Conforme explicou, no último sábado, o pároco de Silves, o padre Carlos de Aquino, impulsionador deste estreitar de relações entre povos vizinhos, esta iniciativa procurou “não só marcar a fraternidade e unidade entre comunidades cristãs de Portugal e Espanha, como difundir, em verdadeira piedade, o culto e a devoção à Virgem Maria”.
Isto mesmo o confirmou o bispo do Algarve, na Eucaristia que concelebrou no passado sábado, em Silves, com D. José Vilaplana Blasco, bispo de Huelva. “Reunidos à volta da mesma Mãe, embora falando uma língua diferente, sentimo-nos irmanados na mesma fé e na mesma devoção a Nossa Senhora. Estou certo que a passagem da imagem de Nossa Senhora das Angústias vem reforçar aquele sentimento, já muito antigo, dos dois povos que não se sentiam divididos, apesar de terem um rio pelo meio”, afirmou D. Manuel Quintas, que ontem à tarde, na Eucaristia de despedida, em Vila Real de Santo António, considerou que o Guadiana “não dividiu, mas aproximou” “paróquias vizinhas que cresceram irmanadas”. O prelado confirmava que as Igrejas vizinhas viveram estes dias, reforçando “laços fraternos” e “estreitando corações”. “As duas Igrejas diocesanas estiveram unidas como irmãs, invocando a nossa Mãe do Céu, louvando a Deus por este dom que o seu Filho nos deixou”, afirmou.
A mesma mensagem foi deixada por D. José Vilaplana Blasco, na Eucaristia a que presidiu em Silves, considerando que, “em Espanha ou em Portugal, os cristãos são sempre membros de Cristo, chamados a ser testemunhas do Evangelho”, sentindo-se “irmãos que partilham a mesma missão”. “Tivemos a alegria de receber, em Ayamonte, a imagem da Virgem de Fátima que foi acolhida com júbilo e nos reanimou na nossa fé e na nossa vida cristã. Agora é a Virgem das Angústias que visita a Diocese do Algarve para que recordemos que a Mãe do Senhor nos faz partilhar a mesma inquietude”, acrescentou o bispo de Huelva, lembrando que, num fim de semana em que a Igreja celebrou a solenidade da Ascensão de Jesus ao Céu, algarvios e andaluzes viveram este tempo reunidos com Maria, como no Cenáculo.
A crise europeia que castiga particularmente portugueses e espanhóis foi outra das tónicas sublinhadas, quer pelos bispos, quer pelos políticos. O bispo de Huelva exortou à contemplação de Nossa Senhora como “modelo de fé”e à imagem da Virgem das Angústias como “modelo de esperança” e de “caridade”. “Aprendamos da Virgem Maria a lição da fé e a aceitar a vontade de Deus quando o sofrimento, a cruz e a provação se fazem presentes na nossa vida. Maria é sinal de esperança e nós, hoje, precisamos muito de esperança neste momento de crise e de dificuldade”, referiu, lembrando que “Maria abraça o seu Filho e n’Ele abraça-nos a todos e a todos os pobres do mundo” e que “a Igreja é chamada a ser sinal de caridade”.
Por seu lado, o bispo do Algarve lembrou que os problemas dos dois povos são os mesmos, referindo a “chaga social” do desemprego que atinge ambas as regiões. “Queremos apresentar a Nossa Senhora das Angústias todos aqueles que sofrem esta chaga social do desemprego, aqui no Algarve e também em Ayamonte”, disse.
Logo na sexta-feira (18 de maio), na cerimónia de receção, o discurso dos presidentes das Câmaras de Silves e Vila Real de Santo António, respetivamente Isabel Soares e Luís Gomes, ficou marcado pelo pedido de proteção de Nossa Senhora para os dois países num período particularmente difícil das suas histórias.
A imagem chegou de barco, ao final da tarde daquele dia, ao cais fluvial de Vila Real de Santo António, acompanhada pelo pároco de Ayamonte, o padre Carlos Javier López, por um numeroso grupo da Irmandade de Nossa Senhora das Angústias, pelo alcaide daquela localidade, Antonio Rodríguez Castillo, e por muitos outros espanhóis. Depois da procissão até à igreja paroquial, o andor, que pesa cerca de 300 quilos, esteve presente à noite numa eucaristia presidida pelo pároco local, pe. Feliz Vieira Pires.
No sábado, entre as 10 e as 14h, foi a paróquia de Castro Marim a acolher a imagem que participou também numa Eucaristia, presidida pelo pároco, pe. Manuel Chícharo. O andor, todo em prata trabalhada e carregado por 12 homens, seguiu depois para Silves, para a Eucaristia com os bispos de Huelva e Algarve, precedida por momentos dinamizados por vários grupos paroquiais. À noite, realizou-se ainda a procissão com D. José Vilaplana Blasco e D. Manuel Quintas, apesar da chuva que caiu.
Ontem, a imagem regressou a Vila Real de Santo António, participando nas Eucaristias da manhã e da tarde, esta presidida pelo bispo do Algarve que confiou a diocese algarvia à proteção da Virgem das Angústias. Preparada para a Praça do Marquês, a celebração acabaria por se realizar na igreja, devido à ameaça da chuva. Após a Eucaristia, seguiu-se a procissão de volta ao cais, regressando a imagem de barco a Ayamonte, perante os acenos e palmas da multidão.
A Virgem das Angústias foi proclamada padroeira de Ayamonte a 11 de Janeiro de 1756, depois do terramoto de 1755. A sua imagem é uma obra barroca de imaginária que sofreu numerosas modificações ao longo dos anos, embora deixe entrever o que era a imagem original. A escultura do século XVI, que chegou a ser restaurada em Lisboa e preside ao altar-mor da igreja de Nossa Senhora das Angústias da paróquia de Ayamonte, retrata a Mãe de Jesus com o seu Filho no regaço e tem mais de um metro de altura. Conta-se que a imagem da Virgem foi encontrada por dois pescadores ayamontinos junto da margem portuguesa do rio Guadiana, dentro de uma caixa de grande peso e volume, quando recolheram as redes. As festas em sua honra têm lugar na primeira semana de setembro.