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As XIV Jornadas de Ação Sociocaritativa da Igreja algarvia abriram no passado sábado com a chamada de atenção do bispo do Algarve, citando o Papa Francisco, de que “também o serviço da caridade é uma dimensão constitutiva da missão da Igreja e expressão irrenunciável da sua própria essência”.

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D. Manuel Quintas considerou naquela iniciativa que se realizou no Centro Pastoral e Social de Ferragudo com 100 colaboradores daquela sector da Igreja, oriundos de todo o Algarve, que a diocese algarvia precisa “crescer mais nesta dimensão”. “Facilmente acreditamos (e até nos envolvemos) de que ser Igreja é anunciar e testemunhar a fé (a dimensão profética), é a dimensão sacerdotal (participar no culto e contribuir com tudo o que é a liturgia da Igreja), mas acolher e assumir, com a mesma intensidade, que a dimensão social faz parte daquilo que é a essência da Igreja e é um elemento identificador da própria Igreja. Talvez precisemos de crescer um bocadinho neste aspeto”, considerou o prelado, lembrando que sem esta dimensão “falta um pé do tripé”. “Com a mesma intensidade com que somos chamados a anunciar, a testemunhar e a celebrar a fé, somos chamamos também a esta dimensão social que é parte estruturante e identificadora daquilo que é a Igreja”, reforçou na iniciativa sobre o tema “A caridade dá que fazer”, promovida pela Diocese do Algarve através da Cáritas Diocesana.

O presidente da Cáritas Diocesana do Algarve, Carlos Oliveira, considerou, por sua vez, que a “consciência da importância” que os grupos de ação sociocaritativa têm na diocese está a ser criada, “muito por força da exortação do Papa que tem dado um grande impulso e também das posições que o bispo diocesano tem tomado”.

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O teólogo Juan Ambrosio, que voltou a ser o protagonista do encontro depois de já em 2009 ter participado nele, também evidenciou que Francisco coloca “a dimensão social no âmbito do ser, da essência, daquilo que a Igreja é”.

O orador, que procurou uma “chave de leitura” para a exortação apostólica do Papa ‘Evangelii Gaudium’ (A Alegria do Evangelho) que iluminou o encontro, acrescentou que Francisco evidencia que “a caridade é uma dimensão constitutiva da identidade da Igreja e não simplesmente uma dimensão de ação por causa de uma necessidade”, sublinhando que “o Papa não reflete a dimensão social da evangelização a partir da crise”. “Na medida em que vivermos e dinamizarmos a caridade, seremos cristãos”, advertiu, considerando que o imperativo “não é do âmbito do fazer”, mas “do ser” e que “sem a opção preferencial pelos pobres, o anúncio do evangelho é verborreia”.

“As nossas comunidades não podem mais ser comunidades de conforto e segurança. Estamos muito habituados a falar no perigo do cristianismo light (faz de conta). Para mim há um cristianismo muito mais perigoso que é o cristianismo burguês (para usufruto próprio)”, advertiu, lembrando que “o Cristianismo não é para usufruto”, mas para “compromisso” no “meio do mundo”. “[Ser cristão] não é, em primeira mão, para mim. É para mim, na medida em que for para o outro e só na justa medida em que for para o outro, é também para mim”, acrescentou.

Neste sentido, o teólogo frisou que “o Cristianismo não assenta exclusivamente numa relação pessoal com Deus”. “Essa relação eu-ele é credibilizada, sustentada e concretizada na relação eu-outro, a tal ponto que se a esta não existe, a outra, ainda que eu diga que existe, é mentira”, sustentou, lembrando que “os pobres são os destinatários privilegiados [da Igreja] porque neles é a condição humana que está a ser afetada” e que “a inclusão social dos pobres deriva e é constitutiva da própria fé”. “Não se pode dizer que se tem fé e depois não provocar esta inclusão”, advertiu, considerando que “a exigência da caridade é também o critério para a reta ou não reta doutrina”. “A doutrina não é um momento primeiro. É um momento segundo, não secundário. O momento primeiro é a dignidade humana”, completou.

A este nível, Juan Ambrosio alertou que esta preocupação com os pobres tem que ser verdadeira e criticou que se faça dos pobres “degraus da escada” que se sobe para chegar ao céu. “Este é o primeiro caminho para desumanizar os «pobrezinhos» e o primeiro caminho que eu faço para começar a descer a «escada» que me levará a outro sítio, mas ao céu não é de certeza. Aquilo que faço ao pobre, não é porque esse gesto é um bem para mim. Faço por ser um bem para ele. Isto implica apreciar o pobre na sua dignidade própria”, advertiu, lamentando gestos de caridade não centrada no outro, mas centrada no agente da caridade e «ajuda» que, “em vez de dignificar e promover, amarfanha o outro e fá-lo ainda mais pobre”.

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O orador alertou ainda que “há um limiar que é absolutamente proibido de passar porque esse é o limiar que nem o próprio Deus ousa ultrapassar: a liberdade de cada ser humano”.

Chamando a atenção para a “categoria teológica dos pobres” que o Papa destaca, sublinhou que a “relação com os pobres é o lugar onde acontece o mistério de Deus”. “Temos um mistério de Deus demasiado aprisionado nos sacrários, nas igrejas e locais sagrados”, lamentou, evidenciando que os pobres são também eles evangelizadores.

Conferência de Juan Ambrosio (1ª parte):

Conferência de Juan Ambrosio (2ª parte):

Conferência de Juan Ambrosio (3ª parte):

Conferência de Juan Ambrosio (resposta a perguntas):