso do sexo masculino ou feminino”, sustentou.
Citando o então cardeal Ratzinger, o orador evidenciou que “nestes últimos anos têm-se delineado novas tendências na abordagem do tema da mulher”. “Uma primeira tendência sublinha fortemente a condição de subordinação da mulher, procurando criar uma atitude de contestação. A mulher, para ser ela mesma, apresenta-se como antagónica do homem. Um tal processo leva a uma rivalidade entre os sexos onde a identidade e o papel de um são assumidos em prejuízo do outro. Uma segunda tendência emerge no sulco da primeira: para evitar qualquer supremacia de um ou de outro sexo tende-se a eliminar as suas diferenças, considerando-as simples efeitos de um condicionamento histórico-cultural”, apontou.
Em conclusão, o sacerdote apresentou o “valor da antropologia bíblica como chave de compreensão do ser humano (entendido como homem e mulher) e de desconstrução da subversiva ideologia do género”. “A ideologia do género não só contrasta com a visão bíblica cristã, mas também com a verdade da pessoa e da sua vocação, prejudica a relação pessoal e a médio prazo defrauda a sociedade; não exprime a verdade da pessoa, mas distorce-a ideologicamente”, conclui, citando a Conferência Episcopal Portuguesa.
Conferência do padre António de Freitas: