A jornada de formação sobre o Evangelho segundo São João que a Diocese do Algarve promoveu no passado dia 5 deste mês, através do seu Centro de Estudos e Formação de Leigos do Algarve (CEFLA), destacou a obra como uma “exortação a fortalecer e purificar a fé”.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

Segundo o formador, essa finalidade implica acreditar em Jesus “como o Messias e Filho de Deus” e “não só como o Messias, como o pediam os judaizantes” ou “não só como o Filho de Deus, nas tendências das filosofias helenistas”.

O cónego Mário de Sousa começou mesmo por considerar que o Evangelho segundo São João – “o último a ser escrito” –, se destina “a pessoas que já acreditam em Jesus, mas que, porventura, não acreditam como deve ser”.

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O sacerdote lembrou que “as comunidades, para quem escreve o evangelista, encontram-se ameaçadas”. “Estamos no final do século I, com grandes dificuldades para os cristãos na vivência da sua fé”, contextualizou, considerando que no “quarto Evangelho” é notória “uma releitura da vida de Jesus à luz da vida da própria comunidade e ao mesmo tempo uma apresentação da vida da comunidade à luz daquilo que aconteceu a Jesus”.

O especialista no estudo daquele evangelista considerou que o texto alude à “situação vital da comunidade joanina” naquele período, “onde há discípulos que não aceitam o discurso eucarístico”. “Para além das dificuldades cristológicas em aceitar Jesus como Filho de Deus, há também dificuldades sobre a aceitação no sentido profundo da Eucaristia”, assegurou o cónego Mário de Sousa.

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O diretor do CEFLA elucidou que o texto evangélico se situa “num contexto de dificuldades externas com a sinagoga”, “mas também internas”, o que disse causar “fraturas”, “não só na dimensão que cristológica, mas, por consequência, na unidade dos discípulos”.

O formador realçou ainda que o “discípulo amado” é uma “figura muito importante” no Evangelho segundo São João, “considerado o autor” e que “a tradição identifica como João, o filho de Zebedeu, irmão de Tiago”. “É preciso termos sempre em conta a diferença entre autor e escritor. Às vezes coincidem, mas podem não coincidir. O autor é aquele que está por detrás da obra, aquele cujas ideias a obra expressa, mas que pode não ter sido por ele escrita”, advertiu, explicando que os “escritos joaninos”, compostos pelo Evangelho, as três cartas de São João e o livro do Apocalipse, são de “escritores diferentes, mas do mesmo autor”.

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O cónego Mário de Sousa lembrou que o “discípulo amado acompanha sempre Jesus”, sendo por isso “testemunha de todos os acontecimentos”. “Esta relação de intimidade com Jesus e de fé n’ Ele leva a que seja o discípulo amado o primeiro a reconhecê-lo como o Senhor”, realçou.

O biblista destacou ainda que o Evangelho segundo São João está estruturado a partir do sentido das festas judaicas. O cónego Mário Sousa explicou que “as festas judaicas estão ao serviço da cristologia” e que “o conteúdo da festa é moldura para apresentação do ministério e do ministério de Jesus”. “As festas aparecem no quarto Evangelho para apresentar o hoje da salvação cumprido, e até superado, em Jesus de Nazaré”, afirmou, acrescentando que “o conteúdo daquilo que se celebrava nas festas é usado para apresentar Jesus como o cumprimento de tudo aquilo de que nelas se celebrava”.

O formador referiu que também “o espaço e o tempo marcam o Evangelho” e ajudam “a caminhar na perceção do mistério e do ministério de Jesus”.

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Por outro lado, destacou que “a narração das bodas de Caná é muito rica em simbolismo joanino e antecipa muitos dos temas que depois serão tratados no Evangelho”. Entre os temas mais importantes referiu-se, por exemplo, ao da “água”, ao da “manifestação da glória de Jesus” e ao do “batismo”. “A noite tem no Evangelho de João, por contraposição ao tema da luz, uma grande densidade. Trata-se da ausência da luz, desta luz que Jesus é exclusivamente”, acrescentou também.

A formação, que teve lugar no Centro Pastoral de Pera participada por cerca de 110 formandos de todo o Algarve, destinou-se particularmente aos alunos do Curso Básico de Teologia, mas permitiu a participação de outras pessoas.