As últimas eleições legislativas foram esclarecedoras em muitos aspectos. Destaco alguns.
Em primeiro lugar, estas eleições revelaram que os eleitores compreenderam a sua importância, acorrendo às urnas e ajudando à diminuição significativa da abstenção, quando comparada com a percentagem das últimas legislativas. Mesmo assim, é desejável que a mesma possa ser cada vez menor, e os partidos têm aqui um papel fundamental para esse objectivo.
Em segundo lugar, António Costa foi o grande vencedor da noite. Rosto de um Partido Socialista alegre, destemido e lutador, teve uma vitória clara e expressiva. Com optimismo, dedicação, entrega e diálogo estabelecido olhos-nos-olhos com os portugueses, apresentou ao país o seu programa de governação.
Começou por pedir uma maioria sólida que permitisse governar com estabilidade, deduzindo-se desde cedo que pedia uma maioria absoluta a medo. A certa altura, perdeu-o, e apostou as fichas todas nesse pedido aos portugueses. Ganhou. Contra todas as expectativas (quiçá também as dele), sondagens e desejos de todos os adversários, os portugueses deram a maioria absoluta ao PS, a segunda de toda a sua história, desta feita, com António Costa à cabeça. Foi certamente o reconhecimento do trabalho desenvolvido até aqui, lidando bem com uma pandemia, e o desejo de manter a direita, e ainda mais, a extrema-direita, longe do poder, apesar do enorme crescimento desta.
Com estes resultados, o Partido Socialista secou os partidos à sua esquerda, e não depende de ninguém para fazer aprovar o Orçamento do Estado, que será o mesmo que em Outubro do passado ano, foi chumbado. Aliás, de outro modo, seria de estranhar.
Em terceiro lugar, Costa esteve muito bem no seu discurso de vitória, agradecendo a maioria dada pelos portugueses, e referindo que a mesma “não é o poder absoluto, não é governar sozinho (…), é governar com todos”. E quem conhece o seu percurso político, sabe que é um homem de diálogo e de consensos. Só assim conseguiu governar 4 anos com a famosa geringonça.
O PS venceu estas eleições em toda a linha. O mapa cor-de-rosa reapareceu, com excepção da Região Autónoma da Madeira. Trata-se da vitória de um partido que defende a tolerância, a justiça, a democracia e o Estado Social. António Costa e o seu governo, têm obrigação de melhorar todos estes aspectos e muitos outros, para que o país se desenvolva cada vez mais e melhor. Para tal, a aplicação dos fundos da famosa “bazuca” será crucial. Espero que o Primeiro Ministro tenha o discernimento necessário para compreender a importância destas verbas, para que o país atinja um patamar de desenvolvimento que pode não mais alcançar se as desperdiçar. Assim, gostaria que António Costa e Silva, responsável pelo Programa de Recuperação e Resiliência (PRR) fosse novamente chamado, desta feita, para ajudar a aplicar estes fundos europeus, com a máxima rentabilidade. Se António Costa garantiu que o seu próximo governo será mais compacto, uma espécie de “taske-force”, seria muito positivo criar também uma “taske-force” para aplicar a “bazuca”, preferencialmente liderada por Costa e Silva, um homem com visão estratégica para o crescimento harmonioso do país e para a redução das assimetrias.
Em quarto lugar, com esta vitória esmagadora, António Costa despede Rui Rio e Francisco Rodrigues dos Santos da liderança dos respectivos partidos. Veremos o que ainda acontece com Catarina Martins. Se Costa teve a coragem de traçar uma linha vermelha em relação ao Chega, desde cedo, as hesitações de Rui Rio foram castigadas nas urnas. Em breve deve deixar a liderança do partido, e avizinha-se nova ebulição interna na luta pelo poder.
Em quinto lugar, uma palavra para as sondagens que foram saindo ao longo da campanha eleitoral. Se é certo que não ganham eleições, não me parece também que mereçam o descrédito que muitos lhes atribuem, com excepção para as sondagens diárias que roçam o ridículo. Se algumas deram vitórias ao PS, outras ao PSD e outras ainda revelaram um empate técnico, não me parece que sejam erróneas. Acredito que reflectiam o desejo dos eleitores, nesses momentos concretos. Porém, acredito ainda mais, que foram as sondagens que ajudaram a desenhar este quadro político, levando os indecisos a decidirem-se, e convidando muitos outros ao “voto útil” na esquerda (PS), dando esta maioria absoluta como resultado final. Os portugueses mostraram não querer mudar de governo, mas quiseram mudar a representatividade parlamentar.
Com esta maioria, o Partido Socialista tem a estabilidade pedida aos eleitores para governar nos próximos 4 anos, a fim de dar respostas aos problemas mais profundos da sociedade. Espero, honestamente, que haja mais acção em áreas pouquíssimo debatidas nos debates eleitorais. É crucial uma saúde reforçada e acessível a todos, um pensamento estratégico para a educação, tendo no centro o sucesso dos alunos e o reconhecimento do trabalho central dos professores, tornando esta profissão mais atractiva, começando por rever a remuneração e modelo de avaliação docente. É ainda crucial uma visão de futuro para a cultura, que bem merece e que tem sido tão esquecida.
Uma palavra final para os deputados do Partido Socialista eleitos pelo Algarve. Têm a grande oportunidade de se baterem pela defesa da nossa bela região, contribuindo para o seu desenvolvimento, sem descurar as lutas pela melhoria das condições de vida dos que cá vivem, sejam nativos, ou adotados, como eu. Para cada deputado/a, as maiores felicidades na defesa do Algarve, dos Algarvios e dos valores democráticos que colocam as pessoas no centro da sua governação, tratando-as todas com o mesmo valor, e reconhecendo-lhes a mesma dignidade.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia