O pároco das paróquias da Mexilhoeira Grande e de Nossa Senhora do Amparo, em Portimão, lamenta que a fé esteja “reduzida a religião”.
“Para a maioria dos batizados, a religião consiste na prática dos atos religiosos e não numa vida segundo o Espírito de Jesus”, critica o padre Domingos da Costa na última edição do boletim paroquial das suas comunidades, advertindo que “só o Espírito vivifica e é fonte de vida, ao contrário de uma certa religião que mata, como vem acontecendo e está à vista de toda a gente”.
O sacerdote considera mesmo que “um dos problemas do Cristianismo é a demasiada religião – prática de atos religiosos – e a diminuta/nula oração (vida espiritual)”. “Daí que muitas vezes ande a vida para um lado e os atos religiosos (sacramentalismo) para outro”, escreve o sacerdote, considerando ser esta situação que explica que “as igrejas sirvam, para muita gente, (apenas) para atos religiosos – missas, batismos, casamentos, funerais… – e não para a oração”.
Neste contexto, o prior refere não ser de admirar que as igrejas tenham passado a estar fechadas. “A principal causa foi o termos deixado de rezar… Temos, de facto, religião a mais e espiritualidade a menos! Infelizmente, já nem isso, pois até a participação na eucaristia tem vindo a morrer, como o prova a missa semanal em que não aparece praticamente ninguém”, lamenta, acrescentando já ter celebrado “várias vezes de porta aberta sem uma única pessoa”.
“Se as pessoas não entram para visitar o Senhor, corre-se o perigo do vandalismo e do roubo, o que aconselha ao seu encerramento, que é o que acontece em quase toda a parte”, lastima o sacerdote, criticando que, mesmo ao domingo, os cristãos que vão à missa entrem apenas na igreja “quase todos, à última da hora”.
Ao contrário, considera que se as pessoas, ao passarem pelas igrejas, “entrassem para uma pequena oração”, aquelas “podiam, muito bem, estar abertas, sem medo de vandalizações, como recomenda o Papa Francisco”.
Recorde-se que o Papa escreveu na sua exortação apostólica ‘Evangelii Gaudium’ (A Alegria do Evangelho) que “a Igreja é chamada a ser sempre a casa aberta do Pai”. “Um dos sinais concretos desta abertura é ter, por todo o lado, igrejas com as portas abertas. Assim, se alguém quiser seguir uma moção do Espírito e se aproximar à procura de Deus, não esbarrará com a frieza duma porta fechada”, acrescentou Francisco.
Também o bispo do Algarve, na sua mensagem para a presente Quaresma, apela a uma Igreja de portas abertas e à incrementação de “grupos de voluntários” nas comunidades paroquiais, como “opção quaresmal de serviço à comunidade, que permita abrir as igrejas habitualmente fechadas, e aumentar o tempo de abertura das outras”.
Neste sentido, o padre Domingos da Costa reforça que a Quaresma pode ser o tempo de se inverter caminho e de se voltar à oração. “Depende de nós que abramos, diariamente, as igrejas da Mexilhoeira e da Figueira. Basta que haja quem se disponha a oferecer algum tempo por semana”, constata, pedindo voluntários.
O pároco diz ainda ser dos que se indignam ao ver as ruas desertas. “Vivemos de manias, tornadas doenças: os pais com medo do rapto dos filhos, outros com medo de ser assaltados… O certo é que, quanto mais abandonarmos os lugares públicos, quer de dia, quer à noite, mais esses lugares serão ocupados por pessoas que não gostaríamos, talvez, de encontrar”, escreve, lamentando as “ruas desprovidas de passeios para peões e de pistas para bicicletas; cidades e aldeias sem jardins, nem espaços verdes que favoreçam o encontro de pessoas e sem parques em que as crianças possam brincar descansadas sob o olhar vigilante dos pais/avós”.
O prior lembra que as ruas “foram feitas para pessoas e não para veículos que vieram muito depois”.