O vigário episcopal para a pastoral da Diocese do Algarve apresentou na assembleia diocesana do passado sábado os desafios à Igreja algarvia que resultam do documento final do Sínodo dos Bispos sobre a sinodalidade, decorrido entre 2021 e 2024 e cuja fase de implementação decorre agora entre 2025 e 2028. Aquele sínodo é um dos acontecimentos eclesiais que o triénio pastoral 2024/2027, que a Igreja algarvia está a levar a cabo, tem em conta.

Foto © Samuel Camacho

O padre António de Freitas começou constatar que o documento sinodal “permanece desconhecido”, apesar de “todos” terem tido “oportunidade de participar na construção deste sínodo”. “Este documento é nosso, é da Igreja. Nós participamos de um modo, como nunca antes o povo de Deus teve a oportunidade de participar num sínodo”, evidenciou, referindo-se à fase de auscultação das paróquias.

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Classificando o documento como “moderado”, o sacerdote justificou que “reflete o sentir da Igreja, mas também aquilo que é a raiz do viver cristão, a Palavra de Deus, a tradição e o magistério da Igreja”. “Apela a que possamos partir de uma vivência da fé, da renovação e aprofundamento da nossa identidade batismal e é um documento que parte deste enraizamento na tradição da Igreja. Ajuda a que as nossas comunidades possam refletir sobre si mesmas, de como estão a ser Igreja e, à luz daquilo que são as intuições do sínodo, que Igreja queremos ser”, sustentou.

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O vigário episcopal para a pastoral indicou haver uma palavra transversal ao documento e outra que, embora sendo expectável, “não aparece”, explicando que a primeira é “conversão” e a segunda é “estrutura”.

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Sobre a primeira disse que “não se trata de mudança”, nem de “revolução”, nem de “uma simples transformação”. “É mudança à luz e sob a guia do Espírito. O sínodo, o que nos pede é que vivamos em permanente estado de conversão pessoal e pastoral porque sem isto não há caminho que se possa fazer”, clarificou, acrescentando que o documento não tem qualquer referência a “conversão de estruturas”. “Não aparece mudança de estruturas porque a estrutura, habitualmente, é uma coisa rígida. Ao contrário do processo que é uma coisa dinâmica. Aquilo que o documento nos pede é que nunca caiamos nessa ilusão [da conversão de estruturas], mas que constantemente sintamos esta Igreja dinâmica e em permanente estado de conversão”, prosseguiu.

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O sacerdote referiu também que “unidade” e “comunhão” “são duas palavras-chave que vão percorrendo o documento como o sinal fundamental de um testemunho credível ao mundo”. “Esta unidade e comunhão é fundamental para que possamos crescer também, depois, na dimensão relacional, conversão das relações”, afirmou, explicando que o passo seguinte para a sinodalidade vá sendo uma realidade na Igreja é a “conversão das relações”. “São as relações que sustentam a vitalidade da Igreja”, advertiu, acrescentando: “Sem a dimensão relacional e se nos prendermos demasiado à dimensão laboral, tarefeira, não há vitalidade. Vamos fazendo coisas, mas a vitalidade é muito mais profunda que isso”. “Esta é uma questão fundamental para que a nossa Igreja seja uma Igreja viva”, considerou, lembrando que “a fé também vive do afeto” e que “a fé efetiva tem que ser afetiva”.

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Aquele responsável acrescentou que a terceira parte aborda a “conversão dos processos”. “É a conversão dos processos que nos pode levar à capacidade de sermos bons discípulos missionários de Jesus”, completou, lembrando que “sem o encontro com Jesus vivo, não há caminho que se possa fazer”. “Temos que ter pessoas que se encontram constantemente com este Jesus vivo, mas temos que gerar nas nossas comunidades estes encontros com o ressuscitado”, desenvolveu.

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O padre António de Freitas constatou que a “conversão dos processos” inclui três dimensões “sempre muito interligadas”: “discernimento, transparência e prestação de contas”. “Estas três coisas são fundamentais para a renovação da nossa Igreja e para a nossa fidelidade de sermos testemunhas de Jesus no meio do mundo”, alertou, defendendo que “o processo de discernimento feito pela comunidade é uma ajuda ao processo de decisão que compete ao pastor”. “Mas, às vezes, os processos de discernimento não existem; outras, já vão inquinados: mandam-se umas coisas previamente para levar a determinada decisão. É importante que o processo de discernimento seja, de facto, um processo de discernimento; que seja uma abertura para auscultar a comunidade não naquilo que simplesmente queremos que a comunidade diga, mas daquilo que a comunidade tem a dizer”, alertou.

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Aquele responsável ressalvou que a Igreja “não se transforma a partir de agora numa democracia em que os seus membros votam e a maioria ganha” porque o que a dimensão sinodal promove é um “discernimento à luz do Espírito de Deus”. “Trata-se de trabalharmos a nossa capacidade de auscultarmos o que o Espírito de Deus nos tem a dizer. É isso que é um processo de discernimento para ajudar a uma decisão”, reforçou.

O padre António de Freitas alertou ainda que “a prestação de contas tem duas dimensões: a financeira, mas também a pastoral”. “O prestar contas significa que cada pessoa no seu ministério, carisma ou serviço seja capaz de dizer à comunidade o que fez ou não fez. O que fez e porque fez, o que não fez e porque é que não conseguiu fazer. No fundo, é a questão da avaliação. Quando se fala da prestação de contas pastoral é a avaliação, a capacidade de nos avaliarmos e deixarmos avaliar”, clarificou, acrescentando que o documento também alude à dimensão financeira da prestação de contas e exortando a “encontrar formas de prestar contas pastorais e contas financeiras”. “Esta transparência torna-nos evangélicos e tornamo-se um testemunho no meio de um mundo onde percebemos que, às vezes, prestar contas vale zero”, rematou.

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O sacerdote abordou ainda a “conversão dos vínculos”, ou seja, a vinculação e coordenação da diversidade dos “dons, serviços, carismas e ministérios” numa comunidade, lembrando que a Igreja deve ser “também um lugar da diversidade das histórias, das vidas”, “onde cada um se sinta acolhido e amado”. “Quer a conversão das relações, quer a conversão dos processos, quer a conversão dos vínculos existem em função de uma coisa: a unidade. É na unidade que reconhecerão a autenticidade do nosso testemunho”, realçou.

O vigário episcopal para a pastoral pediu, por fim, que o documento seja agora trabalhado nas paróquias. “Neste segundo ano do triénio era para apostarmos no acolhimento e aplicação do documento”, lembrou, pedindo: “perguntemos o que é que o documento final nos pede, comunidade cristã, que façamos a nível da conversão das relações, dos processos e dos vínculos”.

com Samuel Camacho