
Guilherme d’Oliveira Martins afirmou ao clero do sul do país que “não há política cristã”. “Há cristãos na política”, clarificou o antigo governante na atualização do clero das dioceses do Algarve, Beja, Évora e Setúbal, que decorreu a semana passada no hotel Jupiter, em Portimão.
Ao abordar a dimensão política na primeira de duas mesas redondas que procuraram apontar as “Áreas prioritárias na Ação Pastoral da Igreja”, aquele orador acrescentou que “o Cristianismo não é um projeto político, mas os cristãos não podem ser indiferentes em relação aos outros”. “Quem está ao nosso lado não nos pode ser indiferente”, reforçou, sublinhando a “responsabilidade especial para com os outros” e advertindo que “o grande perigo é, justamente, a indiferença”. “Falo da tentação de nos fecharmos sobre nós mesmos e de esquecer o outro, os outros, a diferença”, explicou.
“Hoje, uma das grandes questões é justamente esta: a compreensão do outro, do diferente, da igualdade e da liberdade que são faces da mesma moeda e que estão na essência da mensagem cristã”, prosseguiu, frisando que “as identidades fechadas sobre si são perigosas”. “Não podemos voltar a fechar as janelas e ter o cheiro do bafio”, metaforizou, considerando ser preciso “não ter medo das correntes de ar”.

Nesse sentido, defendeu que “a cultura tem de se abrir”. “O diálogo das culturas é que importa, não é o fechamento da cultura sobre si”, afirmou Oliveira Martins, que também é o presidente do Centro Nacional de Cultura, elogiando a iniciativa da Diocese do Algarve em 2010 de diálogo com os agentes culturais, no seguimento do encontro destes com o papa Bento XVI na sua visita a Portugal naquele ano.
O orador disse ser preciso “prevenir a exclusão e garantir o desenvolvimento”. “Valor fundamental é a dignidade da pessoa humana, elemento crucial quando falamos de criação cultural, de salvaguarda do património, do ambiente”, afirmou, lembrando: “não podemos compreender a cultura dos direitos humanos sem a mensagem cristã e sem aquilo que ela significou e significa”.

Neste sentido disse ser preciso “estar atentos à realidade que está, permanentemente, a mudar” e aludiu à importância de “compreender, conhecer e cuidar”, salientando a necessidade de “voltar a falar da caridade”. Defendendo a necessidade de se compreender os “grandes desafios perante os quais nos encontramos”, referiu-se concretamente ao aumento da esperança média de vida, considerando que “a Igreja tem aqui uma especial missão para mobilizar, sensibilizar e consciencializar”. “Temos de ter respostas concretas que garantam a qualidade de vida relativamente a quem vai ter mais vida, criar condições para haver espaços de dignidade e de vida para as pessoas que já não são ativas”, apelou.
Por outro lado, Oliveira Martins acrescentou que “falar de cultura não é falar do último capítulo dos programas políticos”. “Falar de cultura é falar de um triângulo essencial: educação, ciência, cultura. Este triângulo é esta capacidade de compreender relação entre património, herança, memória”, afirmou, acrescentando que “falar de cultura não é esquecer a economia” e que “sustentabilidade não é só económica, financeira”, mas também “ambiental, social, cultural”.

A atualização do clero das dioceses do sul, que se realizou de 16 a 19 deste mês, tendo como tema “Levar Cristo às periferias humanas e existenciais: os novos areópagos”, contou com cerca de 120 participantes, incluindo, para além dos bispos das quatro dioceses, o bispo emérito da Diocese de Singüenza-Guadalajara (Espanha), D. José Sánchez González, que também esteve presente.