Vivemos numa época em que as pessoas são avaliadas não por aquilo que são, mas pelo têm. Valemos mais pelo ter do que pelo ser.

Demonstrativo disso é o facto de programas como aquele que mostra o dia-a-dia da companheira de Cristiano Ronaldo, Georgina, ser líder de audiências assim como também é líder de audiências um outro, que acompanha o quotidiano de Meghan Markle, casada com o príncipe Harry de Inglaterra.

Da mesma forma, a tal forma de viver de hoje fica espelhada na reação de uma aluna do mestrado em Comunicação da Universidade Autónoma de Barcelona (UAB), que confrontada pelo professor e responsável pelo curso, depois de ela e à turma toda terem apresentado trabalhos de fim de curso totalmente plagiados, lhe respondeu que não precisava do curso para nada, porque ganhava mais dinheiro a fazer vídeos no Youtube, do que o professor a dar aulas na universidade.

Atualmente somos valorizados pelo que temos, pelas fotos que temos nas redes sociais, pelas viagens que realizamos, enfim pela vida, aparentemente sem faltas e sem obstáculos, que mostramos ao mundo. O excesso de positividade (Byung Chul-Han, 2014), deste nosso presente, não deixa espaço para a imperfeição, para a originalidade egoísta, para a gratidão em relação a quem nos dá generosamente o que não conseguimos obter pelos nossos méritos, ou possibilidades. Se nos oferecerem uma garrafa de vinho de 20€, temos de ter logo de seguida uma de 30€ e assim consecutivamente, até conseguirmos ter uma de 1000. Mas de que nos serve tal facto que não conseguiremos, realmente, ser aquilo que desejamos?

O problema é que, no âmbito da fé cristã, começamos a entrar nessa corrida. Somos mais cristãos, quanto mais rezamos. Quanto mais rezamos, mais podemos afirmar que estamos perto de Jesus. Quanto mais rubricas litúrgicas comprimirmos, melhores cristãos somos. Se formos presbíteros, podemos olhar para a quantidade de pessoas que temos ao nosso redor e nas nossas celebrações, ou à quantidade de rubricas litúrgicas que, escrupulosamente, cumprimos nessas celebrações. Na paróquia louva-se a Deus, quantas mais Eucaristias existirem. As celebrações têm mais dignidade, quanto mais acólitos possuímos e quantas mais flores adornarem o altar. Gosta-se mais de Maria, quanto mais flores estiverem diante da sua imagem e quanto mais terços rezarmos diante de todos.

E, todavia, a Salvação não é um direito; é uma Graça. E a gratidão para com o Senhor Jesus, que nos conduz a essa graça, vê-se, sobretudo, na forma como nos relacionamos com os nossos irmãos e com o mundo que foi criado por Ele, para nós. Se não estivemos gratos a Deus por tudo o que Ele e o Seu Filho fizeram por nós, nunca valorizaremos o Seu amor gratuito. E, é precisamente o que hoje começa a ser difícil: perceber a gratidão de se sentir amado por Deus em toda a vida e desejar sentir essa gratidão, trabalhando para tal. Se não Lhe agradecermos tudo o que Ele nos dá através da nossa família, dos nossos amigos, daqueles que nos estão próximos, nunca vamos perceber que o importante não é “ter”, mais “ser” cristão e viver a fé de acordo com o que somos, sendo, também, capazes de respeitar o próximo e aquilo que ele é.

De uma coisa tenho a certeza: Deus não nos avaliará pelo que temos, mas pelo que somos e fomos no seu Reino.