O presidente da Confederação Portuguesa do Voluntariado (CPV) disse ao clero das dioceses do sul do país que “a crise acentuou os fatores tradicionais da pobreza em Portugal, mas também trouxe novas formas de pobreza”.

“Hoje temos pessoas com licenciaturas a viver na pobreza”, realçou Eugénio da Fonseca na exposição que apresentou aos bispos, padres e diáconos das dioceses do Algarve, Beja, Évora e Setúbal nas suas jornadas de atualização que decorreram online de 18 a 20 deste mês.

Aquele dirigente, que abordou o tema ‘A Opção Preferencial pelos Pobres, num Mundo desigual. Ser Igreja inclusiva’, garantiu existirem “sectores que foram produtivos no campo empresarial durante muitos anos”, cujas empresas que os constituíram têm agora os seus os responsáveis “falidos e pobres”.

Com base relatório do Instituto Nacional de Estatística deste mês, Eugénio da Fonseca disse que “a taxa de pobreza subiu de 16,2% em 2019 para 18,4% em 2020”. “Correspondeu a um acréscimo de cerca de mais de 228 mil pessoas em situação de pobreza”, sustentou, acrescentando que “em situação de pobreza e exclusão social” são neste momento “2,3 milhões de pessoas”.

O presidente da CPV adiantou que “a incidência da pobreza nos desempregados aumentou de 40,7% em 2019 para 46,5% em 2020”, que “a população empregada em situação de pobreza aumentou de 9,6% para 11,2%” e que “a incidência da pobreza da população reformada aumentou de 15,7% para 18%”.

Aquele responsável referiu que muitos beneficiários do Complemento Solidário para Idosos “tiveram de partilhar com as suas famílias os bens monetários que tinham para que os seus filhos e os seus netos não vivessem uma pobreza mais agressiva” e que “está a aumentar o endividamento das famílias em Portugal”. “Se o vírus não fez aceção de pessoas, as suas consequências atingiram de forma diferente os mais vulneráveis”, lamentou, acrescentando que “esta pandemia veio acrescentar novos problemas aos problemas já existentes”. “Só temos pobreza envergonhada porque estigmatizámos os pobres”, lamentou.

Eugénio da Fonseca considerou que a anterior crise económica e financeira, vivida entre 2008 e 2013, “deixou rastos de sofrimento o que ainda não estão superados” e que a atual crise irá agravar-se quando acabarem as medidas que têm servido de suporte às pequenas e médias empresas. “Há quem diga que é preciso aumentar a riqueza para que depois se possa distribuí-la aos pobres. O problema não está no aumento de riqueza. Está na distribuição da riqueza que se produz”, acrescentou.

O orador advertiu que “a ação caritativa na comunidade cristã não pode ser um complemento benéfico de todas as outras respostas eclesiais”. “É uma dimensão essencial sem a qual se corre o risco de se tornar o doutrinamento numa teoria e a liturgia num cultivo vazio”, alertou, exortando a “fazer com que os serviços caritativos e sociais expressem o amor de Deus”.

Eugénio da Fonseca disse que mais de 40% das paróquias portuguesas terão grupos de ação social organizados e acrescentou ser preciso “rejuvenescer” aquelas organizações e não se limitar a ir às consequências da pobreza, mas ir às causas dos problemas que provocam essa pobreza para evitar uma ação assistencialista.

Lamentando a “desarticulação entre os diferentes grupos eclesiais e destes com os outros”, apelou a “uma ação caritativa que seja programada, preventiva e feita em rede”. “Olhemos para as instituições sociais como meios subsidiários que hoje podem existir e amanhã podem não ser necessários”, pediu ainda, considerando existir atualmente o “perigo” do “tecnocratatismo da ação social”. “Passámos de uma fase de amadorismo para uma de excesso de tecnocracia”, criticou.

“Gostava de pedir aos senhores padres que nunca digam que aquilo que estão a fazer compete ao Estado. Estamos a fazer aquilo que nos compete nesse princípio fundamental da Doutrina Social da Igreja que é o da subsidiariedade”, prosseguiu, acrescentando também que a opção preferencial pelos pobres tem que ter em conta o fortalecimento espiritual, do sentido do transcendente que toda a pessoa tem em si.