Perante milhares de pessoas que, uma vez mais, acorreram ao jardim Manuel Bivar, em plena baixa de Faro, D. Manuel Quintas lembrou que, “à morte de Cristo, confirmada pelo seu sepultamento, seguiu-se a sua ressurreição testemunhada por Pedro”. “Cristo foi crucificado, morto e sepultado. Todavia não podemos deter-nos apenas nesta verdade de fé evocada em Sexta-feira Santa. Cristo morreu e foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia”, afirmou o prelado, acrescentando que o Deus dos cristãos não é um Deus dos mortos, mas dos vivos.

E porque “a celebração do mistério da Páscoa de Cristo, e de cada cristão, não termina junto à sepultura”, mas “irrompe em plenitude na manhã da ressurreição”, o bispo diocesano, admitindo “muitas motivações” para a participação naquela manifestação de piedade popular, advertiu para o perigo da incongruência de algumas. “Seria a negação de uma verdade essencial da nossa fé e a nossa presença nesta procissão uma contradição evidente caso nos sentíssemos mais mobilizados para acompanhar Cristo à sepultura do que para acreditar na sua ressurreição”, afirmou.

Por outro lado, D. Manuel Quintas frisou que a ressurreição de Cristo é o “modelo e horizonte da nossa própria ressurreição”. “A morte e a sepultura são uma passagem para uma vida de comunhão plena com Deus”, elucidou.

O bispo do Algarve exortou ainda a que cada um seja “imagem de Cristo vivo” com o “testemunho da fé”, através de uma “participação mais assídua” na vida das paróquias algarvias e de uma “maior honestidade” na vida pessoal e profissional, bem como por meio da construção de “maior harmonia” na vida familiar e de uma “atitude de serviço e solidariedade com todos”.

Promovida pela Santa Casa da Misericórdia de Faro, a Procissão do Enterro do Senhor, a mais imponente realizada no Algarve, percorreu as principais artérias da baixa farense e contou este ano com a participação do Coro de Câmara da Sé “Cantati Domine”, sob a direção do maestro Rui Jerónimo, que interpretou alguns trechos de música sacra relativos à morte de Cristo.

O secular préstito procura anualmente reviver, com densidade silenciosa, o episódio protagonizado por José de Arimateia. Pilatos, depois da confirmação da morte dos condenados, entregou o corpo de Jesus a este membro do conselho do Sinédrio para que fosse sepultado. “Enquanto os romanos abandonavam os corpos dos justiçados na cruz, os judeus faziam questão de que eles fossem sepultados. O pedido de José de Arimateia enquadra-se assim nos costumes judaicos”, contextualizava esta noite o bispo do Algarve, lembrando que aquela manifestação de piedade popular foi herança da “sensibilidade religiosa das gerações que nos precederam e do seu testemunho de fé em Cristo morto, sepultado e ressuscitado”.

Samuel Mendonça