O sacerdote franciscano falava no Dia do Consagrado, que decorreu em Bensafrim, com base numa análise à mensagem de D. Virgílio do Nascimento Antunes, presidente da Comissão Episcopal das Vocações e Ministérios, para a Semana do Consagrado 2012 que decorreu entre 29 de janeiro e 5 de fevereiro.

Apoiando-se no documento, intitulado “A vida consagrada no coração da evangelização – 50 anos depois do começo do Concílio Vaticano II”, o orador defendeu ser necessária uma “reflexão séria” neste setor da vida eclesial. “É importante que tenhamos consciência de que somos dom de Deus e não somos dom de nós mesmos. Não nos pertencemos a nós mesmos, somos pertença d’Aquele que nos chama e envia e isto obriga-nos a perceber que a nossa missão nos impõe uma reflexão séria”, afirmou, lamentando que muitas congregações tenham as mesmas normas há 20 anos ou mais. “Cabe-nos estar em sintonia com essa resposta que a Igreja nos pede”, complementou.

O frei José Quintã aludiu à necessidade de “testemunhar a alegria de viver” e de “favorecer a vida” em Cristo e deixou igualmente claro que os consagrados são hoje também “chamados a serem portadores da esperança”. “A vida consagrada é esta dimensão de olhar com fé e esperança a própria vida e a história”, sustentou, acrescentando que cada consagrado “deve ser expressão do amor radical de Cristo ao Pai, em favor do mundo. Se a minha vida não está enraizada em Cristo, dificilmente favorecerei ao outro que Jesus seja conhecido e amado”, alertou, lembrando que “a vida de missão e de evangelização é essencial”. “A nossa maneira de ser fala por si mesma”, lembrou, considerando que a palavra dos consagrados é “suportada por um estilo de vida aberto aos outros”.

Neste sentido, e lembrando que “a história da evangelização é indissociável da história da vida consagrada” e que a mesma constitui “uma grande força da evangelização da Igreja”, o frei José Quintã exortou os consagrados a irem “ao encontro dos irmãos”. “Os irmãos não são só aqueles que facilmente aceitam o nosso testemunho, mas aqueles que dificilmente aceitam o nosso testemunho”, esclareceu, lembrando que os consagrados são “apóstolos” e “profetas”.

O orador criticou o “muito ativismo que usurpa tempo para o essencial” na vida consagrada. “Perdemos o fundamento daquilo que é próprio da nossa identidade religiosa e vamos deitando mão àquilo que é secundário. Então, não admira que, desde a formação inicial, se note haver secularidade na vida religiosa”, criticou, apontando a prioridade na formação. “A formação inicial deve insistir no redescobrir que somos dom de Deus”, defendeu.

Aquele responsável constatou ainda que a Igreja, na Europa, “está a atravessar um fenómeno de aridez para o fator religioso e para o assumir do evangelho como compromisso batismal”, enquanto, “noutros contextos humanos e sociais”, “sobretudo nos países de missão [ad gentes]”, a vida religiosa é encarada com toda a naturalidade como “algo atual” e “não separado” da sociedade. “Às vezes vivemos mais uma vida escondida ou marginalizada”, lamentou, apelando à capacidade de não olhar os consagrados como “bichos raros”.

Face à realidade de “poucas vocações”, o sacerdote franciscano apontou mesmo a dificuldade em gerir as obras. “Muitas vezes, as instituições e os bens materiais em vez de favorecer a evangelização até estão a dificultar porque já não há forças físicas nem intelectuais para isso”, alertou, considerando que “há muito descrédito, desconfiança e pouca gente atribui um futuro risonho à vida consagrada”.

Sublinhando a ideia de que “a Igreja tem muito a esperar da vida consagrada”, aquele responsável, centrou-se nesse desafio. “A vida pastoral obriga a sermos criativos, mas as nossas energias humanas são o que são. A idade avança, a saúde vai fraquejando, o número de vocações é reduzido, a capacidade para aprender e levar por diante as tarefas já não é a mesma e a capacidade de testemunhar já fica reduzida a aspetos secundários”, lamentou.

Não obstante esta constatação, o sacerdote franciscano reconheceu haver congregações institutos “que vão surgindo com uma forte característica de vida contemplativa”. “Num mundo secularizado, os polos emergentes são quase todos de raiz e expressão contemplativa. Não é tanto o ativismo que atrai ou que está a puxar por uma nova consciência de se consagrar a Deus no serviço do próximo”, constatou.

O frei José Quintã referiu-se ainda à conclusão de que “a Igreja tem necessidade imperiosa dos consagrados para evangelizar o mundo”, reconhecendo haver, paradoxalmente em certas realidades, “desfasamento, quebra e impedimento para aquilo que é a expressão da vida religiosa”. “Esta necessidade imperiosa obriga ou favorece?”, questionou, lembrando ser preciso dar à vida consagrada “a qualidade que merece no lugar onde está presente”.

Por fim, criticou a descuidada preparação na formação de candidatos para a vida consagrada, considerando que “a preparação dos formadores, a consciência dos provinciais e a vida da comunidade em que se vive a formação inicial ou permanente, já não é o que era”. “Conhecer a vida consagrada deveria fazer parte de um programa normal de estudos dos candidatos ao sacerdócio”, acrescentou ainda.

Samuel Mendonça