
Cerca de 300 pessoas formaram na segunda-feira, na ilha do Farol, um SOS humano para protestar contra as demolições na Ria Formosa e demonstrar às autoridades que vão continuar a lutar para travar o processo.
Envergando camisolas negras com a inscrição “Je suis ilhéu” e ostentando cravos vermelhos, numa alusão ao 25 de Abril, centenas de pessoas desenharam um SOS no areal do Farol e entoaram o hino nacional com o mar como pano de fundo.
Em declarações à Lusa, Feliciano Júlio, presidente da Associação da Ilha do Farol e Santa Maria, disse que, neste momento, a Sociedade Polis Ria Formosa “não pode fazer qualquer ato administrativo” nos núcleos do Farol e dos Hangares, uma vez que a providência cautelar interposta pela Câmara de Olhão em defesa do camaleão ainda continua ativa.
“Ainda há aqui muitas coisas para serem resolvidas, porque os tribunais também tiveram alguma dificuldade em reagir a este processo, porque foi um processo único que aconteceu em Portugal, há muita coisa ainda para ser desvendada”, referiu, acrescentando que aguarda “com paciência” que o ministro do Ambiente dialogue com as associações.

A Sociedade Polis faz uma leitura diferente do acórdão produzido pelo Supremo Tribunal Administrativo (STA), alegando que o coletivo de juízes rejeitou os recursos apresentados e não reconheceu legitimidade aos proponentes para invocarem a defesa do meio ambiente neste processo.
Outro dos expedientes legais a que os proprietários podem recorrer para tentar travar as demolições é, segundo Feliciano Júlio, alegar “o usucapião [adquirir pelo uso] para manter as habitações” e aí o tribunal “irá dizer se a casa está no domínio privado do Estado ou no domínio público marítimo”.
No núcleo do Farol, a Sociedade Polis Litoral Ria Formosa entendeu existirem apenas duas casas de primeira habitação, contra 210 sinalizadas para demolição. Dessas 210, 178 proprietários recorreram, mantendo-se ainda ativas 46 providências cautelares.
O presidente da Câmara de Olhão, que também participou no protesto, disse à Lusa considerar “lamentável” que a Polis, criada para a defesa do ambiente, “seja a primeira entidade que não está preocupada com o ambiente, mas com questões burocráticas”.
Segundo António Pina, “qualquer cidadão europeu ou instituição pode exigir proteção para o camaleão”, uma vez que esta é uma espécie protegida por diretivas comunitárias.
O autarca reconhece a necessidade de se procederem a algumas demolições, mas numa perspetiva de requalificação, defendendo que se aplique ao Farol o mesmo princípio que há 30 anos foi aplicado à ilha da Armona, no concelho de Olhão, em que foram legalizadas casas “com a mesma génese”.
José Lezinho, da associação de moradores dos Hangares, núcleo habitacional contíguo ao Farol, frisou que os proprietários das habitações vão continuar a lutar “contra uma decisão que ainda não foi tomada”, até porque foi o Estado que decidiu povoar aquele núcleo, em 1917, para apoiar o esforço de guerra.
“Continuamos a dizer que precisamos do direito de igualdade em relação a todos. Se o Estado nos mandou para cá, continuamos cá e vamos estar até ao fim, até que se resolva”, concluiu.
Ao abrigo do plano de renaturalização das ilhas, a Sociedade Polis Ria Formosa já concretizou, no inverno passado, a demolição de algumas casas de férias e outras construções consideradas ilegais, nos ilhotes e na Praia de Faro, mas o processo acabaria por ficar suspenso devido aos mais de 200 processos cautelares apresentados na justiça para travar as demolições.
Segundo a Polis Ria Formosa, que deverá extinguir-se no final deste ano, existem decisões dos tribunais superiores já transitadas em julgado e referentes a 216 das 276 construções ilegais em terrenos do domínio público marítimo.