RefugiadoA Santa Casa da Misericórdia de Faro já recebeu 11 dos 16 refugiados que se prontificou para acolher, sendo que os primeiros quatro chegaram no dia 7 de março e os restantes no início deste mês.

Os refugiados, todos homens com menos de 30 anos, à exceção de um com 57 anos, são maioritariamente muçulmanos, mas também há cristãos.

O primeiro grupo chegou inserido num contingente de 64 refugiados, provenientes da Síria, Iraque, Eritreia e Iémen, através de um voo fretado pelo Gabinete Europeu de Apoio em matéria de asilo (ASEO) ao aeroporto de Figo Maduro, em Lisboa. O segundo chegou ao aeroporto da Portela num voo da TAP.

O provedor da Santa Casa da Misericórdia de Faro explicou ao Folha do Domingo que todos vieram de campos de refugiados da Grécia e de Itália, através da Plataforma de Apoio aos Refugiados, por via do acordo estabelecido com a União das Misericórdias Portuguesas. Candeias Neto conta que todos estão adaptados, embora com traumas. “Um deles, jovem, era futebolista e vem muito traumatizado. Chora, chora, mas está a melhorar e já começou a ir ao ginásio fazer desporto. Outro, também jovem, mataram-lhe a mulher e vivia em grutas para fugir à guerrilha. Tem um desejo enorme de trazer o irmão com 14 anos com medo que possam ir buscá-lo para a guerrilha”, testemunha, acrescentando que muitos deixaram a família nos países de origem e que todos “são indivíduos pacíficos que não roubam, nem maltratam”. O provedor acrescenta que destacou uma assistente social só para apoiar os refugiados e diz que o acompanhamento psicossocial tem sido essencial.

A Misericórdia de Faro tem ainda alguns voluntários da sua Escola Profissional D. Francisco Gomes de Avelar que se prontificaram para o ensino do português. “Só há um que fala inglês. Eles próprios não se entendiam entre si. Muitos não falam a língua do próprio país, mas dialetos”, explica aquele responsável, acrescentando que o Instituto do Emprego e Formação Profissional irá agora “começar um ciclo de formação de português”.

Para além do alojamento em quartos de duas camas, a Misericórdia fornece aos refugiados a alimentação, roupa, o acesso aos cuidados de higiene e 25 euros semanais a cada um para os seus gastos pessoais, mas Candeias Neto refere que alguns “são reivindicativos” porque, estando em comunicação com outros refugiados acolhidos noutros países, tendem a fazer comparações. “Já gastámos 12 mil euros”, contabiliza.

O provedor considera, no entanto, que a integração destes homens “não vai ser difícil” porque “eles querem trabalhar”, estando a Misericórdia de Faro interessada em contratar dois deles. O problema, entende, é a coordenação dos diversos organismos oficiais a nível nacional que diz ser “péssima”, exemplificando com o facto de a Misericórdia de Faro, passados quase dois meses, ainda não ter assinado o protocolo que deveria ter subscrito no ato da receção dos refugiados. “Ainda nem têm número de Segurança Social para poderem trabalhar”, lamenta, acrescentando que, em caso de qualquer acidente, nem seguro têm. Cadeias Neto conta que aquelas pessoas chegaram apenas com “uma declaração do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e mais nada”.

Aquele responsável adianta que, até no desembarque destas pessoas, no aeroporto da Portela “foram imensas as dificuldades” por virem num voo comercial. Candeias Neto assegura assim que o único Ministério do Estado a trabalhar bem neste processo é o da Saúde, confirmando que os refugiados fizeram todos exames médicos à chegada.

O provedor diz ainda ter sido o apelo do papa Francisco que o sensibilizou, quando em setembro de 2013 sugeriu que os conventos vazios acolhessem refugiados. “Fiquei sensibilizado. Nessa altura comuniquei logo à União das Misericórdias que a Misericórdia de Faro se disponibilizava para acolher 16 pessoas”, lembra.

A Câmara de Portimão também já recebeu três refugiados no âmbito do memorando de entendimento assinado entre a Associação Nacional de Municípios Portugueses e o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras em setembro do ano passado.

Recorde-se que logo naquele mês, a autarquia de Portimão aprovou em reunião de câmara uma moção em que manifestava a sua solidariedade para com os refugiados e se mostrava disponível para acolher alguns agregados de imigrantes no concelho.

A Câmara Municipal disponibilizou-se para receber três famílias, num total de 12 pessoas, sendo que as três que chegaram a semana passada não são sequer familiares. Trata-se de três homens muçulmanos com idades entre os 25 e os 35 anos, oriundos da Eritreia (país africano que faz fronteira com o Sudão, a Etiópia e a República do Djibuti), que estavam num campo de refugiados italiano.

Os serviços do município foram buscá-los ao aeroporto da Portela, em Lisboa, tendo alugado um apartamento, no âmbito do acordo estabelecido com Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, onde estão a residir.

A vereadora da autarquia, responsável pelo pelouro da ação social, tem uma opinião diferente da do provedor da Misericórdia de Faro. Ana Fazenda conta que “todos os membros da rede estão em ação, quer a Saúde, a Educação ou a Segurança Social”. “Já nos reunimos várias vezes no sentido de promover a ajuda e as respostas que eles precisam”, garante, acrescentando que “o apoio prestado excede até aquele que foi protocolado”. “Eles vão ser vistos pelo Centro de Saúde, vão ter médico de família e vão começar a aprender o português que é uma das barreiras principais”, conta, explicando que apenas um dos refugiados fala inglês, embora “pouco”, e que todos se comunicam num dialeto árabe. “Temos a sorte de ter um tradutor, professor do Instituto Superior Manuel Teixeira Gomes, que nos facilita muito esta nossa missão”, refere.

Folha do Domingo apurou que também as delegações de Faro e de Moncarapacho-Fuseta da Cruz Vermelha terão recebido refugiados. Contactámos os responsáveis de ambas as delegações que não quiseram responder à pergunta se os tinham ou não recebido e remeteram quaisquer declarações para os serviços centrais.

O Gabinete de Comunicação, Imagem e Relações Públicas da instituição disse não querer divulgar para já o número nem a localização dos refugiados para preservar o processo da sua integração.

Entretanto Folha do Domingo apurou que a delegação de Faro terá recebido entre três a seis mulheres. Em relação à de Moncarapacho-Fuseta, o Sul Informação adiantou que terão sido recebidos três homens, um pai com dois filhos.

O pároco de Mexilhoeira Grande, que foi a primeira voz da Igreja Católica algarvia, e uma das primeiras a nível nacional, a manifestar disponibilidade para acolher estas pessoas em julho de 2015, lamenta não ter recebido ainda qualquer pessoa. “Não sei o que é que impede que venham para Portugal. Desde outubro do ano passado que a paróquia da Mexilhoeira Grande está à espera e tem duas casas preparadas para duas famílias. Isto são crimes que bradam ao céu porque as pessoas devem ser ajudadas na altura em que precisam sem adiarmos essa ajuda”, afirmou na terça-feira no VI Encontro dos Centros Sociais Paroquiais e outras instituições sociais da Diocese do Algarve que teve lugar em Olhão.

O bispo do Algarve pediu também no mesmo mês de outubro aos responsáveis pelos organismos da Pastoral Social da diocese que encontrem “caminhos de resposta” para o “acolhimento e apoio aos refugiados” e a diocese algarvia decidiu atribuir à Cáritas Diocesana a coordenação do trabalho relacionado com o acolhimento de refugiados.