
Hoje os nossos corações estão mais leves. Doze crianças e o seu treinador de futebol foram resgatadas com vida de uma gruta na Tailândia, onde viveram durante 15 dias no meio de muita água, lama e falta de oxigénio, ausência de luz, de comida e de água potável.
Na verdade, durante todos estes dias, a figura que mais me intrigou foi a do treinador que acompanhava os jovens nesta sua aventura, cuja razão de ser ainda não se conhece totalmente. Este rapaz de 25 anos, um antigo monge budista, que tomou a sua veste aos 10 anos e só a deixou há três anos atrás para poder cuidar da sua avó (a familiar mais próxima e direta que tem, pois os pais e um irmão morreram pouco antes de ele entrar no mosteiro), de seu nome Ekkapol Chantawong, mas tratado habitualmente por Ake, permaneceu sempre ao lado dos rapazes, zelando por eles o melhor que pode, face às adversidades que enfrentavam.
Contam os mergulhadores que entraram na gruta e durante os dias de preparação do resgate conviveram com as crianças e com este jovem, que ele estava calmo e que colocou sempre os miúdos em primeiro lugar, abdicando da pouca comida que tiveram, da água que foram recolhendo das estalactites do teto da gruta e fazendo, com eles, uma hora diária de meditação, como seria sua rotina, já que apesar de ter deixado de ser monge, nunca deixou esse hábito. Terá mesmo sido esse esforço, segundo alguns psicólogos, que ajudou o grupo a manter a calma e a tranquilidade e a enfrentar este regresso à superfície, tão cheio de obstáculos, com ânimo e com força.
Pediu desculpa aos pais, que por sua vez também lhe manifestaram a sua solidariedade e compreensão.
Não sabemos muito sobre Ake, mas sabemos tanto… A sua juventude terá, certamente, contribuído para a realização da temerária entrada na gruta, mas a sua maturidade e generosidade engrandeceram-no, quando posto à prova. Será dele, por certo, que se lembrarão estas crianças, da sua capacidade de os tranquilizar e de os encher de ânimo. Ele é, nesta história, um dos que nos permite ver a esperança, nem que seja no fundo de uma gruta escura e inacessível, inundada e com rochas escarpadas, uma gruta que é mais do que um símbolo do inferno, porque é um inferno real, onde doze crianças e um adulto viveram duas semanas encurralados e um homem que trabalhava para os salvar perdeu a vida.
Nenhum desistiu: nem Ake, nem as crianças nem os seus salvadores e, por isso, hoje rejubilamos com a maravilhosa capacidade humana, que permitiu o salvamento destas pessoas. Maravilhosa capacidade técnica e de saber, que nos permite compreender o quanto o homem pode fazer com o seu cérebro e a sua criatividade, mas também a capacidade de trabalhar em conjunto e de definir, com outros, estratégias e ações que resultam em coisas verdadeiramente boas e genuinamente preciosas para a humanidade. E, ainda, a capacidade individual de sofrimento e resistência, de sobrevivência, que nos leva a, confrontados com os limites externos e internos de cada um, encontrar a luz, a luz no fundo de uma gruta. Mas, sobretudo, maravilhamo-nos porque nenhum desistiu e se entregou, aceitando a inevitabilidade da desgraça.
Este resgate quase que é um resgate da nossa esperança, da esperança que deveremos ter na humanidade, em cada ser humano, no sentido em que podemos acreditar que há sempre formas, se assim quisermos, de encontrar soluções para salvar, para trazer à luz, para dar oxigénio, seja em que circunstâncias for… Quem dera fosse assim em tantos outros casos, que implicam a perda de tantas vidas humanas, igualmente de crianças…. Olhemos somente para o Médio Oriente e fiquemo-nos por ai…. Quem dera fosse assim para nós mesmos, para que a luz também nunca se apagasse em nós…