Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

As XVII Jornadas de Ação Sociocaritativa da Diocese do Algarve – que este ano constituíram simultaneamente o VIII Encontro dos Centros Sociais Paroquiais e das Santas Casas da Misericórdia promovido pela diocese algarvia – decorreram no passado sábado e procuraram refletir sobre a carta apostólica sob a forma de ‘motu proprio’ Intima Ecclesiae Natura [A natureza íntima da Igreja] de Bento XVI, de novembro de 2012, que apresenta orientações sobre o serviço da caridade.

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No encontro, que teve lugar em Ferragudo no Centro Pastoral e Social da Diocese do Algarve com 65 participantes de todo o Algarve, o presidente da Cáritas Portuguesa, a quem coube a apresentação do documento, começou por lembrar que o ‘motu proprio’ “é uma determinação para cumprir” porque “tem valor legal, considerando-o como um “encarte do Direito Canónico”.

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Eugénio da Fonseca considerou que Bento XVI pretendeu com o documento “evitar aquilo que está a acontecer”. “As instituições da caridade da Igreja estão a confinar-se a dois ou três aspetos da sua missão que é recolher e distribuir fundos e outro tipo de bens”, concretizou.

Considerando que o então papa pretendeu que os grupos da pastoral sóciocaritativa, “para além da ajuda aos mais fragilizados, ajudem a criar consciência comunitária”, realçou que “a Igreja é chamada à prática da caridade também a nível comunitário”. “Na altura em que a pessoa que é ajudada perceber que a ajuda foi da comunidade cristã, a nossa missão está no bom caminho”, afirmou, acrescentando que o papa sublinha “a importância destes grupos terem uma expressão muito dinâmica e visível na comunidade cristã”.

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O orador considerou, por isso, que a pastoral sóciocaritativa, “porque tem de ser vivida em comunidade, precisa de organização de forma articulada”. “Temos «alergia» a esta organização porque temos medo – e bem – que se caia num excesso de normas organizativas que levam à burocracia”, complementou, considerando, contudo, a organização “essencial” para “tornar mais profícuo” o trabalho realizado e “para se alcançar os objetivos” pretendidos.

Por outro lado, Eugénio da Fonseca realçou que Bento XVI pede no documento que “não transformem estes grupos organizados da caridade numa organização assistencial comum a todas as demais”, mas que a “partilha de bens e da dádiva não perca a identidade cristã”.

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Neste sentido advertiu que “nem tudo se pode receber, nem tudo se deve dar”. “Tenho de usar sempre aquela máxima evangélica «não faças aos outros aquilo que não queres que te façam a ti»”, aconselhou, acrescentando ainda: “se eu receber algo que provem de estruturas de pecado estou a ir contra princípios fundantes da minha própria identidade”.

“Procurem refrescar-vos sempre daquilo que o evangelho impulsiona. Nós até temos uma vantagem relativamente aos outros grupos: nós sabemos que há quem nos conduza, sabemos que há um Espírito que nos anima. Não tenham medo, sejam criativos, arrisquem”, pediu, lembrando que “os centros sociais paroquiais não são grupos para gerir a pobreza dos pobres”. “São grupos que a Igreja assume para cumprir a sua missão libertadora, ressuscitadora, de Páscoa contínua”, sustentou, acrescentando ainda que também é pedida “a atenção para que as instituições da Igreja não descurem aquilo que são as obrigações civis”.

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Eugénio da Fonseca observou que o documento “pede aos bispos diocesanos duas coisas: autoridade e coordenação”. O dirigente lembrou por isso que “a Cáritas é um serviço oficial da Igreja” que “depende diretamente e só da autoridade eclesiástica”, tendo “caráter fundacional” pois “funda-se na autoridade do bispo”. O presidente da Caritas Portuguesa disse que a “dificuldade de aplicação” para os bispos do documento nas dioceses portuguesas deve-se à “complexidade muito grande de organizações”. “Não é fácil. Não é porque os bispos não queiram. É pela postura que muitas vezes temos de entrarmos em competição, de nos pormos mais a olhar para o nosso umbigo do que para o bem que somos chamados a fazer”, considerou.

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Por isso, o orador disse não saber quando é que o decreto passará “a ser também lei na organização da pastoral social” em Portugal. “Se não for com este espírito fica em causa a nossa credibilidade”, alertou, lamentando que este sector da ação pastoral da Igreja seja “um parente pobre” da mesma. “Não vale a pena preocupar-nos com este ‘motu proprio’ se não houver em primeiro lugar esta vontade determinada de darmos à ação social e caritativa o lugar que lhe compete na missão evangelizadora da Igreja”, advertiu.

Já em 2013, nas XII Jornadas de Ação Sóciocaritativa, a Diocese do Algarve tinha refletido sobre o documento.