É costume no final de cada ano, eleger-se a figura do ano que termina. É assim anormal, que o ano de 2011 leve apenas uma semana e alguém arrisque a propor desde já a figura do novo ano. Faço-o, naturalmente, não numa perspectiva de balanço, antes porém na óptica de propor uma figura inspiradora e que sirva de modelo à nossa vida ao longo deste ano novo que se anuncia penoso. A crise e os seus sacrifícios, a diminuição acentuada dos rendimentos, pela conjugação da redução dos salários, do aumento dos preços dos bens essenciais e dos impostos que terão um efeito directo na vida das famílias, produzirão ainda efeitos indirectos, que através da diminuição do consumo se reflectirão na diminuição da produção e no aumento das falências e do desemprego. A tudo isto devem ainda juntar-se a diminuição das prestações sociais, o aumento das taxas de utilização dos serviços públicos em sectores fundamentais como a saúde, a educação e a justiça, a tal ponto que se torna legitimo perguntar se ainda vivemos num Estado Social. Na verdade, quando quem dispõe de um rendimento mensal superior ao salário mínimo nacional, nem que seja em um euro, seja desempregado ou pensionista, passa a pagar taxas moderadoras nos Hospitais, é caso para questionar se este Estado ainda tem o direito de se chamar social?

Face a este cenário, seríamos levados a pensar que a figura do ano de 2011 é a crise económica e as suas nefastas consequenciais sociais, mas isso seria numa perspectiva negativa e redutora. Vamos todos viver e sentir os efeitos da crise. Vamos todos pagar a factura, vamos todos sofrer, mas podemos e como cristãos devemos, tirar partido da situação para mudar de estilo de vida e passarmos a viver de modo mais modesto, simples e frugal, libertando-nos de necessidades artificialmente criadas pela sociedade de consumo. Aqui entra a figura inspiradora do ano de 2011, que nos pode servir de modelo nesse estilo de vida cristã, que urge adoptar para bem do equilíbrio das nossas contas, racionalização dos nossos gastos e consumos e até para uma vida espiritual mais liberta das idolatrias e menos dependente dos bens materiais. Tal figura inspiradora do ano de 2011 é a Sagrada Família de Nazaré! Com esta família, podemos apreender valores como o método e a disciplina no trabalho; austeridade e frugalidade no consumo de bens; espírito de pobreza e simplicidade de vida; um estilo de vida simples, humilde e despretensioso, que se recusa a ostentar vaidades e que não tem medo de enfrentar a verdade da sua própria condição económica, que não quer parecer o que não é nem mostrar o que não tem!

Dizem os responsáveis das instituições de solidariedade social, que muitos daqueles que batem às suas portas para utilizarem os seus serviços de apoio social, o fazem muitas vezes com vergonha, e casos há em que nem sequer querem mostrar o rosto, nem conversar, limitando-se a tomar a refeição e a desaparecer rapidamente, sem falar nem dizer nada! É a pobreza envergonhada de quem nunca se imaginou nessa situação. É uma atitude compreensível, mas em todo o caso, sempre gostaria de recordar, que vergonha é roubar e que ninguém deve ter vergonha de se encontrar numa situação para a qual não contribuiu, da qual não tem culpa ou responsabilidade, pois a mesma é fruto de politicas erradas e de modelos económicos perniciosos que apenas visam gananciosamente a maximização do lucro e a acumulação financeira, que cultivam a idolatria do dinheiro e o desprezo da pessoa humana. A família de Nazaré, também teve que bater a muitas portas em Belém para pedir abrigo e não teve vergonha de o fazer, apesar das recusas que foi recebendo.

Com a Sagrada Família de Nazaré podemos apreender a enfrentar e superar as dificuldades da vida, e a adoptar um estilo de vida que se inspire nos valores do Evangelho. Com este modelo e este exemplo será mais fácil vivermos um ano que vai ser muito difícil.