
Com a tripla vertente de oração, formação e convívio realizou-se no passado sábado, na casa de retiros de São Lourenço do Palmeiral, o encontro para os avós com a presença de 35 participantes de vários pontos do Algarve.

Promovida pela Diocese do Algarve, no âmbito da programação anual proposta e levada a cabo pela comunidade algarvia dos sacerdotes da Companhia de Jesus (jesuítas) para aquele espaço, a iniciativa foi realizada em colaboração com o Setor Diocesano da Pastoral Familiar, tendo como tema “A Missão dos Avós”.

O padre Nuno Tovar de Lemos – sacerdote jesuíta que orientou o encontro, preparado com a ajuda da psicóloga Joana Sarmento Moreira com especialização na área infantojuvenil –, disse aos avós participantes que eles são um “farol no nevoeiro”. “A vida tem imenso «nevoeiro», imensas alturas em que não se vê bem, não se vê o que é que está certo, nem o que é que está errado”, metaforizou, considerando que “os avós são «farol» dos valores, da fé, antes de mais nada por serem aquilo que são”. “Isto é importantíssimo, ser «farol». Antes de mais nada por serem quem são e por serem fiéis, a Deus e também um ao outro”, acrescentou.

“Num mundo em que a maior parte das famílias estão desmembradas, um casamento fiel ao fim de 50 anos, mesmo que tenham as vossas discussões, é um «farol» inacreditável”, afirmou, explicando-lhes que não precisam sequer falar. “Não precisam dizer nada porque só por estarem lá, estão a dizer que o amor é possível”, observou.

Neste sentido, o formador constatou que “a maior parte dos miúdos, hoje em dia, tem os pais separados que depois têm segundas relações, namorados com filhos de primeiras relações”. “Em muitas famílias esse é o panorama”, verificou, acrescentando que, “de repente, há ali um espaço onde as coisas são como sempre foram” e que faz dos avós um “espaço de segurança, um «porto» seguro”. “Também é um «porto» seguro onde se pode desabafar. Este é um papel importantíssimo: manter a união da família, escutando. Mas isto exige uma grande sabedoria de isenção”, acrescentou, aconselhando os avós a “não tomar partido” nos diferendos entre os pais dos seus netos. “Para poder ser a casa de todos, que acolhe todos e une todos é preciso, de alguma maneira, os avós saberem ser bons «padres» e bons «papas». Um bom padre e um bom papa está acima das divisões”, explicou.
O sacerdote evidenciou assim a casa dos avós como “uma casa muito importante onde a família se encontra”, realçando não apenas a dimensão literal do encontro, mas sobretudo o “lado simbólico”. “Ou seja, há um sítio na família onde há espaço para todos”, esclareceu.

Sobre a importância de escutar, o padre Nuno Tovar de Lemos lembrou que “os avós têm tempo” e “têm paciência”. “E isso, para o crescimento do miúdo, é uma coisa importantíssima”, considerou, acrescentando que “o miúdo tem ali espaço, às vezes, para dizer asneiras, e, às vezes, atrás das asneiras vêm coisas importantes”.
“Basta ter ouvidos e estar lá para acolher e escutar. Às vezes, os avós estão muito preocupados em dizer coisas – e também é importante dizer algumas –, mas mais importante do que dizer parece-me que é escutar”, recomendou, constatando que hoje “a vida é extremamente complexa e complicada para quem tem miúdos pequenos”. “E não é só a pressa exterior, às vezes é a pressa interior”, lamentou, acrescentando que “muitos netos têm uma relação mais franca com os avós do que com os pais”.
Destacando a importância dos avós na transmissão da fé, o sacerdote observou que ela, “às vezes, faz-se saltando uma geração”: a dos filhos. “É tão importante, quando estão os netos em casa, levá-los à missa”, alertou, lembrando que os avós são para os netos o “elo de transmissão entre as coisas boas que receberam do passado e o futuro”. “Os avós, às vezes, não querem ser chatos e passam muito para o mundo dos miúdos, mas os avós têm uma coisa a dar que os miúdos não recebem de mais lado nenhum que é o passado”, completou, lembrando que, muitas vezes, os avós ficam associados a “histórias”. “Histórias da família, da fé”, concretizou.

O sacerdote evidenciou assim a “missão única” dos avós em “transmitir o afeto e a ternura”, mas advertiu que “não podem ser escravos dos netos, nem dos filhos”. “Os avós têm que ter vida própria e isso é muito importante não só para o equilíbrio dos avós. É muito importante também os filhos e os netos perceberem que os avós têm vida própria, têm os seus interesses”, alertou, aconselhando-os a “saberem dizer que sim e saberem dizer que não”.
De entre as imagens simbólicas a que recorreu para explicar a missão dos avós, o sacerdote comparou-os às raízes das plantas. “Os avós são as raízes invisíveis, que nem falam muito, mas que estão lá presentes e onde a criança, de alguma maneira, se estrutura”, afirmou, considerando que “é chato ser raiz: não se vê, está-se lá na terra, um bocado sozinho, isolado, mas faz parte da missão dos avós”.
O sacerdote pediu aos avós que não levem em conta que os netos não lhes deem tanta atenção com eles como gostariam. “Os miúdos não têm pachorra para os avós porque estão a descobrir um mundo inteiro. É muito importante que os avós mantenham a ligação e que telefonem. Não fiquem à espera orgulhosamente de serem contactados. Não levem a mal”, exortou, lembrando que essa atitude “exige imensa humildade” e “vencer o amor próprio”. “Com bom senso, acho que é muito importante os avós fazerem-se presentes e saberem-se fazer presentes”, acrescentou.

O padre Nuno Tovar de Lemos pediu ainda aos avós a “aprendizagem da passividade” para saber “envelhecer bem”.
Ao Folha do Domingo, explicou que o encontro visou “ajudar os avós a trocarem experiências entre si, a rezarem, a clarificarem a sua missão” para “poderem voltar [às suas famílias] para serem melhores avós”.
Sobre a continuidade da iniciativa, o sacerdote adiantou que a “experiência” terá de ser avaliada para aferir “se vale a pena voltar a fazer ou não”.
O encontro – que teve início com a apresentação dos participantes e dos seus netos após a oração da manhã aos “avós de Jesus”, São Joaquim e Santa Ana –, prosseguiu com trabalho de grupos sobre a missão dos avós em que tiveram de escolher com qual dos simbólicos desenhos se identificavam mais.
O orientador apresentou depois o tema sobre a missão dos avós e seguiu-se um tempo de oração pessoal com base na passagem bíblica em que Jesus confia a Pedro a missão de apascentar as suas ovelhas.
Depois do almoço refletiram em grupos sobre as “alegrias, dificuldades e estratégias” da sua missão e o padre Nuno Tovar de Lemos explicou “o que é que normalmente ajuda e o que é que normalmente não ajuda” que os avós façam, seja na relação com os netos, seja na relação com os seus próprios filhos, os pais deles. O sacerdote convidou ainda cada participante a escrever uma carta aos netos, partindo de um de três pressupostos – uma carta para entregar, uma carta para não entregar ou uma carta para entregar daqui a 10 anos – e a jornada terminou com a celebração da eucaristia e de um lanche partilhado.