
Em cada celebração eucarística, Jesus oferece-se sempre em favor dos homens, como verdadeiro alimento, em duas «mesas distintas», mas complementares: a «mesa da Palavra» e a «mesa do pão eucarístico». Cristo é o «alimento», quer numa, quer noutra destas duas mesas. Palavra de Deus, desde toda a eternidade, fez-se homem e habitou entre nós. Um dia, reunido com os seus discípulos, converteu-se em pão e fez que esse pão fosse verdadeiramente o seu corpo, pelo qual alimenta os que têm «fome» de vida divina. Escutar a palavra de Deus, numa assembleia reunida para celebrar a Eucaristia é o modo mais fecundo de o fazer, pois aí, escutamos os apelos de Deus a fim de nos identificarmos com eles. Desse modo, Deus vem a nós, converte-nos a Ele para que permaneçamos no seu amor. Assim, a Palavra escutada na Igreja (em comunidade) provoca e realiza em nós uma verdadeira comunhão de vida com Deus, expressa, de modo muito significativo na tomada do alimento sob a forma de pão.
2 – O pão eucarístico é o «corpo» de Cristo. Quem dele comer, permanece em Cristo e Cristo permanece nele. Tal como acontece na vida biológica com os nossos alimentos que, uma vez digeridos, se transformam no nosso ser, assim Cristo, tomado em alimento se torna um só connosco para nos fazer um só com Ele. E isto é que é uma verdadeira comunhão. Mas não podemos realizar em pleno uma tal comunhão se, antes de nos sentarmos à mesa do pão, não nos tivermos sentado à mesa da Palavra. Antes de celebrar, de modo sacramental, a Eucaristia, temos de celebrar uma comunhão com Deus e com os irmãos, através da palavra, respondendo, positivamente, aos apelos nela escutados. A mesa da comunhão é, de algum modo, um «selo» que, em forma de comida, se coloca sobre a aliança renovada na escuta da Palavra. Se tal aliança não aconteceu, na nossa resposta à Palavra, perde-se o significado desse «selo» eucarístico. Se não construirmos a comunhão através da palavra, que significado poderá ter a comunhão no corpo do Senhor?
A verdadeira comunhão faz-se no amor e na fidelidade de uma vontade humana identificada com a vontade de Deus. Com razão escreveu S. Jerónimo: «Nutrimo-nos da carne de Cristo e bebemos do seu sangue não só na Eucaristia, mas também na leitura da Sagrada Escritura».
*bispo emérito do Algarve