O monsenhor cónego José Pedro Martins, falecido hoje, viveu uma vida dedicada à Igreja e, de modo particular, à Igreja algarvia.
Natural da freguesia de São Sebastião de Lagos, onde nasceu a 26 de outubro de 1942, José Pedro de Jesus Martins cresceu no seio de uma família católica e foi batizado na paróquia de Santa Maria pelo pároco de então, padre Francisco António Carmo. Aquela paróquia viu-o também ser crismado pelo bispo do Algarve da altura, D. Francisco Rendeiro, e ordenado diácono. Mas foi na paróquia de São Sebastião que frequentou a catequese e fez a primeira comunhão.
Para além de ter sido catequista, pertenceu a um grupo da Juventude Operária Católica (JOC), naquele tempo com forte implantação no Algarve, que marcou a sua juventude e do qual chegou a ser dirigente.
Estudante na Escola Industrial e Comercial de Lagos, foi também convidado a pertencer ao Corpo Nacional de Escutas e esteve igualmente ligado a uma publicação intitulada ‘Fermento’. Foi nessa altura, já com 18 anos, que equacionou a possibilidade de vir a fazer uma experiência no Seminário. Influenciado pelo que se fazia no contexto da Ação Católica, ao participar em Ferragudo num campo de férias com os seminaristas, falou com D. Francisco Rendeiro.
Conheceu em Lagos os padres José Rosa Simão e Júlio Tropa Mendes.
Em 1961 seguiu diretamente para o Seminário de Almada, juntamente com o falecido cónego algarvio Firmino Ferro, depois de uma viagem de comboio desde o Algarve. Depois de dois anos naquele Seminário, continuou estudos no dos Olivais, onde esteve mais cinco anos.
Tendo concluído, em 1970 com 28 anos, o Curso de Teologia no Instituto Superior de Estudos Teológicos de Lisboa, foi ordenado diácono no dia 29 de maio, em Lagos, e sacerdote no dia 29 do mês seguinte na Sé de Faro, pelo bispo do Algarve de então, D. Júlio Tavares Rebimbas.
Foi depois nomeado prefeito e professor de música, história e português do Seminário de Faro e só celebrou a ‘Missa Nova’ na sua terra natal a 19 de julho. Na mesma semana, o bispo do Algarve pediu-lhe para ir substituir o pároco de Aljezur, Bordeira e Odeceixe até setembro daquele ano.
Foi também nomeado membro do Secretariado Diocesano da Liturgia, Música e Arte Sacra, assistente diocesano da Liga Agrária Católica Feminina (LACF) e do Secretariado da Obra das Vocações. Organizou também uma escola de música na Casa de Retiros em São Lourenço do Palmeiral. Ainda como prefeito do Seminário, o padre Júlio Tropa, que tinha acabado de assumir em 1969 a paróquia de Santa Bárbara de Nexe, chamou-o a colaborar. Também o padre Manuel Bárbara, pároco da vizinha paróquia de Estoi, fez o mesmo.
Em 1978 concluiu a habilitação própria para lecionar Português e, mais tarde, realizou a profissionalização e o estágio em Olhão para ser professor. Lecionou Português e também Educação Moral e Religiosa Católica, não apenas na Secundária de Olhão, mas também no então Liceu e na Escola Tomás Cabreira, em Faro. Fez ainda parte da comissão diretiva da revista do GEA – Grupo de Estudos Algarvios, com início em abril de 1978.
Frequentou, entretanto, a Faculdade de Letras de Lisboa, onde se licenciou em História, em 1980. Fundou e dirigiu, como primeiro diretor artístico, o Coro do Conservatório Regional do Algarve, onde também lecionou a disciplina de História da Música.
Em 1980 viu o desejo de ser pároco concretizar-se num período em que o Seminário não estava a funcionar por estar em obras. Foi nomeado pároco de Pechão e Quelfes, serviço que manteve até 1983, tendo sido também vigário da vigararia de Faro, e, desde então até ao presente, membro do Conselho Presbiteral. Foi nessa altura que acumulou com a lecionação em Olhão.
Foi também o fundador e primeiro diretor do Coral Ossónoba, em 1980, função que suspendeu em 1983 por ter sido nomeado pároco de Vila Real de Santo António por D. Ernesto Gonçalves Costa, então bispo do Algarve, após a morte do prior daquela paróquia que na altura incluía também a de Monte Gordo, posteriormente desmembrada. A nomeação do bispo diocesano incluía a indicação de ser animador e coordenador da pastoral na área da vigararia com o encargo de formar uma equipa sacerdotal que, progressivamente, viesse a dar uma assistência religiosa mais efetiva às paróquias de Vila Real de Santo António, Castro Marim e Alcoutim.
Nessa altura, aconteceu simultaneamente o seu regresso ao Seminário de Faro, porque era preciso reabrir a instituição após as obras realizadas e D. Ernesto Costa nomeou-o vice-reitor.
Foi moderador da equipa sacerdotal que chegou a constituir-se em 1986, acumulando as paróquias do concelho de Alcoutim e vigário da vara de Tavira de 1987 a 1989. A Câmara de Faro atribui-lhe a medalha da cidade em 1988.
Chegado em 1988 ao Algarve, D. Manuel Madureira Dias manteve-o num primeiro momento como vice-reitor do Seminário diocesano, mas queria o sacerdote em Faro. O novo bispo diocesano nomeou-o em 1989, não só reitor, mas também vigário-geral da diocese com jurisdição sobre a pastoral, considerando a necessidade de imprimir à ação pastoral um ritmo mais eficaz e concertado. D. Manuel Madureira Dias tinha em mente um plano para aplicação da reforma litúrgica no Algarve, com a consequente reestruturação da pastoral da diocese, e o sacerdote fazia parte desse intuito. Aquela que é a organização atual da diocese resulta desse trabalho.
D. Manuel Madureira Dias pediu-lhe então para frequentar o Curso de Atualização Teológico-Pastoral no Instituto Superior de Pastoral da Universidade Pontifícia de Salamanca que terminou em 1994. Muito trabalho na execução de diversos planos pastorais, bem como a edição de imensos subsídios para a pastoral, resultou dessa estratégia. “A Igreja do Algarve – uma comunidade fraterna a crescer”, em 1995 e “Diocese do Algarve – Orientações Pastorais e Documentos – I”, em 1996, edições dos Serviços Diocesanos de Pastoral do Algarve são algumas dessas publicações.
É também autor de “Liturgia da Celebração da Penitência”, Edições Paulinas, 1974; “Formar para Servir”, obra pioneira destinada à formação de acólitos e publicada em 1987; “A Páscoa do Povo de Deus – apoio à preparação das celebrações pascais”, em 2000; e, ainda nesse mesmo ano “Iniciação das crianças baptizadas em idade de catequese” nºs I e II.
Em 1993 moderou o grupo de língua portuguesa no 45º Congresso Eucarístico Internacional em Sevilha. Como vigário-geral foi também administrador da Tipografia União e da Folha do Domingo.
O interesse pela música na vida do monsenhor cónego José Pedro Martins aconteceu ainda em Lagos, onde chegou a pertencer a um coral da JOC, e prosseguiu nos Seminários com o ensino musical. Com o padre António Cartageno fazia músicas no Seminário dos Olivais e aos fins de semana visitavam paróquias onde sentiam que as pessoas não cantavam ou cantavam algumas coisas que já vinham muito de trás. A sua primeira publicação intitulou-se ‘O povo de Deus reunido’, uma coletânea de cânticos de ambos e de outros cânticos.
Desde então, um e outro, consagraram-se como dois dos maiores nomes da música litúrgica nacional. O monsenhor cónego José Pedro Martins tem vários álbuns editados e o seu nome consta mesmo da Enciclopédia da Música em Portugal no Século XX, do Círculo de Leitores, realçando que alguns dos seus cânticos foram traduzidos e inseridos em coletâneas oficiosas, como o Cantoral Liturgico Nacional de Espanha. É autor de um grande espólio de música litúrgica com algumas publicações e gravações editadas em Portugal, Espanha, Brasil e Itália. Mas grande parte das suas composições estão divulgadas em folhas avulsas.
Em 1980 foi jurado do Festival RTP da Canção, em representação do Algarve.
Em 1999, um CD intitulado “Os melhores coros da Região – Algarve”, inseriu algumas composições suas e, em 2000 um outro CD com interpretações do Grupo Coral de Lagos, intitulado “Terra Morena”, abre, precisamente, com esta composição de sua autoria. Mais recentemente também o músico Rão Kyao elaborou trabalhos discográficos em que incluiu temas da sua autoria.
Em 1996, D. Manuel Madureira Dias nomeou-o cónego para o Cabido da Sé de Faro de que foi chantre e, desde 2009, é deão.
Em 2003 voltou a ser pároco. D. Manuel Madureira Dias nomeou-o pároco da matriz de Portimão, serviço que manteve até 2009, e vigário episcopal para a Pastoral. Em 2009 voltou a Faro para paroquiar a paróquia da catedral, continuando como Vigário Episcopal e sendo novamente nomeado reitor do Seminário de São José. Em 2017 foi dispensado destes cargos, e nomeado diretor do Arquivo Histórico da Diocese, continuando o exercício das funções de deão do Cabido da Catedral e assumindo a paroquialidade de duas paróquias periféricas da cidade de Faro: Santa Bárbara de Nexe e Estoi.

O sacerdote falecido foi ainda diretor do Secretariado da Catequese da Diocese do Algarve entre 2000 e 2011. No dia 03 de abril deste ano foi homenageado na Eucaristia do Encontro Nacional de Catequese que decorreu no Algarve, juntamente com o padre Henrique Varela, que também desempenhou aquele serviço entre 1969 e 1989.
O atual diretor do Secretariado Diocesano da Catequese lembrou que, “na renovação dos catecismos em Portugal no início do milénio, o monsenhor José Pedro dotou o Secretariado e a diocese de um impulso evangelizador que encontrava um novo dinamismo na redescoberta e sentido do valor do Batismo”. “A caminhada catecumenal da infância e adolescência, por ele aclarada na sequela do amplo caminho iniciado com os adultos no final da década de 80 do século passado aqui no Algarve, fez com que a generalidade das paróquias se dotasse de itinerários de pré-catecumenado e catecumenado que ainda hoje norteiam e balizam as caminhadas das nossas comunidades. Muito obrigado, padre José Pedro”, prosseguiu.
Em 2017, o sacerdote falecido foi também o responsável pela criação da Escola de Órgão da Catedral de Faro. Naquele ano foi homenageado pela Diocese do Algarve pelos quase 30 anos de serviço como vigário episcopal para a pastoral.
No dia 05 de outubro de 2020, o monsenhor cónego José Pedro Martins assinalou os seus 50 anos de ministério sacerdotal com a celebração da Eucaristia na igreja de São Pedro do Mar, em Quarteira.
Foi nomeado pelo Papa Francisco a 28 de agosto de 2023 “Capelão de Sua Santidade” com o título de “monsenhor”. No dia 27 de outubro de 2023, o sacerdote foi homenageado pelas paróquias de Santa Bárbara de Nexe e de Estoi e pela Câmara de Faro.
Tem muitas publicações dispersas em jornais e revistas sobre variadíssimos assuntos, mormente de temática histórica, musical, litúrgica, pastoral e vocacional e colaborou ainda no I volume da coletânea “Algarve – Tradições musicais”, iniciada em 1995.
A Diocese do Algarve e a Paulinas Editora apresentaram, no dia 14 de junho deste ano, o livro de criações musicais do monsenhor cónego José Pedro Martins que fazem parte da história da música sacra em Portugal no período pós-conciliar.